Salvador Scalia, presidente do Comites do Recife: um sistema de representação herdado da "velha política" italiana. (Foto Desiderio Peron / Arquivo Insieme)

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Salvador Scalia, presidente do Comites do Recife: um sistema de representação herdado da “velha política” italiana.

CURITIBA – PR – Um dos mais combativos presidentes de Comites – Comitato degli Italiani all’Estero do Brasil, o engenheiro Salvador Scalia, do Recife-PE, confirma o que já vinha dizendo há muito tempo: não será candidato às próximas eleições e se confessa profundamente desiludido com todo o sistema de representação, com a Itália e, também, com a comunidade ítalo-brasileira. “Não, não sou candidato e não vejo a hora de sair desse sistema de representação que nada representa”, enfatiza Scalia. Para os que virão, um aviso, repetindo Dante Alighieri: “Lasciate ogni speranza, voi che entrate”.

“Desistimos da Itália há muito tempo”, diz ele, consultado sobre o sistema a ser adotado nas próximas eleições previstas para dezembro e para cuja participação os eleitores inscritos no Aire – o cadastro oficial dos eleitores italianos que residem fora da península itálica – precisam, até 50 dias antes do pleito, realizar junto aos consulados uma espécie de “inscrição” para poder receber, por correio, o material eleitoral. Somente quem preencher um extenso cadastro, com informações pessoais e endereço atualizado receberá em casa o “envelope eleitoral”.

O conteúdo do DL que trata das eleições está agora sob apreciação do Parlamento Italiano onde, além de emendas como a do deputado Fabio Porta, que reduz o prazo de “alistamento” dos eleitores de 50 para 30 dias, está recebendo modificações de interesse dos partidos políticos, principalmente com relação às chapas eleitorais com a chancela partidária ou de movimentos.

Scalia, como os demais conselheiros dos Comites em todos os Continentes, foi eleito em 2004 para um mandato certo de cinco anos. Mas desde 2009 as eleições foram sucessivamente adiadas, primeiro ante a alegação de que seria necessário alterar a legislação pertinente; com a explosão da chamada “crise italiana”, os adiamentos ocorreram pela alegada necessidade de conter custos. Na verdade, era o CGIE – Consiglio Generale degli Italiani all’Estero que requeria alteração na legislação, já que perdera suas funções com a instituição da Circunscrição Eleitoral do Exterior, que mandou ao Parlamento Italiano 6 senadores e doze deputados eleitos pelos italianos residentes fora da Itália.

Sem as mudanças pretendidas, os adiamentos sucessivos passaram a ser interpretados como uma tática para o fechamento di CGIE e também dos Comites. Para rebater tais argumentos, o atual governo de Matteo Renzi (que também assumiu o governo italiano sem eleições), numa recente reunião de seu Conselho de Ministros, destinou recursos para as eleições dos Comites, modificando também as normas eleitorais.

Para Scalia, para entender a situação atual, “é preciso ir às origens” da criação tanto do CGIE quanto dos Comites, que não adveio da reivindicação da comunidade itálica esparramada pelo mundo mas, sim de projetos de setores que denomina de “velha política” italiana. Assim, diz o presidente do Comites do Recife: “Não vou agora discutir sobre ilegalidade ou inconstitucionalidade dessas exigências para o voto. Fazem dez anos que discuto a ilegalidade das filas da cidadania e nada vi, nem mesmo a reação dos que aguardam anos e anos nessa monstruosa fila”.

Eis sua posição, na íntegra: “É preciso ir às origens. Todo esse sistema de representação dos italianos do exterior foi uma invenção do que hoje se chama “velha política” e não fruto de mobilização/participação das comunidades italianas no exterior. Em assim sendo, os italianos do exterior ignoram o sistema e só participam dele os que o vêem como um caminho para chegar ao parlamento para usufruir de suas benesses. Nunca houve uma real participação, as listas de candidatos apareciam do nada articuladas por pequenos grupos, representando os interesses dos poucos que participavam com vistas a uma possível vaga no parlamento. Essa é a realidade desse “sistema de representação”.

Não vou agora discutir sobre ilegalidade ou inconstitucionalidade dessas exigências para o voto. Fazem dez anos que discuto a ilegalidade das filas da cidadania e nada vi, nem mesmo a reação dos que aguardam anos e anos nessa monstruosa fila. Na prática o que é aceito pela maioria torna-se legal, é assim que funcionam as coisas.

Não, não sou candidato e não vejo a hora de sair desse sistema de representação que nada representa. Para aqueles de boa vontade que ainda se iludem (como aconteceu comigo) pela possibilidade de representar com seriedade, há um aviso na entrada que precisa ser lido: “Lasciate ogni speranza, voi che entrate”. Temos de admitir, nós os que saímos sem querer sair, forçados pelas diversas circunstâncias adversas, desistimos da Itália há muito tempo. Nosso amor e saudade nada podem, os que ficaram é que vão ter de resolver (ou sair)”.