Durante o seminário sobre cidadania italiana realizado em Florença, a advogada Monica Restanio, presidente da Associação de Advogados Unidos pela Cidadania Italiana (AUCI), fez um discurso contundente denunciando a campanha midiáticdiasa e política contra os ítalo-descendentes. Restanio abordou a crescente hostilidade com que os cidadãos de origem italiana nascidos no exterior vêm sendo tratados e atribuiu esse movimento a uma estratégia deliberada de desinformação conduzida por grandes grupos políticos e econômicos, com a conivência do que ela chamou de “Deep State” (Estado Profundo) italiano.
“Ao longo do último ano, vimos uma escalada sem precedentes na forma como a mídia retrata os ítalo-descendentes, promovendo uma narrativa difamatória e enviesada para justificar o fim do reconhecimento da cidadania iure sanguinis”, afirmou Restanio. Segundo a advogada, essa ofensiva não é um fenômeno isolado, mas parte de uma estrutura de poder que opera nos bastidores do Estado, integrada por burocratas de alto escalão e setores estratégicos que se perpetuam no controle das instituições, independentemente das mudanças de governo.
Uma campanha de descrédito institucionalizada – A advogada apontou que essa campanha sistemática teve um ponto de inflexão em abril do ano passado, quando um congresso promovido pela Faculdade de Direito de Pádua formalizou o discurso anti-italo-descendente, concedendo uma suposta roupagem jurídica a ataques antes apenas políticos ou midiáticos. Desde então, descendentes de italianos passaram a ser tratados como fraudadores ou aproveitadores nos principais meios de comunicação, sem direito de defesa.
“Fomos alvos de uma ofensiva coordenada, onde a mídia nos ataca sem contraditório, sem nos dar o direito à réplica. A figura do ítalo-descendente passou a ser explorada como bode expiatório por aqueles que querem reescrever a lei da cidadania e eliminar um direito historicamente consolidado”, denunciou. O seminário foi transmitido ao vivo pela Revista Insieme
Segundo Restanio, esse processo não ocorreu de forma espontânea, mas sim como resultado de ações deliberadas do “Estado Profundo”, que há décadas mantém o controle sobre a administração pública e os tribunais, influenciando diretamente os rumos da política migratória italiana. “Não é coincidência que muitos dos ataques aos ítalo-descendentes venham de setores do Judiciário e da alta burocracia estatal. São pessoas que não foram eleitas, mas que detêm poder suficiente para moldar leis e bloquear iniciativas que favorecem os cidadãos de origem italiana nascidos no exterior”, afirmou.
Burocracia como ferramenta de exclusão – A advogada destacou ainda que essa estrutura invisível de poder não se limita à retórica política ou midiática. O Deep State também se manifesta na criação de obstáculos burocráticos, que na prática impedem os ítalo-descendentes de exercerem o direito à cidadania. Ela citou a crescente demora nos processos administrativos, a imposição de novos requisitos ilegais por parte dos consulados e a instrumentalização de taxas abusivas como meios de restringir a obtenção da cidadania.
“Os consulados adotaram uma política de obstrução, com tempos de espera que podem ultrapassar 10 a 12 anos apenas para a apresentação do pedido de reconhecimento. Os tribunais, por sua vez, começaram a interpretar a lei de forma cada vez mais restritiva, criando novos entraves que jamais existiram no ordenamento jurídico italiano”, explicou.
Restanio também criticou a crescente tentativa de transformar ítalo-descendentes em estrangeiros aos olhos da lei, uma manobra que desconsidera a realidade histórica e os princípios fundamentais da cidadania italiana. “O objetivo final dessa estratégia é deslegitimar nossa existência como cidadãos. Eles querem nos fazer crer que somos estranhos à Itália, quando, na verdade, somos parte indissociável da sua história e identidade”, afirmou.
A luta pelo reconhecimento e o papel da Justiça – Apesar do cenário desafiador, a advogada se mostrou confiante de que o sistema judiciário ainda pode atuar como uma barreira contra essa ofensiva institucionalizada. Ela citou decisões históricas da Corte de Cassação e do Tribunal Constitucional Italiano que reafirmaram o direito dos descendentes à cidadania e expressou esperança de que os magistrados resistam às pressões políticas e midiáticas.
“Acreditamos que a Corte de Cassação e o Tribunal Constitucional seguirão desempenhando seu papel de guardiões da legalidade e dos direitos fundamentais. A cidadania italiana iure sanguinis não é um privilégio, é um direito que a Itália reconheceu historicamente aos seus filhos, onde quer que tenham nascido”, enfatizou.
Por fim, Restanio reforçou que a mobilização dos ítalo-descendentes e seus defensores será essencial para conter essa tentativa de exclusão. “Não podemos permitir que um direito legítimo seja erodido pela manipulação política e pelo silêncio institucional. Nossa luta não é apenas por cidadania, é pelo reconhecimento de nossa identidade e de nossa história”, concluiu.