Expoentes da comunidade ítalo-brasileira ligados ao reconhecimento da cidadania italiana iure sanguinis iniciaram um movimento para sensibilizar o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) sobre os problemas causados pela recente mudança no sistema de emissão da Certidão Negativa de Naturalização (CNN).
O documento, fundamental nos processos de dupla cidadania, passou a ser emitido por meio de uma nova plataforma do governo federal, mas, segundo lideranças comunitárias, o resultado foi um retrocesso que gera custos adicionais, insegurança e risco de atrasos nos processos.
Um dos líderes do movimento enumerou os três pontos mais problemáticos da nova versão da CNN:
-
Fim das variações de nomes – Antes era possível emitir uma única CNN contemplando diferentes grafias do mesmo nome, como Giovanni Rossi e João Rossi. Agora, cada variação exige a emissão de uma certidão separada. Isso obriga famílias a gastar mais com traduções juramentadas e apostilamentos, já que em alguns casos os nomes do antepassado apresentam até dez variações.
-
Ausência do nome do pai – As novas certidões trazem apenas o nome da mãe do estrangeiro. Para a comunidade, isso aumenta o risco de homônimos e dá margem a desconfianças de juízes e oficiais italianos. Em um momento em que ítalo-brasileiros enfrentam acusações de fraude documental, a mudança é vista como especialmente prejudicial.
-
Impossibilidade de autenticar CNNs antigas – O MJSP retirou do ar, sem aviso prévio, a plataforma anterior, que permitia autenticar certidões já emitidas. Com isso, quem havia solicitado a CNN até a semana passada não consegue mais validá-la em cartório, inviabilizando a tradução e o apostilamento. Famílias que estavam no meio do processo ficaram, assim, com documentos praticamente inutilizáveis.
Segundo as lideranças, os dois primeiros itens representam uma “involução” do formulário, já que o modelo anterior era mais completo e útil. Já a suspensão repentina da autenticação foi classificada como “falta de percepção” dos danos, pois deixou milhares de ítalo-descendentes desamparados.
A empresária Camila Malucelli postou em seu perfil do Instagram vídeo (que reproduzimos nesta matéria) em que afirma: “O Brasil não pode ajudar a piorar”, em alusão aos múltiplos problemas decorrentes do chamado “Decreto da Vergonha”. Uma campanha para pressionar o governo Brasileiro a modificar o novo modelo da CNN está em curso.
Movimento por revisão
O movimento defende que o Ministério reabra a plataforma anterior, ao menos para autenticação das CNNs emitidas, e corrija as falhas do novo sistema. Também pretende apresentar um documento formal pedindo diálogo com o MJSP antes da consolidação definitiva do novo formato.
“Não somos contra modernizações. Mas qualquer mudança deve ser feita com responsabilidade e transparência. Hoje, a CNN, que deveria facilitar, se transformou em obstáculo para quem só quer exercer um direito legítimo”, afirmou um dos porta-vozes do grupo.
A empresária Camila Malucelli reforçou a preocupação em suas redes sociais, com um vídeo no YouTube em que alerta para as consequências das mudanças. Segundo ela, o novo modelo pode gerar uma avalanche de dificuldades práticas para famílias que já enfrentam longos e caros processos de reconhecimento da cidadania italiana.
Resposta do Ministério da Justiça
Procurado, o Ministério da Justiça enviou resposta a um dos interessados, defendendo a mudança no sistema. O texto diz: “Em relação à limitação de pedidos: O design do novo sistema foi pensado para segmentar e individualizar cada solicitação, assegurando maior clareza, rastreabilidade e segurança jurídica para cada variante processual.
Embora entendamos que esta abordagem possa representar um passo adicional para o usuário em casos específicos, ela é a garantia de que cada item terá seu trâmite completo e independente, evitando qualquer risco de sobreposição ou erro de julgamento.
Adicionalmente, enquanto a emissão da Certidão de Naturalização levava em média 10 dias, o novo sistema DATANATURALIZAÇÃO permite que o requerente solicite, em um ou mais pedidos, utilizando as variações de nomes necessárias.
Atualmente, aproximadamente 85% das certidões são emitidas de forma automática, e os 15% restantes são encaminhadas para análise do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Campo ‘Nome do Pai’:
A arquitetura inicial do sistema seguiu padrões de legislações vigentes que, em muitos casos, não exigem obrigatoriamente essa informação, seguindo os padrões de certidões brasileiras (eleitoral, criminal, cível, trabalhista, etc.)
Ressalta-se que, mesmo sem o preenchimento do campo do nome do pai, a certidão negativa é gerada com validade jurídica, contemplando todos os registros que coincidam com os quatro critérios fornecidos: nome, nome da mãe, naturalidade e data de nascimento, portanto, abrangendo todos os indivíduos que possuem os dados inseridos nesses campos.
Sobre a indisponibilidade do sistema antigo:
A transição para o novo sistema é um marco importante em nosso compromisso com a modernização, segurança e eficiência. Para garantir a integridade dos dados e a migração segura de todas as informações, o sistema anterior foi desativado.
É possível validar a autenticidade das certidões emitidas pelo DATANATURALIZAÇÃO no site: https://datanaturalizacao.mj.gov.br/solicitar-certidao/autenticidade-certidao
Agradecemos novamente pela sua contribuição. Estamos à disposição para esclarecimentos adicionais e confiantes de que a nova plataforma trará benefícios significativos a todos os usuários.
Atenciosamente,
Divisão de Naturalização, Nacionalidade e Apatridia
A.R.”
O que é a CNN e por que ela é importante
A Certidão Negativa de Naturalização (CNN) é um documento emitido gratuitamente pelo Ministério da Justiça que atesta se uma pessoa foi ou não naturalizada brasileira. Ela é crucial para descendentes de italianos que buscam o reconhecimento da cidadania iure sanguinis, pois serve como prova de que o antepassado não perdeu a nacionalidade italiana ao se naturalizar.
Até aqui, a CNN era emitida em um modelo considerado claro e suficiente. A intenção do governo, com a nova versão, foi dar mais segurança jurídica, explicitando quais bases de dados foram consultadas e reforçando a competência do órgão emissor. No entanto, advogados e associações alertam que, sem ajustes, a mudança pode acabar produzindo o efeito oposto, criando brechas para questionamentos de autoridades italianas e insegurança em processos já em andamento.