Justiça italiana afirma que a demora da fila equivale a negar um direito líquido e certo. (Reprodução)

Uma sentença da Primeira Seção Civil do Tribunal Ordinário de Roma acaba de declarar a cidadania italiana de três ítalo-mineiros que, inconformados com a longa fila de espera, recorreram à justiça italiana para ver declarados seus direitos. Em menos de um ano da apresentação do pedido no Consulado, os três entraram na justiça italiana e estão oficialmente reconhecidos, em contraste com a situação de milhares de ítalo-brasileiros que permanecem nas “filas da cidadania”, onde, dependendo do Consulado, a espera pode chegar a dez ou quinze anos.

A decisão, tomada em 24 de fevereiro último pelos juízes Franca Mangano (presidente da seção), Luciana Sangiovanni e Ricardo Rosetti (relator), determinou que o Ministério do Interior italiano e o oficial do Estado Civil competente registrassem os três requerentes como cidadãos italianos e providenciassem imediatamente as “comunicações às autoridades consulares competentes”, no caso, o Consulado da Itália em Belo Horizonte, Minas Gerais.

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Os beneficiados são três pessoas (provavelmente pai e filhos) nascidas, respectivamente, em 1955, 1982 e 1986, descendentes de imigrante originário do município toscano de Lucca, que se casou no Brasil em 26/07/1900.

Ao apresentarem o requerimento ao Consulado Italiano de Belo Horizonte no ano passado (pedido regularmente protocolado, segundo se noticia nos autos), os interessados ficaram sabendo que, naquela época, estavam sendo atendidos pedidos realizados ainda de 2007 e que, portanto, teriam que esperar um longo período para verem sua pretensão acolhida.

“Pelo exame da lista de espera publicada no site do Consulado – escreveram os juízes na sentença – fica evidente a dimensão do fenômeno e a condição de paralisia substancial que os serviços competentes enfrentam com base na quantidade de pedidos apresentados. Disso deriva uma absoluta incerteza, por parte da Autoridade consular, em relação à definição ao requerimento apresentado pelos autores”.

Segundo a sentença, a incerteza e a demora por tempo além do razoável no atendimento do pedido de reconhecimento da cidadania por direito de sangue “equivalem à negação do reconhecimento do direito”, fato que justifica o pedido de tutela jurisdicional.

A sentença, bastante lacônica, é densa, e avança para outras considerações que, embora sobejamente conhecidas, interessam a todos os ítalo-descendentes: os que descendem de cidadão italiano “são cidadãos italianos desde o nascimento” e que assim deve reconhecer o Ministério do Interior.

Curioso é também observar que os beneficiados pela sentença tinham entrado na Justiça antes mesmo de protocolarem seu pedido no Consulado, em BH. Por essa razão, a justiça italiana não condenou o Estado italiano também ao pagamento das despesas com o processo, que, portanto, teve que ser arcado pelos interessados.

O tribunal romano lembrou também que, “na aplicação dos princípios acima enunciados”, a norma italiana “prevê que a administração deve decidir sobre o pedido dentro do prazo de 730 dias”. Portanto – continua – “o pedido feito pelos autores deve ser acolhido, declarando que eles são cidadãos italianos desde o nascimento”.

A sentença considera ainda que, a princípio, esse é assunto que não deveria ir parar na justiça. “Deveria – escrevem os juízes romanos – prevalecer a falta de interesse em agir judicialmente para o reconhecimento da cidadania italiana, porque dela os atores são pacificamente proprietários desde o nascimento, uma vez que as disposições normativas vigentes sobre a matéria desde o nascimento do avô italiano previam a transmissão da cidadania pela via paterna, ao contrário do que acontece com a aquisição da cidadania pela via materna, transmitida antes da entrada em vigor da Constituição italiana, quando a aceitação do pedido é fruto uma leitura jurisprudencial e não de uma disposição inequívoca da lei”.