Pasquale Matafora (Foto Cedida)

Sobre a fala do deputado estadual de Goiás, Henrique Arantes (MDB), para quem “brasileiros aprenderam a ser corruptos com os italianos por conta da forte imigração”.

Excelentíssimo Deputado Henrique Arantes, Recebi ontem de amigos italianos um vídeo com seu pronunciamento e, após assistir, fiquei acompanhando a onda de protestos e de mal estar que suas palavras causaram. Confesso que acompanhei a mobilização e as notas de repúdio da Embaixada e de várias Associações manifestando-se contra seu pronunciamento. Tentei interpretar minha apática reação. Falo isso porque eu, como italiano e apaixonado pela Itália, não me senti atingido e nem ofendido.

O Senhor, com veemência e forte emoção, disparou palavras fortes usando de forma plena a prerrogativa da liberdade de expressão, palavras que tinham a intenção de justificar, sua atuação política como relator da CPI da ENEL, e induzir seus nobres colegas a tomar providencias enérgicas contra os “demônios da Enel”, representantes em solo brasileiro de uma Nação, que, como todos sabem, é o templo da máfia da corrupção e também de todas as práticas criminosas mais hediondas; aliás essas atualmente existentes no Brasil com certeza foram “exportadas pela ITÁLIA”.

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Caro Deputado, ao contrário de todos, estou escrevendo para agradecê-lo, talvez até a Enel pudesse fazer o mesmo.

Quero agradecer porque, sem vergonha e sem hipocrisia, deu a todos a oportunidade de perceber que seu pensamento é constituído de preconceitos e vulgares estereótipos que podemos até tolerar em mesa de botecos de periferias, mas causam espanto onde foram verbalizados. Admira-me muito a sua coragem em falar tudo aquilo em uma casa do povo.

Veja bem, nobre Deputado, não tenho minimamente a intenção de questionar seu trabalho como parlamentar. Isto é prerrogativa de seus eleitores que, duvido seriamente, possam compartilhar seus sentimentos cheios de furor contra uma Nação irmã do Brasil.

Não vou entrar no terreno da retórica, relembrando a História da Itália, berço do pensamento jurídico ocidental, nem lembrar que o atual Ministro da Justiça tem sangue italiano nas veias, que o Presidente da República tem orgulho de suas origens italianas, assim como mais de quase 40 milhões de ítalo-descendentes.

Limito-me apenas a lembrar que, no seu Estado, o agronegócio, fonte principal de recursos, é fruto do suor e do trabalho dos ítalo-descendentes que saíram do Sul para desbravar o Centro-Oeste.

Nestas quatro décadas de Brasil, País que me acolheu com grande carinho e ao qual manifesto eterna gratidão, aprendi a lidar com sabedoria e equilíbrio a ataques sem conteúdo. Tenho uma frase perfeita que geralmente uso em casos como este: “o que vem de baixo não me atinge!”. E essa sua fala não pode atingir a historia a cultura e o povo de uma nação. Agora me perdoe, mas suas declarações não merecem repúdio, mas apenas compaixão e indiferença, que temos que ter com quem se descontrola e perde a razão.

Lamento muito o ocorrido e talvez neste exato momento o senhor esteja refletindo e até arrependido, pensando em como reparar. Eu ficaria muito feliz, após um seu sinal de sinceras desculpas, em poder apertar sua mão e encerrar este embaraçoso capítulo.

Em relação à Enel, posso apenas lamentar e constatar que a empresa italiana, apesar das boas ações e intenções, insiste em não saber interpretar o Brasil da forma correta , um País que, insisto dizer, não é para amadores. No Brasil, a forma de interagir é talvez mais importante que outros aspectos. Forma que não deve ser confundida com os formalismos italianos, formalismos que aumentam as distâncias e são percebidos como arrogância em solo brasileiro. Mas talvez a Enel entenda, com seu pseudo-pragmatismo, resolver todos os conflitos apenas trilhando o caminho das esferas judiciais para imensa alegria de advogados e juristas.