O piloto Alonso e Walter Petruzziello, em foto de 2011, em Interlagos SP. (Foto Desiderio Peron / Insieme)

Naquele dia, há quatro anos, no Bahrein parecia ser o início de uma aventura maravilhosa nascida sob o sol do Oriente. Fernando Alonso vencia  na sua primeira corrida com a Ferrari, fazendo sonhar uma nova era “rossa”, após a épica era Schumacher. Ele desejou com todas suas forças esta união. Após o divórcio imediato  com a McLaren e duas temporadas no purgatório com a Renault , ele moveu céus e terra para chegar a Maranello, levando consigo uma potência econômica como o Banco Santander e buscando apoio entre amigos e responsáveis pelas equipes. Ele procurava pelo  melhor carro, pela equipe de maior sucesso da década, para abrir um novo ciclo após os dois títulos conquistados com a Renault.


Noite escura – Deveria  ter sido um conto de fadas das Mil e Uma Noites. Uma grande história de amor entre dois que pareciam feitos um para o outro. Como se havia pensado entre Valentino Rossi e a Ducati. Em vez disso, em ambos os casos, não houve final feliz. A má estrela de Alonso começou na noite de Abu Dhabi, naquele mesmo ano de 2010, quando o  espanhol e a Ferrari viram  o Titulo Mundial ir por agua abaixo, por um erro de estrategia,  (o engenheiro Chris Dyer pagou por isso), e que poderia ter mudado todo o curso de sua história. E o fato que daqui a poucos dias  termina, justamente em  Abu Dhabi, o relacionamento entre Alonso e o “Cavallino”, é mais um dos tantos sinais do destino. Um círculo que se fecha. Nas últimas duas temporadas, a relação entre Alonso  e a Ferrari se deteriorou. Desilusões e desentendimentos relacionados com os muitos momentos difíceis, na pista e fora dela. Incluindo o “puxão de orelha” do presidente Luca di Montezemolo, que no verão passado  chamou sua atenção sobre o papel de “homem-time” , episódio nunca engolido pelo espanhol. E como em todos os casamentos infelizes, se chegou a contabilidade do amor, colocando no prato os  acertos e erros reciprocos. A saída de Stefano Domenicali, o sentimento nunca fortalecido com o novo chefe de equipe Marco Mattiacci, os terríveis resultados de 2014 que deveria assinalar o renascimento,  aproveitando o advento dos novos motores V6 turbo híbridos, eram todos fatores que pesavam na permanência  e justamente quando Alonso, em suas entrevistas, respondendo à pergunta sobre o acordo,  dizia com um sorriso: “estamos perto”,  as discussões sobre a renovação de seu contrato para um prazo mais longo (2017-2019) foram  paralisadas e a crise entre Alonso e a Ferrari veio a tona, na semana do GP em Monza.

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Anuncio A urgência, aos  33 anos, em ter um carro competitivo, e o espírito de um projeto não compartilhado,  levou Alonso a procurar uma saída (os contatos do verão com a Mercedes para uma troca com Hamilton) e a colocação de condições que a Ferrari não estava disposta a aceitar, depois de anos em que ele sempre tinha  ajudado, ressaltando os méritos e as deficiências do carro. A Ferrari, por sua vez, começou a olhar ao redor procurando alternativas, como já tinha feito no ano anterior buscando  Kimi Raikkonen por medo de que os altos e baixos de uma relação turbulenta com o seu número um pudesse  resultar em um divórcio clamoroso.  No início da próxima semana poderemos ver o anúncio conjunto do fim do relacionamento, para o qual a Ferrari e Alonso nos mantiveram em suspense em Suzuka. E, em seguida, perto do último GP, a contratação de Alonso pela McLaren-Honda, um retorno quase obrigatório, pois não existem outros caminhos para o espanhol. Em Maranello, deverá aportar o quatro vezes campeão mundial Sebastian Vettel, o herdeiro de Schumacher.

Paixão  Será Vettel  capaz de fazer pulsar os corações dos fãs da Ferrari, como fez Alonso nestes cinco anos?  É a verdadeira pergunta. Mais ainda do que aquelas que pairam no ar sobre o campeão alemão, após o ano horrível na Red Bull, quando sofreu com a supremacia do jovem Daniel Ricciardo. Nigel Mansell, o ídolo da Ferrari do passado, em uma entrevista recente em Sportweek lembrou que os fãs da Ferrari sempre amaram os pilotos com “coração e generosidade” como ele e Alonso. E Vettel no próximo ano terá que mostrar a mesma coisa, dado o momento histórico que atravessa a equipe de Maranello, ou fazer com que o amem ao longo do tempo através de vitórias, como aconteceu com Schumacher. É claro que, para os fãs, será difícil, se não impossível,  esquecer rapidamente Alonso. Um campeão extraordinário, capaz de desafios impossíveis. Um dos poucos na F1, juntamente com Hamilton, capaz de tirar o máximo de um carro não competitivo.


Samurai – Não houve ocasião, na sua conturbada carreira, em que Alonso não tenha lutado como um gladiador, com espírito de samurai inspirado nos livros de sua coleção. Em 2012, na sua melhor temporada com a Ferrari, fez o seu mantra, tocando o título pela segunda vez depois de uma luta desigual com Vettel, da Red Bull, e que terminou na chuva de São Paulo com o mundial vencido pelo alemão por somente três  pontos, no final de uma corrida cheia de imprevistos. A recuperação no diluvio de Sepang e Valencia, quando ultrapassou  10 carros e vencendo  na frente do seu público, são inesquecíveis. Mas mesmo quando ele teve ocasiões únicas, o espanhol não desperdiçou. Em 2011, em Silverstone, aproveitou a única corrida em que foram proibidos “escapamentos soprados” para triunfar com a Ferrari, 50 anos após o primeiro triunfo de Froilan Gonzalez. E em 2013, no início da temporada na China e em Montmeló, venceu,  antes que a Pirelli modificasse os pneus e que fizeram a balança pender em favor de Vettel.


Lamento – Então não pode senão ficar um pouco de “sentimento amargo” no fim dessa história. “Com mais oito pontos, eu teria outros três títulos no meu curriculo”, reflitiu  Alonso, pensando sobre aquele titulo que perdeu por um ponto com a McLaren (2007) e naquele que perdeu por 4 pontos no erro de de Abu Dhabi em 2010. Assim como será difícil não lamentar a saida de um piloto imprevisível, agudo, nunca maçante, muitas vezes desconfortável, provocante, mas de raro talento. Alonso vai embora sem ganhar um único título com a “Rossa”. E isso,  talvez, seja o maior dos pecados.  Boa sorte Alonso, você merece.

Gazzetta dello Sport/Luigi Perna/Walter A. Petruzziello