Exposição Percorsi Italiani na Casa Fiat de Cultura (Foto Studio Cerri)

“Percorsi Italiani: 120 anos de história na Casa Fiat de Cultura” reúne objetos, vídeos e mais de cem imagens para resgatar os fluxos migratórios da comunidade italiana e sua contribuição na construção da memória e da identidade no Brasil e na Argentina

Celebrar as possibilidades do presente é, em grande medida, reconhecer a paixão, o afeto, a coragem e a inovação daqueles que nos precederam. Impossível contar a formação da persona brasileira – e, também, argentina – nos últimos 120 anos sem falar dos imigrantes italianos que, repletos de sonhos, aportaram em massa na América Latina, para ressignificar o próprio sentido de identidade, além de contribuir com a formação de comunidades em seus novos países. Em tal cenário, a criação dos transportes auxiliou não apenas o deslocamento dessas pessoas, como lhes permitiu dar forma ao desafio que traziam nas mãos e no coração. Aviões, navios, trens, ônibus e automóveis carregaram famílias inteiras, com suas esperanças e seus desejos de recomeço. A Fabbrica Italiana Automobili Torino, fundada em 1899, foi essencial em tal processo, ao se consolidar como importante representante do setor de transportes nas inovações industriais dos séculos XIX e XX. A forma como se deram os fluxos de migração da Itália, bem como sua influência na vida cotidiana de brasileiros e argentinos, são tema da exposição “Percorsi Italiani – 120 anos de história na Casa Fiat de Cultura”, em cartaz de 26 de novembro de 2019 a 1º de março de 2020, em Belo Horizonte (MG). A entrada é gratuita.

Ao todo, serão exibidas mais de 100 imagens e fotografias históricas provenientes de acervos do Museu da Imigração (Arquivo Público de São Paulo), do Museu Histórico Abílio Barreto, do Arquivo Público Mineiro, do Centro Storico FIAT e da FCA Group Argentina. Como numa viagem pelo tempo, cada cena permite que sejam revividos importantes marcos, costumes, objetos, instituições, eventos, estéticas e estilos, referentes às mais diversas épocas. De modo único, a exposição propõe, afinal, que os visitantes experimentem o forte entrelaçamento entre as tradições italianas, a Fiat e a vida de uma cidade – de sua fundação aos primeiros vestígios de modernização.

PATROCINANDO SUA LEITURA

Que o digam os destaques da mostra, como a bola do Palestra Italia (Cruzeiro) – time fundado por imigrantes italianos, datada de 1921; o livro de registro de entrada de imigrantes em Belo Horizonte; as reproduções de pôsteres publicitários da Fiat, produzidos por renomados artistas; um desenho original de Raffaello Berti – que fez mais de 500 projetos arquitetônicos em BH –; um passaporte italiano original, datado de 1909; um dos últimos quadros pintados por Amadeo Luciano Lorenzato (em 1990); um exemplar histórico do Fiat 147, lançado em 1979; uma foto de Minas Horizontina, primeira menina nascida na capital mineira, e descendente de italianos.

Com curadoria da jornalista e historiadora Cinthia Reis, a mostra destaca momentos que marcaram a travessia dos italianos para o Brasil e para a Argentina, e tem importante caráter histórico, ao trazer à tona o legado deixado por esse povo em nossa cultura e os desafios enfrentados no percurso. “Convidamos o visitante a se perguntar como seria mudar-se para um país totalmente desconhecido, em uma época sem as facilidades de comunicação e informação da atualidade”, propõe a curadora.

“Nessa exposição, contamos a história da Fiat e de milhares de italianos que resolveram deixar sua terra natal em busca de uma nova vida nas Américas. Tomamos a liberdade de usar um termo italiano – ‘Percorsi Italiani’ – para descrever esse percurso repleto de idas e vindas que nos fazem reviver a mistura das culturas brasileira, argentina e italiana e as muitas paixões comuns que nós temos – como a arte, a culinária, o futebol e automóveis”, destaca o presidente da Casa Fiat de Cultura, Fernão Silveira.

A exposição “Percorsi Italiani – 120 anos de história na Casa Fiat de Cultura” é uma realização da Casa Fiat de Cultura, da Secretaria Especial de Cultura e do Ministério da Cidadania, em parceria com o Centro Storico FIAT, a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e o Museu Histórico Abílio Barreto, com o apoio do Consulado da Itália em Belo Horizonte, do Circuito Liberdade, do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico (Iepha) e do Governo de Minas Gerais. O patrocínio é da Fiat Chrysler Automóveis (FCA), da FCA Fiat Chrysler Participações e do Banco Safra.

Fiat no Brasil – Após o processo de unificação da Itália, na segunda metade do século XIX, o país passou por transformações sociais e econômicas – reflexo da guerra e do fortalecimento da industrialização –, que deram início ao êxodo rural: movimento de pessoas que saíam dos campos em busca de oportunidades nas cidades. Sem empregos para todos, os italianos viram-se obrigados a procurar outras alternativas. Do outro lado do oceano, os países americanos passaram a ser vistos como opção para mudar de vida, superar a pobreza, e dar início a um novo capítulo na própria história.

Unidas pelo desejo de desafiar o impossível, famílias inteiras partiam da Itália com a fé de que, por meio de trabalho árduo, e da diária superação de obstáculos, haveriam de construir novos horizontes. Na década de 1900, América do Sul, Argentina e Brasil começaram a receber e a incentivar a vinda de italianos. Cerca de 11 milhões de pessoas desembarcaram no continente, dos quais 38% vinham da Itália. Com o desejo comum de “fazer a América”, eles encontraram muito mais do que emprego por aqui, pois perceberam a oportunidade de recomeçar.

A história da Fiat está intimamente ligada aos movimentos de migração italiana. Fundada há 120 anos, a empresa marcou o cotidiano das pessoas e ajudou a concretizar o percurso italiano até a Argentina e o Brasil, sendo, também, uma imigrante. A fábrica, mundialmente conhecida pela produção de automóveis, já produziu modelos de trem, como o Pendolino e a Littorina 1934, e motores para navios e aviões de caça.

Em Minas Gerais, a história da Fiat foi oficializada em 14 de março de 1973. Na data, o presidente da Fiat SpA, Giovanni Agnelli, e o governador de Minas Gerais, Rondon Pacheco, assinaram o “Acordo de Comunhão de Interesses entre Fiat e Governo do Estado”. O antigo Palácio dos Despachos, que hoje abriga a sede da Casa Fiat de Cultura, foi cenário desse momento histórico. Três anos depois, em julho de 1976, a fábrica foi inaugurada em Betim (MG).

Doze décadas, doze imagens – Percorrer as galerias da exposição “Percorsi Italiani” é compreender a herança cultural deixada pelos italianos em diversas áreas de nossa vida: indústria, comércio, arquitetura, gastronomia, esporte, arte, crenças e costumes. Para que tenha um panorama desse legado, o visitante começa seu percurso na Galeria de 12 imagens, instalada no hall principal da Casa Fiat de Cultura. Cada uma das décadas, ao longo dos últimos 120 anos, está representada em uma imagem marcante, que conta um pouco do cenário cultural, industrial e social do período em questão.

“A partir do final do século XIX, tem-se o primeiro grande fluxo de pessoas saindo da Itália e chegando à América do Sul. Além de inúmeras famílias, a Fiat pode ser reconhecida como uma ilustre imigrante, que fez o mesmo percurso para se instalar na Argentina e no Brasil”, explica Cinthia Reis. Os registros revelam o dia a dia das famílias italianas que embarcavam rumo à América do Sul, o contexto histórico da Itália e os elementos dos 120 anos da Fiat, que se confundem com a identidade de Minas Gerais, onde está há mais de 43 anos.

A exposição nasceu de detalhada pesquisa acerca do fluxo migratório dos italianos para o Brasil e a Argentina. Os contextos social e econômico desses países foram analisados para entender como influenciaram a saída de tantas pessoas da Itália em um mesmo período. Além da Galeria de Imagens, a mostra apresenta uma linha do tempo, dividida em 12 décadas, que reúne importantes documentos, como fotos e vídeos raros, para apresentar os principais acontecimentos de cada período, e reavivar contextos históricos, sociais e culturais.

Estivadores – Para a maioria dos italianos – e imigrantes de outras nacionalidades – o Porto de Santos, no estado de São Paulo, foi o início de um novo capítulo na própria história. Dali, alguns dirigiam-se para outras regiões do país, enquanto muitos outros permaneciam ali, para trabalhar como estivadores, carregando, além da carga dos navios, a própria história e os rumos de seu futuro. No hall principal da Casa Fiat de Cultura, haverá uma instalação que remete às sacas de café carregadas pelos estivadores italianos.

No céu, na terra e no mar – O deslocamento dos imigrantes europeus para as Américas não aconteceu apenas de um jeito. Para encontrar seu destino, eles seguiam por terra, céu e mar, ávidos por estabelecer o sonho da vida nova, em terra repleta de promessas. Nos novos territórios de desafios e moradia, a Fiat transformou-se em parceira cotidiana das famílias italianas, não apenas como ambiente de vocação e trabalho, mas, principalmente, como referência diária a seu país natal.

No início dos trabalhos na Europa, a fábrica da empresa produzia carros e motores para navio. Nos anos seguintes, passou a também desenvolver motores para submarinos, aviões, e, até mesmo, aeronaves completas, além de geladeiras e máquinas de lavar.

Na escadaria que conecta o hall ao mezanino, estará estampada uma foto de navio – importante meio de transporte dos imigrantes, cenário de rupturas e recomeços. O percurso fica completo com a exibição dos aeromodelos Republic P-47 Thunderbolt, conhecido como “Jug”, e Vought F4U Corsair, que representam a atuação da Fiat na indústria de aviões.

FIAT 147 – Com espírito pioneiro, o primeiro modelo da Fiat fabricado no Brasil foi o 147. Primeiro automóvel do mundo movido a álcool a ser produzido em série, ele ganhou o apelido de “cachacinha” e se tornou um verdadeiro símbolo de tecnologia e inovação. O lançamento foi realizado em Belo Horizonte, em julho de 1979, no Estádio Governador Magalhães Pinto, o Mineirão. O modelo, ainda inédito, inovava ao usar etanol da cana-de-açúcar – então chamado simplesmente de “álcool” – para superar a crise do petróleo.

A mostra “Percosi Italiani” contará com um exemplar original do Fiat 147. O carro pertence ao Ministério da Fazenda – que se tornou Ministério da Economia – e ainda carrega a sigla MF estampada em sua porta, como forma de identificá-lo como patrimônio do governo. De cor preta e placa FO-0292, o veículo, hoje mantido e conservado pela equipe de Engenharia da FCA em Betim, também será uma plataforma de memórias, com a projeção em seu para-brisas de filmes da inauguração da Fiat e da primeira propaganda do Fiat 147.

Sala Design de Comunicação – Para destacar as linguagens plástica e artística, outras bases do design italiano, haverá um ambiente com os principais pôsteres da Fiat, criados ao longo de seus 120 anos, e um monitor com exibição de vídeos publicitários, a exemplo dos icônicos carros 500 e 600 e imagens de época da Fiat. Os cartazes italianos foram criados na última década do século XIX e ajudavam a criar, nas pessoas, o desejo por certos objetos. O impacto dessas mensagens – desenhadas a partir de metáforas, cores e símbolos – inspiraram marcas de outros setores e inauguraram um novo jeito de divulgar produtos.

Para se ter ideia da relevância desses cartazes, basta dizer que artistas consagrados, como Codognato, Marcello Dudovich e Leopoldo Metlicovitz fizeram o design de alguns deles, e conseguiram trazer os carros para a vida cotidiana das pessoas. “Essas peças acompanham as transformações da sociedade e o que se entendia como design em cada época. Carregam em si o DNA artístico tão característico da Itália e retratam estilos de vida, povoando o imaginário de apaixonados por automóveis em todo o mundo”, ressalta Cinthia Reis.

Evolução do logo FIAT – Em 120 anos, o logo da Fiat passou por transformações que acompanhavam as tendências de seu tempo e refletiam a imagem da instituição em cada época. O primeiro logo da Fabbrica Italiana Automobili Torino (Fiat), de 1899, tinha detalhes requintados, como uma espécie de pergaminho. Apenas dois anos depois, os detalhes foram aprimorados e o nome foi substituído pela sigla FIAT. Na década de 1930, a cor vermelha passou a colorir a forma circular do logo, celebrando a participação vitoriosa da FIAT nas primeiras corridas automobilísticas.

Em 1968, o icônico emblema de quatro barras, que formavam a palavra FIAT, foi desenvolvido pelo diretor de design italiano Mario Maioli. Em 1982, acabou redesenhado e ganhou o característico fundo azul. Dentre as muitas evoluções, em 2006, a cor vermelha retornou ao logo e, hoje, a fonte clássica da década de 1930 voltou a ser usada, com formas mais modernas e estilizadas.

Piccola Galleria – Imigração italiana em Belo Horizonte

A construção de Belo Horizonte carrega, em sua essência, traços da italianidade – tão fortes na cultura brasileira como um todo. Os imigrantes italianos começaram a chegar em Minas Gerais no final do século XIX e as marcas desse povo podem ser vistas até hoje na indústria, no comércio e na vida cotidiana, nas ruas, nos edifícios e nas casas construídas por arquitetos, pedreiros, pintores e construtores vindos da Itália, com o objetivo de encontrar mais oportunidades. A cidade que nascia de forma planejada unia-se ao sonho italiano de uma nova vida, marcando a cultura de BH para sempre. No momento em que a capital mineira completa 122 anos, a exposição “Percorsi Italiani” mostra como a imigração italiana repercute na vida da cidade.

Os italianos adaptaram-se muito bem aos costumes de Minas Gerais e, graças à política de imigração do Estado, um grande número de operários se instalou na região e logo começou a morar na zona colonial, que deu início ao povoamento de Belo Horizonte, que, em 1897, ainda se chamava Arraial do Curral del Rey. O Governo Estadual, por meio da Comissão de Construção da Cidade, pagava passagens da Itália para o Brasil, oferecia trabalho e alojamento e recebeu os italianos de braços abertos. Em território mineiro, eles influenciaram a gastronomia, a religião, a arquitetura e até a paixão pelos esportes.

Na Piccola Galleria, serão expostos vídeos, imagens e objetos que retratam a vida cotidiana dos imigrantes, que ajudaram a formar a identidade belo-horizontina. “Aqui, o visitante poderá perceber a influência italiana em suas raízes, sua história, e ter um endosso para construir o futuro, seu próprio percurso e entender sua identidade”, sintetiza a curadora Cinthia Reis.

Reaviva-se o entrelaçamento entre a cultura italiana e o cotidiano belo-horizontino em ricas imagens históricas como a comissão construtora da nova capital; o comércio italiano de sapatos; a missa de inauguração de BH; a pintura do interior igrejinha da Pampulha, com painel de Portinari – importante artista ítalo-brasileiro; o dia a dia de jovens à beira da piscina do Minas Tênis Clube; a Padaria e Confeitaria da Savassi, que deu nome à região e foi fundada pelos descendentes de italiano José Guilherme, Hugo, Geraldo e Danilo Savassi; a bola de futebol do Palestra Itália; e os esboços originais do arquiteto italiano Rafaelo Berti.

Instalação tipográfica – Como forma de traduzir a relação entre Minas Gerais e a Itália, o artista Flávio Vignolli – que é descendente de italianos – e o coletivo 62 Pontos, junto ao QuartoAmado, prepararam um mural de pôsteres lambe-lambe, instalado no mezanino da Casa Fiat de Cultura. A composição tipográfica constitui uma paisagem virtual de poesia, inspirado nos poemas “Nel mezzo de cammin di nostra vita” (No meio da jornada da nossa vida, em português), de Dante Alighieri, e “No meio do caminho tinha uma pedra”, de Carlos Drummond de Andrade. O painel é formado pela sobreposição de 200 cartazes, que propõem diálogos entre as culturas italiana e mineira, com visões micro e macro: de perto, o visitante conseguirá ler os poemas de cada cartaz; de longe, a composição de todos os elementos forma uma paisagem que nos remete a montanhas, céu, terra e mar.

As duas obras são muito importantes para os movimentos artísticos aos quais pertencem. O poema de Alighieri, extraído do livro A Divina Comédia, escrito no século XIV, durante o Renascentismo, é dividido em três partes: Inferno, Purgatório e Paraíso. O protagonista – o próprio Dante – percorre uma viagem nesses três lugares e é uma alusão ao caminho que o pecador faz para chegar a Deus, destacando a necessidade de se seguir o bem e a ética.

Já o poema de Drummond, publicado em 1928, é uma das obras mais importantes do modernismo. Traduz os obstáculos que as pessoas encontram em suas vidas e que as impendem de seguir um determinado caminho. Os dois poemas falam sobre desafios e sobre como passar por eles para dar continuidade ao percurso escolhido, traduzindo o contexto da exposição: todas as batalhas vencidas pelos imigrantes para chegar a uma nova terra e se estabelecerem de forma próspera e feliz.

Década a década: acontecimentos

1899/1909 – Marcado por colapsos de impérios e o nascimento de novas nações, o século XIX foi um período de crescimento tecnológico e de avanços medicinais. A chegada das ferrovias tornou o transporte terrestre mais significativo e fortaleceu a urbanização de vários países. Em 1899, o Caffè Burello, em Turim, foi o berço do automobilismo na Itália. Lá aconteciam as reuniões de constituição da Fabbrica Italiana Automobili Torino – Fiat. Os automóveis se tornaram símbolo de inovação tecnológica e objeto de desejo, embora ainda fosse um artigo de luxo. Também foi nessa época que as famílias de italianos chegavam ao Brasil, enriquecendo ainda mais a identidade nacional, por meio de valores como a união familiar e a força de trabalho.

1910/1919 – A Fiat cruza o oceano, no mesmo percurso feito pelos imigrantes, e chega Argentina, para iniciar uma fase de expansão. Paralelamente, os italianos continuam se instalando na Argentina e no Brasil e ficaram marcados pela forma de se vestirem, seus traços físicos e famílias numerosas. O setor agrícola ganha forte influência dos italianos, não apenas na mão-de-obra, amplamente empregada nas plantações, mas pelos automóveis para o campo produzidos pela Fiat – que ressignificou a utilização de veículos a motor. De 1914 a 1918, eclodiu a Primeira Grande Guerra. A indústria foi transformada pelos conflitos bélicos e inúmeras mulheres e crianças se tornaram operárias, enquanto os homens partiam para os campos de batalha. Naquela ocasião, as fábricas de Turim foram o berço da primeira motorização em massa entre as guerras, e a economia italiana teve um milagroso crescimento.

1920/1929 – Após a Primeira Guerra Mundial, a Itália via nascer o Fascismo, movimento que mudou a história do país. Enquanto a Europa se recuperava da guerra, a Argentina passava por um período de prosperidade. Em 1919, nascia a sucursal da Fiat Turim, em Buenos Aires. Apenas seis anos depois, foi aberta a segunda sucursal argentina. No país, a empresa se especializou em venda e assistência técnica de caminhões e carros vindos da Itália. O Brasil vivia um grande movimento de urbanização de suas cidades, especialmente com a chegada de imigrantes italianos. Pequenos comércios e indústrias foram expandidos, aumentando o contingente de comerciantes, artesãos e industriais.

1930/1939 – O crescimento da indústria nacional substitui as importações de produtos na Itália, o que propiciou significativo crescimento econômico ao país. A migração transoceânica diminuiu, mas a influência italiana continua forte na América do Sul. Na Argentina, as fábricas funcionam com um grande número de mulheres italianas, que levaram para o país as habilidades aprendidas em sua terra natal. No Brasil, os imigrantes estão cada vez mais inseridos na sociedade e a primeira geração de descendentes começa a nascer, acompanhando o crescimento populacional brasileiro. Nessa época, a Fiat começa a produzir carros pequenos e econômicos, como o Fiat 500, que tinha linhas arredondadas e era um dos menores do mundo – o que foi essencial para entrar em um mercado pouco consolidado.

1940/1949 – Essa foi uma década marcante. Entre 1939 e 1945, o mundo viveu o horror da Segunda Guerra Mundial. Embora o Brasil e a Argentina tenham participado de forma modesta, a Itália esteve no centro do conflito e ingressou ao lado dos Países do Eixo, contra os Aliados. Indústria, ciência e economia voltaram seus esforços para a guerra. Ao final da guerra, uma nova onda de migração acontece e cerca de 300 mil italianos aportam na Argentina. Já no Brasil, a vinda de italianos entrou em decadência e recebeu apenas 15 mil imigrantes entre 1940 e 1945.

1950/1959 – A Itália passa por seu “milagre econômico” e, ao retomar as atividades do período que antecedeu a guerra – como a produção de automóveis – rapidamente se torna uma potência mundial na economia e na indústria. Com a produção de locomotivas, carros ferroviários, máquinas de lavar roupa e refrigeradores, a Fiat começa a fabricar seus produtos em larga escala, com acelerado crescimento, e se insere, cada vez mais, na vida cotidiana das pessoas. Apesar da forte participação das mulheres no corpo de operários de diversas indústrias, a balança profissional ainda sofre com desigualdades.

1960/1969 – A expansão econômica da Itália inspirou a Fiat, que, com seus automóveis, mudou o caráter agrícola e pobre do país, para uma nação moderna e motorizada. A industrialização do norte italiano atraiu cerca de 300 mil sulistas e o desemprego caiu consideravelmente. Na Argentina, os investimentos nos setores de energia e indústria devolveram certa autossuficiência ao país. No Brasil, o Regime Militar foi instituído, em 1964, mas o país continuou vivendo tradições como o Carnaval, que tinha fantasias inspiradas em personagens clássicos do teatro popular da Itália, a exemplo da Colombina e do Arlequim. Os Centros de Design da Fiat se tornam fundamentais para a concepção e produção de carros, com a preocupação de aliar estética e funcionalidade.

1970/1979 – O crescimento da indústria automobilística, bem como a estabilidade econômica e o aumento do poder aquisitivo contribuíram para o desenvolvimento das cidades, com estradas, transportes coletivos, mobilidade e conveniência. Em 1976, a Fiat inaugura sua fábrica em Betim, Minas Gerais, transformando o cenário industrial da região. A cidade, com apenas 40 mil habitantes na época, hoje possui economia fortemente baseada na indústria automotiva, tendo atraído outras empresas para a produção de peças e insumos. A obra demorou dois anos para ficar pronta, em um terreno de 2,25 milhões m². Com o programa Proálcool, criado pelo Governo durante a crise da Gasolina, a Fiat lança o 147, movido à álcool – um reflexo dos novos tempos.

1980/1989 – Essa foi uma década de fatos marcantes: fim da Guerra das Malvinas, entre Inglaterra e Argentina; o desastre de Chernobyl; a queda do muro de Berlin. A população mundial chegou a 5 bilhões de pessoas. Acompanhando as evoluções da sociedade, a Fiat lança o Uno, em 1983. Com o conceito “pequeno por fora e grande por dentro”, foi o modelo mais vendido da marca até hoje, tendo sido produzidas 4 milhões de unidades na fábrica de Betim.

1990/1999 – O fortalecimento da democracia, da globalização e do capitalismo marcam essa década – que teve forte desenvolvimento tecnológico. O Google foi fundado em 1998 e a internet começava a se tornar popular. Os avanços chegam à indústria automobilística, mais moderna, com produção robusta, capaz de atender demandas em escala mundial. À época, a fábrica da Fiat em Betim passou por um processo de “mineirização”, visando melhorar sua logística de produção. Graças a isso, 70% dos materiais usados pela Fiat Brasil são provenientes de empresas sediadas em Minas Gerais.

2000/2009 – Nos anos 2000, o fluxo de migração se inverte e muitas pessoas começam a ir para a Itália, que entra para a rota da imigração moderna. A Argentina, conhecida como a mais europeia das nações latino americanas, teve o inédito registro, nos anos 2000, de que a comunidade de imigrantes de países limítrofes ultrapassou a quantidade de imigrantes europeus, segundo o censo realizado na época. O Brasil ganha projeção internacional e continua sendo visto como um bom destino para imigrantes. Em Minas Gerais, a Fiat cria o projeto “Árvore da Vida”, que promove atividades socioeducativas e ações de incentivo à geração de emprego no entorno da fábrica, em Betim. Pautada pelos pilares de investimento em educação e desenvolvimento da cultura – muito forte na Itália – a iniciativa reforça a italianidade da Fiat e seu compromisso com a sociedade.

2010/2019 – A tecnologia continua a se expandir rapidamente em todo mundo. Em 2014, a Fiat se une à Chrysler e forma a Fiat Chrysler Automobiles (FCA), trazendo mais inovações tecnológicas e sustentáveis, com projetos que visam, não apenas o crescimento comercial, mas o desenvolvimento das comunidades em seu entorno. Com 16 mil funcionários apenas na planta em Betim, a Fiat tem quadro funcional composto por mineiros, descendentes de italianos e pessoas de outras origens, reflexo da riqueza de origens tão características do povo brasileiro. Vale destacar que, nos últimos dez anos, os fluxos migratórios mudaram e a Europa se torna ponto de chegada – e não de partida. Milhares de imigrantes saídos da África, do Oriente Médio e da Ásia Meridional buscam refúgio em diversos países. E o Brasil continua na rota da migração, em um fluxo que está em constante transformação, mas nunca acaba.

Ações do Programa Educativo

O Programa Educativo da Casa Fiat de Cultura também preparou ações diversificadas para o público, que serão realizadas durante o período de exposição. As visitas mediadas, que exploram a história da imigração e os contextos sociais da Itália, da Argentina e do Brasil, nesses 120 anos, serão feitas para grupos espontâneos (conforme disponibilidade) ou por agendamento, no telefone (31) 3289-8910.

Também sob agendamento, a atividade “Árvore da Italianidade” propõe a construção coletiva de uma árvore genealógica da italianidade em Minas Gerais. “Nessa árvore, os visitantes poderão incluir o nome de familiares, palavras usadas no dia a dia, costumes, comidas que fazem parte de sua rotina e que, de alguma forma, tenham raízes na Itália. A expectativa é despertar essas conexões com o percurso de visitação e destacar, ainda mais, a presença italiana na nossa mineiridade”, explica a coordenadora do Programa Educativo, Clarita Gonzaga.

Além disso, haverá programação paralela específica em cada mês. Em dezembro, o “Encontros com Patrimônio” levará os participantes a um trajeto que começa no Parque Municipal e se encerra na Casa Fiat de Cultura, passando pela Av. João Pinheiro e pela Praça da Liberdade. “A proposta é abordar as referências italianas presentes de forma atemporal na arquitetura da cidade”, explica Clarita. Ainda em dezembro, o “Ateliê Aberto: Pop-Up de Natal” vai ensinar os participantes a criarem cartões natalinos inspirados pela imagem do presépio, uma tradição de origem italiana que começa com São Francisco de Assis, e suas interpretações contemporâneas.

Em 12 de janeiro, o Programa propõe um Passeio Cultural pelos chamados “negócios de famílias” que existem em Belo Horizonte, com vínculos tradicionais que atravessam o tempo. Nesse mês, o público ainda poderá participar do “Ateliê de Férias: A Velha Befana” e confeccionar fantoches de palito e dedoches, inspirados pela Velha Befana – figura tradicional do folclore italiano, que distribui doces às crianças no início do ano, trazendo ventos de esperança e boas novas.

Em fevereiro, o “Ateliê Aberto: Carnaval de Veneza em BH” será inspirado no tradicional Carnaval de Veneza e apresentará três formatos de máscaras, à moda veneziana, para serem decoradas de acordo com a criatividade de cada participante, resultando em peças únicas e personalizadas.