Com a proximidade do inverno e o advento de 2 de Junho – aniversário da República Italiana -, multiplicam-se as festas de apelo tricolor e eventos culturais que celebram a cultura e as tradições italianas e ítalo-brasileiras. A movimentação é maior nas regiões Sul e Sudeste do país, onde se concentra majoritariamente a maior comunidade itálica do mundo, calculada em cerca de 35 milhões de ítalo-descendentes.
Assim, apenas neste e no próximo fim de semana há festas em diversas cidades do Rio Grande do Sul, que ainda comemora o 140º aniversário da chegada dos primeiros imigrantes italianos no Estado, com destaque para a “XI Settimana Italiana di Porto Alegre” da Sociedade Italiana do Rio Grande do Sul – Sirgs; em Belo Horizonte, que edita a nona versão de sua Festa Tradicional; em Salto, no interior de São Paulo, que realiza a 19ª Festa Ítalo-Saltense; em Curitiba, que dá prosseguimento ao “Mia Cara Curitiba” e vê acontecer também a 14ª Festa Trentina, tradicionalmente realizada no Parque Trentino de Piraquara, que este ano marca os 137 anos da chegada das primeiras famílias trentinas na Colônia de Santa Maria do Novo Tirol, só para citar alguns desses eventos.
A concentração dos festejos nesta época do ano, além das recorrência de datas especiais e comemorativas, tem a ver também com as origens da imigração italiana, formada inicialmente em grande parte por colonos e agricultores: era no inverno, após a colheita, que as famílias tinham alguma folga, antes de começar novo ciclo agrícola. Então aproveitavam para trabalhos comunitários e comemorações.
Os eventos, na maioria deles, cultiva ainda o perfil do trabalho comunitário e dativo herdado das atividades sociais comandadas pelas comunidades paroquiais, mas ultimamente algumas dessas festas, já tradicionais no calendário de muitas cidades, saíram do amadorismo e passaram até a aproveitar recursos decorrentes da renúncia fiscal do governo brasileiro, isto é, são financiados por empresas através da Lei de Incentivo à Cultura. Tais recursos, em alguns casos, são aproveitados até para festejar uma data exclusivamente italiana de 2 de junho, como tem ocorrido em Curitiba, cujo consulado italiano, este ano, deslocou a festa para o próximo dia 9 de junho, enquanto a Embaixada, em Brasília, manteve o 2 de junho.
Aproveitando o clima, algumas iniciativas mais recentes emprestaram conotações políticas ao que até então tinha pretensões apenas sociais, folclóricas ou culturais. É o caso da III Jornada Parlamentar Ítalo-Brasileira, que acaba de ser realizada em São Paulo, na sede da Câmara Municipal, por iniciativa do deputado Fabio Porta e que este ano trouxe ao Brasil a presidente da Câmara dos Deputados italiana, Laura Boldrini, que esteve também em Brasília e agitou parte das lideranças ítalo-brasileiras, incluindo os também parlamentares Renata Bueno e Fausto Longo.
Ainda em São Paulo, há poucos dias aconteceu a 28ª Festa Italiana de Jundiaí, evento que já faz parte do calendário da cidade e movimenta o turismo e a gastronomia local. Para manter a tradição, como ocorre quase sempre em eventos do gênero, a festa para 130 mil visitantes foi aberta com uma missa… em italiano. Exceção seja feita à Festa Tradicional Italiana de Belo Horizonte que tem as características de festa de rua, no bairro Savassi, para onde acorrem, durante um dia inteiro, cerca de 30 mil pessoas para comer e se divertir com shows, exposições manifestações culturais de todo o tipo.
Ensinam essas festas que o cultivo de tradições e culturas se mistura, às vezes, com saudade de tempos nem sempre distantes. E a festa do próximo fim de semana (4 a 7 de junho) em Salto está trazendo de volta à cena, ao lado de Vozes Afro, Canto da Terra, corais e bandas da região, nada mais nada menos que o cantor Jerry Adriani.
Enquanto Santa Teresa, no Espírito Santo, programa a abertura de sua XXIV Festa do Imigrante Italiano para o dia 19 próximo, também em Santa Catarina multiplicam-se eventos do gênero: Nova Veneza acaba de eleger rainha e princesas para o seu 11º Festival Italiano e VII Baile de Máscaras, que acontecerão no final de maio, enquanto Urussanga acaba de realiza a 14ª edição da festa “Ritorno alle Origini”, com uma novidade que chamou de “La Sagra di Bacco”, mantendo, entretanto tradicionais atividades como as “Olimpíadas Coloniais Rurais”. No Vale do Itajaí, ocorrem festas do gênero em Rodeio, Rio dos Cedros, Nova Trento, Rio do Sul, Ascurra e nem mesmo a mais alemã das cidades brasileiras – Blumenau – escapa do sotaque e das cores italianas com sua Festitália que este ano, em sua 22ª edição, vai acontecer de 10 a 19 de julho na Vila Germânica, palco da… Oktoberfest
Mas talvez a mais bem organizada programação de eventos envolvendo a comunidade ítalo-brasileira, este ano, acontece no Rio Grande do Sul, onde instituições do governo do Estado e das Prefeituras Municipais uniram-se ao Consulado Geral da Itália em Porto Alegre e às inúmeras associações e círculos italianos para costurar uma vigorosa comemoração dos 140 anos do início da imigração italiana no Estado.
A festa italiana no RS, para onde acorreu inclusive o embaixador da Itália, Raffaele Trombetta, começou na Capital, onde o parlamento gaúcho realizou até sessão especial, passou por Nova Milano, em Farroupilha, onde lideranças políticas e empresariais do primeiro time lembraram as três primeiras famílias imigrantes italianas que ali chegaram e se espraiou por toda a Serra Gaúcha e fora dela, onde os imigrantes italianos e seus descendentes plantaram raízes, como Santa Maria – a cidade coração do Rio Grande do Sul.
Municípios como Caxias do Sul, Garibaldi, Bento Gonçalves e outros da Serra organizaram programação especial, contendo manifestações culturais de todo o tipo e homenagens a dedicatos agentes da “cultura talian”. Em Bento Gonçalves, as Secretarias de Turismo e Cultura organizaram uma “Settimana Italiana de Bento”, conseguindo a proeza de envolver, pela primeira vez, todas as associações italianas do município na extensa programação que incluiu e misturou cinema, vinho, folclore, canto, dança, desenho e pintura, turismo, fotografia e religião, jogos e campeonatos, apresentação de bandas e exposição de histórias, carroças e artesanato, até o lançamento de um livro intitulado “Sabores da Itália”, de autoria de Darcy Loss Luzzatto – um dos “pais” do Talian, o dialeto ítalo-gaúcho-brasileiro que, recentemente, acabou sendo reconhecido como patrimônio imaterial brasileiro.
Nesse contexto, uma iniciativa que merece destaque – e da qual damos testemunhos com os vídeos que anexamos a esta matéria – foi a viabilização da vinda do artista italiano de Treviso, Mirko Satto, e seu acordon especial, para uma série de consertos denominado “Concerti per i Gemellaggi”, que percorreu todos os municípios que mantêm tratado de irmandade ( “gemellaggio”) com cidades italianas – obra que tem à frente o trabalho de Cesar Prezzi, o consultor do Vêneto para o Rio Grande do Sul. Na esteira de tal iniciativas, outros tratados passaram a ser entabulados.
A alma italiana da grande comunidade ítalo-brasileira não cabe em poucas linhas nem se esgota nesse simples e incompleto relato.