Ao denunciar o sumiço de 82 nomes de ‘enfileirados’ de uma lista de 2011 do Consulado Geral da Itália em Curitiba, o conselheiro do Comites – ‘Comitato degli Italiani all’Estero’, Elton Diego Stolf afirma que a lista de espera dos inscritos à obtenção do reconhecimento da cidadania italiana por direito de sangue “é livremente manipulada pelos responsáveis do setor” e pede providências das autoridades italianas e, inclusive, do próprio Conselho de que faz parte.
Elton, que é também advogado, comparou a antiga lista de 2011 com a atual, com base na qual são feitos os chamamentos, e constatou o sumiço. Por ironia, exatamente hoje estaria vencendo o prazo para os “sumidos” apresentarem a documentação perante a autoridade consular. O conselheiro encaminhou a Insieme uma série de documentos no intuito de comprovar o quanto afirma em sua denúncia e faz um repto: “desafio me provar o contrário se o relato abaixo não for a mais absoluta verdade”.
Segue o relato de Stolf, cujo conteúdo já foi anteriormente levado – segundo ele – ao conhecimento do Cônsul em Curitiba e do próprio Comites sem nenhuma providência conhecida: “Respeito é a palavra certa para iniciar esse artigo, pois o que passo a relatar nesse texto é mesmo lamentável. Uma verdadeira falta de respeito do Consulado Geral da Itália em Curitiba com a nossa comunidade ítalo-brasileira dos estados do PR e SC, aliás, mais um absurdo dentre tantos.
Desde o ano 2003 acompanho o andamento da malfadada lista de espera de descendentes de imigrantes italianos para requerimento da nacionalidade italiana junto ao consulado de Curitiba. O assunto foi tema objeto da minha monografia de conclusão do curso de direito e, também, em sede de Mestrado em Relações internacionais – especificamente sobre os descendentes trentinos e a precária estrutura consular para atendê-los no exíguo prazo da lei 379/2000. Por esse motivo, desde então, em todo semestre faço download da lista de espera e comparo as listas publicadas precedentemente. Por conta do meu envolvimento na comunidade italiana em defesa dos interesses dos ítalo-brasileiros, em 2015 me candidatei a uma cadeira no ‘Comitato degli Italiani residenti all’Estero – Comites de Curitiba e meu interesse em defesa dos enfileirados é notório em toda reunião do comitê, a ponto de vestir um nariz de palhaço para protestar contra a falta de respeito da Itália para conosco!
O absurdo de hoje é a minha afirmação de que a lista de espera do consulado em Curitiba é livremente manipulada pelos responsáveis do setor – e desafio me provar o contrário se o relato abaixo não for a mais absoluta verdade!
Caro leitor, desde já lhe proponho fazer um teste: Entre agora no site do Consulado Geral da Itália em Curitiba e faça hoje o download da lista de espera dos requerentes da cidadania. Após abrir a lista no Excel, crie uma coluna e trace uma ordem numérica sequencial. Ao final você irá perceber que o número atribuído aos requerentes não possui sequencia numérica, ou seja, alguns números de protocolo simplesmente sumiram de modo misterioso da lista. Faça esse teste agora e comprove isto, antes que o consulado retire o arquivo do portal (e é bem capaz que o façam)!
Agora lhe pergunto: o que poderíamos imaginar a respeito do sumiço de nomes e números de protocolo de fila de espera? Inicialmente duas coisas me veem em mente: a) a primeira, de que os descendentes que estavam na fila com o protocolo n.º 36338, 36349, 36352, 37128, 37452, 37460, 37495, 37526, etc., por exemplo, tenham transferido a residência deles à Itália para fazer lá o pedido de cidadania (pois lá em cerca de 3 ou 4 meses se conclui o procedimento) e o diligente funcionário consular muito gentilmente retirou o nome desse novo cidadão italiano da lista publicada no portal – por conta da lei da ‘privacy’ italiana; ou b) a segunda, de que, por algum motivo, esse enfileirado eventualmente tenha sido beneficiado pelo gestor do departamento de cidadania do consulado – obviamente sob ciência e a devida autorização do sr. Cônsul da época – a antecipar os efeitos da convocação para beneficiar esse enfileirado antes mesmo dele ser convocado – e por isso também o número de espera tenha sido gentilmente retirado da fila – para não dar tanto na cara (né?) que alguém da fila já é cidadão italiano antes mesmo de ser convocado. Aliás, sobre esse segundo aspecto, outro dia alguém me falou que essa prática é corriqueira quando o sr. Cônsul (e não o funcionário consular, atenção) entende ser a pessoa que ele deseja atribuir a cidadania alguém muito importante mesmo e que ele, cônsul, em base ao seu poder discricionário pode atribuir a cidadania mesmo se tal pessoa importante não está na fila de espera por conta do interessa nacional italiano. Eu me lembro, pelo que soube, que isso aconteceu realmente, como é notório, com alguns políticos de peso e empresários do PR e SC tempos atrás.
Essas duas assertivas acima geralmente acontecem sim, mas são difíceis de se provar, pois quem já é cidadão e fez na Itália não se importa mais com a fila de espera e, no segundo caso, o descendente que recebeu vantagens consulares de modo completamente desrespeitoso e imoral (tanto pra ele quanto para o funcionário consular) certamente irá ficar bem quietinho e curtir o seu passaporte vermelho sem contar nada pra ninguém, nem mesmo para seus próprios familiares…
Mas além dessas situações, uma em particular me deixou especialmente? intrigado ainda no ano passado quando descobri o seguinte fato absurdo: uma sequência de 82 nomes da lista de espera de 2011, entre os números 38.595 a 38.677, simplesmente sumiu da planilha Excel publicada atualmente no site do Consulado Geral da Itália em Curitiba. Sim, os nomes sumiram. Ou seja, os números de protocolo e espera nesse intervalo que estão publicados na atual lista do site do consulado não correspondem aos números do mesmo intervalo constante na lista publicada no site em 2011. Alguns poucos nomes, inclusive, aparecem misteriosamente na lista atual com outro número de protocolo posterior.
Nesse arquivo você pode constatar a lista de 2011 ( Arquivo A – 36001-39000_2011 ) e a minuciosa leitura que fiz de cada um dos nomes que sumiram ou foram relocados com outros números de protocolos posteriores. Nesse arquivo segue a atual lista publicada no site do consulado ( Arquivo B – lista_valida_2018 ).
Quando comparei a lista que está atualmente publicada no portal com aquela que tenho guardada de 2011 constatei o referido intervalo que sumiu e imediatamente comuniquei ao presidente do Comites do PR e SC sobre essa séria situação, que disse que ia verificar.
Sem esperar a atuação do sr. Presidente do Conselho, tomei a iniciativa de voluntariamente procurar essas pessoas nas redes sociais e sites de pesquisa de telefones para poder fazer o primeiro contato com o objetivo de verificar se esses enfileirados tinham conservado os papéis de inscrição na fila em 2011. Ao me apresentar como conselheiro Comites. interessado em tentar salvar o lugar delas na fila fui muito bem recepcionado em muitos casos de pessoas que realmente aguardavam pacientemente alguma comunicação do consulado para entrega da documentação – como era a regra em 2011. Aquelas que já tinham ido à Itália porque perceberam que não estavam mais na fila simplesmente agradeceram o contato e informaram desinteresse no assunto. Outras nessa mesma condição ou que ainda não são cidadãos italianos confirmaram o absurdo e o descaso consular e se comprometeram a procurar as cartas com AR (aviso de recebimento) e as fichas de cadastro daquela época para comprovar documentalmente que o consulado realmente manipulou a lista de espera e prejudicou não apenas uma pessoa singularmente de uma única família, mas um grupo enorme de 82 pessoas de famílias distintas, de várias localidades da circunscrição consular e que não se conhecem.
Aliás, cabe aqui uma ressalva: sempre nas reuniões do Comites escuto ecoar que o conselho “não pode levar adiante reclamações de casos particulares” e que “devemos sempre priorizar situações de interesse coletivo”, pois bem, estamos diante de uma situação séria, muito séria de péssima gestão (grifo) do serviço consular relacionado à fila de espera de 82 pessoas que aguardaram pa-ci-en-te-men-te por longos 8 anos para serem convocadas e jamais foram chamadas. Aliás, hoje, dia 10/05 seria o prazo para que apresentem documentos, isso se tivessem, ao menos, com o nome na lista da convocação.
No início desse ano por três vezes solicitei providências ao presidente do Comites, mas não obtive o retorno desejado e no último dia 02 de maio enviei diretamente e-mail ao Cônsul e Vice-Cônsul de Curitiba e em cópia a todos os conselheiros do Comites pedido de providências imediatas para que o equívoco seja reparado em benefício desses enfileirados prejudicados pelo consulado. Hoje enviei outro email, dessa vez com cópia ao representante do CGIE (‘Consiglio Generale degli Italiani all’Estero’ – NR) e ao próprio Embaixador da Itália no Brasil.
As cartas com AR ao lado são apenas alguns exemplo de provas irrefutáveis e inequívocas da irresponsabilidade consular na manipulação da lista de espera, pra evitar que alguém de muita má-fé e em defesa do consulado diga que a lista foi manipulada por terceiros de fora do consulado.
Além de considerar ilegal a fila de espera, considero também uma verdadeira palhaçada o que o ‘Sistema Itália’ faz conosco, pois segundo a lei italiana nós nascemos italianos e a pública administração italiana presente no Brasil parece querer barrar de todos os modos burocráticos possíveis o reconhecimento dessa nossa condição de nacionalidade. O descaso aqui relatado é só mais uma dessas barreiras.
Por fim, sinceramente, não espero apenas uma resposta dos funcionários do setor dizendo “foi um mero equívoco do encarregado da época” (senão for o mesmo funcionário) se eximindo, portanto, da responsabilidade atual e, de modo bem corporativo, defendendo o colega, mas sim, espero mesmo é que o atual Cônsul direcione principalmente aos 82 enfileirados prejudicados com o sumiço dos seus nomes da lista de espera e aos que foram relocados a outros números de protocolo, mas também, à inteira comunidade italiana do PR e SC, um sincero e digno pedido de desculpas e assumir a responsabilidade pelo fato absurdo ocorrido e, também, que formalmente convoque esses 82 nomes para que apresentem a documentação num prazo razoável – independente daqueles que tenham ou não o AR, pois desde 2011 o que resta em muitos casos é apenas o nome naquela lista.
Caro ítalo-brasileiro, é mais um absurdo ou não? Uma resposta digna é o que eu espero como legítimo representante em pleno exercício voluntário do meu cargo eletivo de conselheiro do Comites em defesa dos interesses da nossa inteira comunidade ítalo-brasileira do PR e SC. Se o consulado não se manifestar em benefício dos 82 enfileirados prejudicados estará desrespeitando não apenas a mim como representante da comunidade, mas sim, uma inteira comunidade que anseia simplesmente por respeito pela sua condição de ítalo-brasileiro colonizador.
A palavra certa para terminar esse artigo com mais esse absurdo consular não poderia ser outra senão simplesmente clamar por: respeito.”