Senador Fausto Longo (Foto D. Peron / Arquivo Insieme

“Defendo o “Sim”, votarei pelo “Sim”, peço que votem pelo “Sim”, declara o senador Fausto Longo sobre a reforma Renzi-Boschi que será submetida ao referendo popular no dia 4 de dezembro próximo. Da votação participarão por correspondência também os quase quatro milhões de eleitores que vivem fora da Itália.

Se vencer o “Sim”, Longo será um dos 321 senadores que perderão o emprego, mas ele assegura que não foi eleito “para criar mecanismos de manutenção de privilégios, ou cargos” mas, sim “para participar do processo de discussão de propostas e projetos, assim como, colaborar na construção de um conjunto de leis que permitam reafirmar a soberania do povo italiano na definição de seu próprio destino”.

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Em sua nova configuração, o novo Senado extingue a representação dos italianos no exterior, que atualmente dispõem de seis cadeiras, no total, assim como também serão extintas as Províncias italianas. Na entrevista exclusiva que concedeu à Revista Insieme, o senador foi questionado sobre o número de eleitores ítalo-brasileiros que poderia ser bem maior, caso não existissem as famosas “filas da cidadania” diante dos consulados. “Espero que, a partir da constatação que podemos nos caracterizar como um forte fiel da balança eleitoral, nossa comunidade possa resgatar o respeito que sucessivos governos insistiram em manter em planos inferiores e, dessa forma, ampliar as respostas que precisamos para atender condignamente as demandas de todos os italianos que vivem fora do território.”

Fim das Províncias, uma nova lei eleitoral já nati-morta, um novo Senado… Um Referendum sobre muitas coisas mas que divide o mundo italiano num simples “Sim” ou “Não”… Como descreve o momento político italiano?

O momento político italiano reflete, no meu modo de ver, a existência de uma tendência mundial de revisão nos processos de governança, incluindo-se, nesse contexto, contestar ou reafirmar os atuais sistemas de representação e, sempre, um aperfeiçoamento na participação das pessoas na definição das prioridades de cada país, ou seja, um desejável processo de amadurecimento democrático. Se pretendemos um futuro diverso, precisamos, estrategicamente, repensar as práticas do presente. Se insistirmos no mesmo modelo, não poderemos esperar nada além do mesmo. Ousar e propor mudanças impõe riscos e amplia a responsabilidade, porém, também oferece a oportunidade de discutir-se qual Itália queremos. Após três décadas de discussão sobre os mesmos principais itens que compõem a atual proposta de reforma, após uma ampla discussão no contexto do parlamento, após idas e vindas no ambiente institucional de ambas as casas legislativas e sempre aprovadas, não se pode afirmar que estamos diante de um simples “Sim” ou “Não”, mas, como em qualquer democracia madura, o referendo busca legitimar ou não, as decisões de um parlamento composto segunda as regras vigentes que regeram o processo eleitoral, portanto, cumprindo constitucionalmente suas funções. Sendo que todos os aspectos da reforma estão sendo amplamente divulgados com dados comparativos entre atual modelo e ao do modelo proposto, permitindo ao povo italiano, decidir, com sua própria consciência o destino que deseja, bem como, com quais mecanismos legais pretende construir a Itália que almeja para si e para as gerações vindouras.

Defende o “Sim” no Referendum mesmo significando isso o final de sua carreira política no Senado Italiano, para que foi eleito. Nas próximas eleições, vai se candidatar a deputado? Não vê nisso conflito com seus eleitores?

Defendo o “Sim”, votarei pelo “Sim”, peço que votem pelo “Sim”, por acreditar que temos uma oportunidade de aperfeiçoar o processo de gestão do país, tornando-o mais ágil, eficiente e eficaz. Creio que seja um processo de modernização e, mesmo que apresente falhas, devemos entendê-lo como um processo dinâmico de amadurecimento. O medo de ousar cria um imobilismo que em nada contribui para avançarmos na modernização da gestão pública. Claro que o perfeição será impossível de se conseguir e o consenso total também, afinal vivemos uma democracia onde existe e convive uma imensa diversidade de visões, de anseios, de modelos idealizados de pais. Não fui eleito para criar mecanismos de manutenção de privilégios, ou cargos, penso ter sido eleito para participar do processo de discussão de propostas e projetos, assim como, colaborar na construção de um conjunto de leis que permitam reafirmar a soberania do povo italiano na definição de seu próprio destino. Quanto ao futuro, devo dizer que aprendi, desde cedo, que, em política e na vida, tudo depende das circunstâncias. Neste momento tenho a responsabilidade do mandato, pretendo, como tenho feito, cumpri-lo com ética e responsabilidade.

O Senado em sua nova configuração será formado por representantes das Regiões e Capitais. A Circunscrição Exterior não poderia ser considerada uma Região e, portanto, manter as seis cadeiras hoje destinadas aos italianos no mundo?

Correto. O novo formato do Senado propõe o fortalecimento da representação regional territorial. Ideia que defendo e acho corretíssima. Caberá à Câmara dos Deputados e respectivos deputados eleitos no exterior, exercer a função de representação do povo, enquanto o Senado fortalecerá o conceito territorial de nação. Se, finalmente, um dia, a Itália entender-se como uma nação verdadeiramente globalizada, um só povo, todo o conjunto de leis discutidos e aprovados nos dois ramos do parlamento, irá trazer benefícios, progresso e oportunidades para todo o povo italiano, não importando onde viva. Em relação à segunda questão, duas evidências devem ser consideradas, a primeira é que depois do percurso legislativo já realizado torna-se impossível incluir qualquer modificação e, pela lógica, devemos ser conscientes que por regiões entende-se unidades administrativas que pertecem efetiva concretamente ao território italiano. Como ter uma representação de um território onde o Senado não tem prerrogativas legais para interferir? Já, a representação dos interesses daqueles cidadãos italianos que vivem fora do território mas dependem da proteção legal e dos serviços públicos que independem de fronteiras físicas por serem materialmente intangíveis, certamente a Câmara dos Deputados saberá muito bem representar.

Desde que instituído o voto dos italianos no exterior, há, na Itália, um difuso sentimento de intromissão dos que vivem fora dela na política interna. E, visto as últimas sondagens, nesse referendum essa “intromissão” poderá ser determinante. Não teme que amanhã cortem também, na Câmara, as cadeiras da Circunscrição Exterior?

Sinceramente, não percebo esse tratamento diferenciado aos eleitos no exterior, ao contrário, pelo menos, no ambiente do Senado, somos Senador Claudio Zin e eu, tratados com a mesma consideração e respeito dispensada aos demais senadores. No contexto do grupo parlamentar ao qual ambos pertencemos, da mesma forma, somos igualmente respeitados. No PSI, partido ao qual sou filiado e membro de sua secretaria, sempre fomos tratados com estima e consideração. Creio que, quanto maior for a participação política da comunidade italiana, mais seremos respeitados e ouvidos em nossas demandas. Além do que, acredito que nossa comunidade deve ampliar sua participação política no território onde vive, elegendo seus representantes mais comprometidos com suas causas nos parlamentos municipais, estaduais ou federal.

Vimos a ministra Maria Elena Boschi circular pela América do Sul em busca de apoio ao “Sim”, com grande respaldo parlamentar e inclusive institucional de Embaixadas, Consulados e Comites. Na área somos mais de um milhão de eleitores, mas poderíamos ser mais, muito mais, não fossem as filas da cidadania. Que lhe parece a contradição? Agora ex-enfileirados contam?

Certamente uma maior e mais significativa participação da comunidade italiana nesse processo de votação da reforma, pelo “Sim” ou “Não”, contribuirá muito para despertar a classe dirigente política sobre a importância dessa comunidade. Espero que, a partir da constatação que podemos nos caracterizar como um forte fiel da balança eleitoral, nossa comunidade possa resgatar o respeito que sucessivos governos insistiram em manter em planos inferiores e, dessa forma, ampliar as respostas que precisamos para atender condignamente as demandas de todos os italianos que vivem fora do território.

As normas que regerão o voto dos italianos no mundo são as mesmas que foram condenadas na eleição dos Comites, por temor de fraudes. Falava-se, à época, de mais mudanças… O temor desapareceu?

As regras vigentes são essas. Se pretendemos algo diferente para os próximos pleitos, devemos ter a coragem de propor e mudar. Sempre levando em conta que tudo o que está aí, vigente, não foi fruto de um passe de mágica, nem caiu do céu, ao contrário, foi construído ao longo de um longo processo democrático.

Entre outras críticas, os defensores do “Não” apontam para a concentração de poderes nas mãos do Executivo, uma descaracterização do regime parlamentar italiano. A governabilidade buscada pressupõe essa mudança, ou a seu aviso existiriam outros caminhos?

A essência do regime parlamentar continuará intocável, a Câmara dos Deputados será, sempre, a garantia de uma representação legítima. Logicamente, a prática deverá apontar os necessários ajustes para consolidar o que prega a carta constitucional.

Outras considerações sobre o tema que queira fazer?

Todas as nações do planeta atravessam um momento de reflexão, as velhas ideologias, já superadas e que não mais correspondem às necessidade, estão sendo severamente questionadas, cabe à nossa geração assumir com coragem a tarefa e a circunstância que o destino nos colocou, pavimentar o percurso que possa nos conduzir a patamares cada vez mais dignos de desenvolvimento com justiça e generosidade para todos.