“Entendo que, a partir do vencimento do mandato para o qual todos os conselheiros foram eleitos, não existe mais legitimidade na representação”, diz o renunciante.

CURITIBA – PR – O conselheiro do Comites – Comitê dos Italianos no Exterior para os Estados do Paraná e Santa Catarina, Ivanor Minatti, formalizou, no início da madrugada de hoje (26.05.2010), através de e-mail, sua renúncia à função de Conselheiro perante o presidente da Entidade, Gianluca Cantoni. O ato, já anunciado verbalmente durante a última assembléia do órgão, no último sábado, foi tomado em protesto contra o segundo adiamento das eleições para a renovação dos Comites que deveriam ter ocorrido já em 2009. “Entendo que a partir do vencimento do mandato para o qual todos os conselheiros foram eleitos, não existe mais legitimidade na representação”, escreveu Minati em sua carta-renúncia que traz a data de 22 de maio. O adiamento, decidido pelo Conselho de Ministros do Governo Italiano, através de decreto ora em debate no Parlamento, segundo o renunciante, fere “um dos princípios básicos da democracia”.
Embora o tema do adiamento das eleições, que ficaram para 2012, continue ordem do dia dos debates no seio da comunidade italiana esparramada pelo mundo, esta foi a primeira renúncia ocorrida até o momento. Em pronunciamento realizado segunda-feira no Parlamento Italiano, o deputado Fabio Porta, que é do Brasil e foi eleito pela Circunscrição Exterior como um dos representantes da América do Sul, disse que “não se pode suspender por decreto a democracia”. O sistema de representação dos italianos no exterior – observou o parlamentar, é o elo fundamental que liga democraticamente esses territórios e suas comunidades aos parlamentares eleitos no exterior.
Os atuais conselheiros  – são mais de cem os Comites em todo o mundo – foram eleitos em 2004 para um mandato de cinco anos, depois de uma prorrogação de mandatos bastante semelhante ao atual, quando também se decidiu aguardar mudanças na legislação. A pretendida atual mudança na legislação que regula os Comites decorre mais do vazio em que caiu o CGIE – Conselho Geral dos Italianos no Exterior, depois da introdução do voto por correspondência para os italianos no exterior, que podem eleger seis senadores e 12 deputados ao Parlamento.  “Não existia nenhuma urgência para uma nova reforma” dos Comites, observa Porta, lembrando que o governo italiano tem cortado recursos à difusão da cultura e da língua italiana em todo o mundo. “Não podemos humilhá-los (os italianos no mundo) e sacrificá-los também no exercício de seu direito de participação democrática”.
Desde que o Conselho de Ministros tomou a decisão de adiar as eleições do Comites, vendo nisso uma oportunidade de economizar recursos (dentro do plano geral de contenção de gastos oficiais), mas acatando o argumento da “reforma da lei” inicialmente plantada pelos próprios conselheiros do CGIE em busca de uma alternativa para manter a existência do órgão, iniciou-se um debate acirrado entre as diversas tendências que dominam Comites e CGIE. Muitos conselheiros se pronunciaram prontamente a favor da prorrogação, enquanto outros mal dissimulavam o constrangimento da prorrogação de um mandato que, pelo menos nos Comites, advém do voto direto e secreto.  Consciente de que a prorrogação enfraquece a representação, a direção do CGIE ensaiou alguma reação e convocou, inclusive, as chamadas reuniões de área na esperança de aglutinar protestos de Associações, Patronatos, Sindicatos e cidadãos italianos individualmente. A reunião da área da América latina está marcada para o início de junho, em Buenos Aires. Mas depois que o Parlamento aprovou a iniciativa advinda do Executivo, transformando o Decreto em Lei, as reuniões convocadas praticamente perderam o sentido.
REAÇÕES – Foi nesse clima que Ivanor Minatti, que é presidente do Círculo Treentino de Curitiba, tomou a decisão de renunciar à função de Conselheiro do Comites PR/SC. Ele está em viagem à Itália para participar das homenagens por ocasião do primeiro aniversário da tragédia que vitimou o diretor da “Trentini nel Mondo”, Rino Zandonai, juntamente com o deputado trentino  Giovanni Battista Lenzi e o prefeito de Canal San Bovo,  Luigi Zortea, no vôo AF 447 da Air France, em pleno Oceano Atlântico, no final de maio do ano passado. Antes de embarcar, na tarde de hoje, Minatti conversou com o editor de Insieme para dar conhecimento de sua renúncia “em caráter irrevogável”. A carta de Ivanor tem o seguinte teor, na íntegra:
“Curitiba, 22 de Maio de 2010
Ao Presidente e Conselheiros do Comites PR/SC                                                                                                                                                                                           
Tendo o Conselho de Ministros aprovado decreto lei, por duas vezes prorrogando o mandato dos conselheiros dos Comites (Comitato degli italiani all’estero) e CGIE (Consiglio generale degli italiani all’estero), mandato este conquistado nas urnas pelo voto direto, Rrenuncio em caráter irrevogável da função de conselheiro deste comites.
Entendo que a partir do vencimento do mandato, para o qual todos os conselheiros foram eleitos, não existe mais legitimidade na representação, ferindo assim um dos princípios mais básicos da democracia
Aproveito a oportunidade para agradecer o convívio e receptividade que tive deste colegiado durante o período em que estivemos defendendo os interesses de nossa comunidade.”
Ainda, segundo Ivanor Minatti, a reação que seu ato gerou perante algumas lideranças da comunidade ítalo-brasileira foi imediata. Quase todos pediram que ele reconsidere a decisão. Mas existem reações, como a da presidente do Comites de Belo Horizonte, Silvia Alciate, que reafirma já ter manifestado seu desejo de se demitir do cargo “por motivos parecidos”. “Estou legitimamente me sentido “usada” pelo governo”, diz Alciate. Institucionalmente, a única reação contrária à prorrogação das eleição em meio aos Comites vem da Argentina. Na reunião de sábado do Comites PR/SC, o conselheiro do CGIE Walter Petruzziello, ao fazer um detalhado relato das últimas reuniões do Conselho Geral dos Italianos no Exterior (veja artigo de sua autoria, relatando sua posição diante do caso), afirmou que mesmo os conselheiros que formalmente se dizem contra a prorrogação das eleições, nas conversas informais admitem que apoiam o “esticamento”  dos mandatos por mais três anos.
Uma realidade, entretanto, ninguém consegue esconder: Desde que existem CGIE, Comites e deputados e senadores eleitos pelos italianos residentes no exterior, nenhuma lei em benefício deles – das múltiplas apresentadas – passou até o presente momento. Esta é uma realidade apregoada, sempre que pode, pelo deputado Ricardo Merlo, da Argentina. Ele esquece, entretanto, que pelo menos uma sugestão, pedido ou proposta teve sucesso: a “task force”, com gente e recursos orçamentários para dar fim às chamadas “filas da cidadania”. O mutirão, que devia beneficiar Brasil, Argentina, Uruguai e Venezuela, empacou no meio do caminho, por falta de recursos, prejudicando especialmente o Brasil, onde vive a maior comunidade itálica do mundo.

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