“Somos um movimento cultural, social e político que nasce no seio da comunidade ítalo-brasileira e que tem o objetivo de representá-la em toda sua variedade, sem privilegiar nenhuma característica específica, seja ela regional, partidária ou identitária.” Somos seres vivos, com mais ou menos anseios, angústias ante as injustiças do mundo, desejo de manifestar opiniões e realizar ações a favor da comunidade, com momentos de esplendor, quando exercemos toda a nossa força e criatividade, mas que também podemos entrar em desgaste, perdendo a capacidade de orientar e o declínio pode até nos trazer o perigoso título de enganadores/impostores. Estas contingências não regem apenas os movimentos sociais e políticos, mas a nossa vida, do nascimento, amadurecimento e morte de nossas próprias existências, sejam elas de imperceptíveis seres contemplativos e críticos dos demais que se propõem a manifestar, mas, principalmente, realizar algo e atingir determinados resultados a favor de si mesmos e da coletividade. São decisões, com seus custos, riscos e resultados, naturalmente. E essa dinâmica de escolhas não tem uma explicação teórica, apenas nasce ou não nos indivíduos que buscam o fazer, muitas vezes para satisfazer seu próprio ego ou – absolutamente desejável – para o bem comum, que é sempre o que se espera.

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Dizemos não privilegiar nenhuma matriz ideológica, nenhuma origem regional e nenhum nicho identitário. A palavra de ordem é integrar a comunidade ítalo-brasileira, que perde muito com o seu atual estado de inércia e desagregação. Aliás, como dito e repetido na nossa convenção de fundação ontem, em São Paulo-SP, a inércia já temos e ela é a única certeza de que não haverá críticas, nenhum risco aparente porque “o nada” não gera qualquer avaliação, apenas alimenta sentimentos egóicos.

A dicotomia bastante lembrada nas nossas intervenções, que diz respeito aos partidários das correntes de esquerda e direita, historicamente já foi aquela entre monarquistas e republicanos ou mesmo entre carlistas e liberais. Para simplificar ainda mais, basta lembrar que o termo nasce daquele momento crucial em que os representantes do povo se sentaram à esquerda ou à direita do rei da França, na Assembleia dos Estados Gerais de 1789, sem imaginar – ao menos em toda a sua amplitude – que esta ação provocaria uma discussão secular entre aqueles que se dizem conservadores direita do rei) e os progressistas (à esquerda do rei). Todavia, a confusão ideológica persiste porque não é raro a direita usar atitudes progressistas (liberdade, inovação e desregulamentação) e a esquerda defender ideias conservadoras (coesão de lutas e manutenção das conquistas do bem-estar social).

Aspecto da reunião de fundação da Associação Nacional “Italianità in Movimento”, dia 05/02/2022, em São Paulo (Foto Desiderio Peron / Insieme)

Em tempos passados as mudanças político-sociais eram simplesmente realizadas com rompimentos trágicos e definitivos, verdadeira revolução, a justificar a morte de um sistema – e muitos inocentes – com a implantação de outro, proposto e financiado pelas elites do pensamento dominante, com o necessário apoio político e econômico de setores fundamentais da sociedade, que nunca faltam nestes momentos, para manter ou obter privilégios. Os resultados e custos todos nós conhecemos e a modernidade prefere apostar nas reformas, “o que significa aceitar um curso coerente e reconhecível de eventos contra os quais se discutiam apenas as velocidades” (in “Politica para perplexos, o fim das certezas”, Daniel Innerarity, Editora Vozes, 2021, página 126).

Deixamos de lado essa ideia de movimentos definitivos e irredutíveis para uma linha de pensamento e ações que integrem e deem sentido à coexistência de processos e tensões que se verificam em toda a parte, buscando, inclusive, “não realizar a revolução ou substituí-la por reformas parciais, sempre na mesma direção (obra citada acima, página 127), mas buscar a coexistência de tipos complementares heterogêneos de seres humanos, culturas, tempos e instituições”2. Os problemas sempre existirão e as soluções políticas não serão aquelas do uso de uma fórmula pronta de que cabe ao estado ou ao mercado a solução. “O futuro pertencerá a quem conceber adequadamente o misto, o complexo e a articulação do heterogêneo”.(Obra citada acima, página 128) 

Quem assistiu às intervenções dos coordenadores Luis Molossi e Daniel Taddone na sessão de fundação da Associação Italianità in Movimento, de 05/02/2022, das 14h30 às 16h00, entenderá que é exatamente este campo político-social da Comunidade Italiana da nossa Circunscrição que propomos nossa atuação, como um ente “catalisador para a recuperação da italianidade dos ítalo- brasileiros, atuando fortemente para obter recursos para o ensino da língua italiana, para a disseminação da cultura italiana, seja pela recuperação da história da nossa imigração, seja pela difusão da cultura italiana da atualidade, a potencialização das representações consulares italianas no Brasil e a transformação da nossa rede consular em um espaço de acolhimento e não de medo, arbitrariedade e maus tratos”, tudo devidamente presente nos 10 pontos do programa de atuação que também foi sintetizado nas falas.

Outro ponto de grande relevância em nossas reuniões de 2 dias intensos, reveladores e absolutamente proveitosos, foi a questão da expressão trazida ao debate como microclima que envolve assuntos regionais – mais conhecida por nós ítalo-brasileiros como campanilismo – ou seja, as dinâmicas locais que envolvem divisões no próprio território de atuação dos nossos representantes, eleitos, indicados ou nomeados, humores, comportamentos mais ou menos radicais, conciliadores e até o buonismo exagerado, tensões pela ocupação dos espaços, vencedores e vencidos em eleições do Sistema Itália e todas as consequências deste jogo de poder, atitudes altruístas ou egoístas e os riscos de se colocar em cheque o próprio destino das Comunidades a quem são destinadas estas ações sociais e políticas.

Da minha parte, atuando forte e sem descanso pela cidadania plena e reconhecimento de todos os direitos – sem esquecer dos deveres que lhes são igualmente atribuídos também lembrados nas reuniões e debates – continuarei a construir pontes, nunca muros.

E que esta associação de indivíduos que já conheço há décadas, novas lideranças que conheci nestes 2 dias e que ainda encontrarei na nossa caminhada, de alma italiana e que “animam” o nascimento deste movimento continuem a me trazer orgulho e entusiasmo.

  • Luis Molossi é Coordenador Nacional de “Italianità in Movimento”