CURITIBA – PR – “Democracia interrompida: Comites e CGIE renovados (talvez) até 2012”. Com este título, o jornal on-line “L’Italiano”, editado em Roma, noticiou em sua edição dessa terça-feira (27.04.2010) a nova prorrogação dos mandatos dos presidentes e conselheiros dos Comites – Comitês dos Italianos no Exterior e do CGIE – Conselho Geral dos Italianos no Exterior. O novo adiamento, já esperado, tem o mesmo argumento do primeiro: rever a legislação referente às duas entidades criadas para representar os italianos no exterior. Os atuais presidentes e conselheiros foram eleitos em março de 2004 para um mandato certo de cinco anos. Em 2009, diante fracassada tentativa de reforma da legislação, um decreto do Conselho de Ministros, atendendo a uma solicitação dos próprios interessados, fixou nova data para as eleições, que deveriam se realizar até o final deste ano. Como a lei não foi alterada, outra decisão do Conselho de Ministros, datada do último 23 de abril, definiu que as eleições devem ser realizadas até o dia 31 de dezembro de 2012. Embora as informações se refiram à data das eleições apenas, e não à prorrogação dos mandatos, estes serão automaticamente prorrogados, à revelia dos eleitores. Se forem “esticados” até o prazo final, o que não é improvável diante do conhecido desinteresse do Parlamento Italiano em relação à matéria, os representantes das comunidades italianas eleitos democraticamente terão completando praticamente dois mandatos desde a sua posse. Alguns setores mais lúcidos da comunidade italiana consideram os sucessivos adiamentos e as conseqüentes prorrogações de mandato o maior desserviço não apenas ao almejado fortalecimento da representação democrática dos italianos no mundo, como um efetivo golpe contra a reputação política dessas entidades que, sabidamente, não gozam do respeito que deveriam ter na área institucional. A revisão da legislação, como se sabe, está emperrada também devido às múltiplas propostas que aportaram no Parlamento, quase todas atendendo a interesses e motivações dos conselheiros interessados que, por sua vez, sequer submeteram a matéria aos últimos interessados, ou seja, a própria comunidade italiana. No caso do CGIE, sabe-se que a luta é pela sua sobrevivência, já que perdeu praticamente todo o objetivo desde que a Constituição Italiana concedeu aos italianos no exterior o direito de eleição direta de deputados e senadores.
Na edição 136 (abril), a Revista Insieme publica matéria que aborda, entre outras questões,  outro fato que permeia o processo de reforma da legislação dos Comites. Na proposta de reforma consta uma que atrela os candidatos às bandeiras dos partidos italianos.  “Dove finiranno i Comites?”, pergunta a matéria de capa da edição que levanta a pergunta se é positivo ou negativo que ideologias partidárias passem a invadir os nossos Comites.
A seguir, publicamos o texto, na íntegra:

IDEOLOGIAS PARTIDÁRIAS ITALIANAS PODEM INVADIR OS NOSSOS COMITES. ISSO É BOM OU É RUIM? – Os Comites – abreviação de Comitati degli Italiani all’Estero – foram inventados (1985, lei n. 205) para serem a caixa de ressonância das aspirações, vontades e reivindicações das comunidades italianas esparramadas pelo mundo. Seus conselheiros são eleitos pelo voto direto e secreto e têm o papel institucional de representação dessas comunidades. Ao contrário do que se ouve com freqüência, seus poderes são amplos, assim como é ilimitada a soberania das comunidades que democraticamente representam em todos os setores – dos políticos aos sociais, culturais, educacionais e, inclusive, aqueles relacionados ao tempo livre dos italianos e seus descendentes. Mas, talvez por falta de criatividade ou mesmo de vontade, até aqui os Comites acumulam um contencioso de queixas. A principal delas é de que, salvo honrosas exceções, têm funcionado mais como apêndices das obrigações consulares do que como alavanca das aspirações comunitárias. Um jogo de cima para baixo, em outras palavras. Por essas e por outras razões, pelo menos os Comites que operam no Brasil (no mundo inteiro são mais de cem: 64 na Europa, 42 nas Américas, 3 no Oriente Médio/Mediterrâneo, 5 na África, e 5 na Ásia), na prática, viram diminuídas suas próprias atribuições – um problema que a regulamentação de 2003 não resolveu, apesar de ter custado a prorrogação de dois anos do mandato de seus dirigentes, que é de 5 anos.
A instituição da Circunscrição Eleitoral do Exterior, com a ainda discutida eleição de representantes diretos nas duas casas do Parlamento, colocou em cheque também as atribuições do CGIE – Conselho Geral dos Italianos no Exterior, e gerou o argumento da necessidade de nova reforma dos Comites, trazendo, na esteira, um novo adiamento dos mandatos que se esgotaram em 2009. Assim, as eleições que deveriam ter acontecido no início do ano passado, ficaram para este ano. E, pelo que se cogita em voz alta, deverão acontecer só ano que vem, enfraquecendo a legitimidade dos eleitos com mandato de tempo certo.
Como será o processo, entretanto, ninguém ainda sabe ao certo. Em Roma, onde se concentram as inúmeras propostas de reforma – bem distante dos representados – tanto o CGIE quanto os Comites poderão renascer com uma cara muito diversa da que estamos acostumados a ver ou imaginaríamos que fosse. O CGIE, que riscava desaparecer por completo por falta de atribuições, poderá voltar com uma função parecida com a de uma grande agência de assessoria parlamentar, acrescida daquela de representação dos Comites em níveis continentais; enquanto os Comites, que reivindicam, além da representação que lhe é inerente, poderes vinculantes em lugar de meros palpites de instrução, podem vir de roupa nova. Essa nova fatiota poderá ter as cores partidárias italianas no lugar da quase indiferença política de hoje, ditada, na maior parte dos casos, pelas associações e círculos. Explicando melhor: para alguém ser candidato a conselheiro de um Comites, teria, antes, que se perfilar diante de um partido político italiano, cuja doutrina está no mínimo, como no caso do Brasil, há cerca de 12 mil quilômetros de distância dos eleitores…
Discute-se, à meia-boca, se isso – a partidarização dos Comites – será, na prática, coisa boa. Ou coisa ruim. Na hora da campanha eleitoral, como já ocorreu por aqui, é possível que as coisas fiquem mais fáceis com alguma ajuda vinda de fora a candidatos de carreira. Mas imaginemos que um determinado partido tome posição, no meio dos debates, sobre uma hipotética mas não improvável nova lei que restrinja a concessão da cidadania por direito de sangue a descendentes de italianos além da terceira geração. Como ficariam os conselheiros dos Comites a tal partido vinculados?
Assumindo a posição partidária, teriam problemas já dentro da própria família, onde não custaria encontrar alguém nas famosas “filas da cidadania”… E este seria apenas um exemplo de uma relação que não raro tem-se manifestado complicada e por vezes conflitante entre os interesses italianos da Península e aqueles interesses dos italianos que habitam fora dela.
Para o presidente do Comites do Recife, Salvador Scalia, “a idéia original não era essa mas, na prática, a politização, melhor dizendo, a partidarização, dos Comites e CGIE aconteceu, principalmente após a introdução do voto no exterior com candidatos do exterior para o Parlamento. A maioria dos candidatos vieram dos Comites/CGIE que se alinharam, cada um a seu gosto e estratégia, com os partidos italianos”. Scalia calcula que, “na prática, não há como evitar esse ‘alinhamento’. Então, concordo que seja introduzido na Lei”. Para Scalia “a qualidade da representação depende da qualidade da participação do conjunto dos cidadãos. Hoje, os partidos políticos representam a ambição, o desejo de poder e o interesse dos seus membros e não o interesse e a solução dos problemas do cidadão. Isso só vai melhorar quando houver uma participação mais consciente e de melhor qualidade por parte da comunidade”. Esperando que a reforma seja realizada ainda este ano “para que tenhamos as eleições para os Comites, conforme o previsto”, Scalia preconiza a participação dos presidentes dos Intercomites como membros do CGIE, que “deve ser um órgão mais enxuto e eficiente”.
 Já o deputado Fabio Porta é “contrário a qualquer forma de partidarização dos Comites”. “Sou contrário também – explica ele – às propostas de estabelecimento de um sistema majoritário (a chapa vencedora com maioria absoluta de conselheiros)”. Ele afirma que os Comites “são órgãos de representação das instâncias de nossas comunidades pelo mundo, e não podem ser comparados ao Parlamento italiano e muito menos comandados por um único grupo ou personagem influente ou dominante”. Pelo contrário, acrescenta Porta, ele deve ajudar e aumentar a participação dos cidadãos e isso “através de um maior envolvimento das associações, dos oriundos e dos jovens”. Ele acha que a reforma deve dar mais poderes aos Comites e algum recurso a mais para que possam bem exercer suas funções, “principalmente as ligações com grandes comunidades, como no Brasil, freqüentemente espalhadas sobre grandes extensões territoriais”. Para Porta, reforçar os Comites é necessário também para ajudar o difícil papel dos poucos parlamentares eleitos no exterior”.
Outro que respondeu às perguntas encaminhadas por Insieme a todos os presidentes de Comites e membros do CGIE (a maioria silenciou), foi o advogado Walter Petruzziello, um dos quatro conselheiros do Brasil no Conselho que, para muitos, deveria simplesmente desaparecer. Petruzziello é contra a partidarização dos Comites “pois, obrigar os representantes de Comites e CGIE a se alinharem com os partidos políticos da Itália, significa ter que seguir as orientações destes partidos e, em conseqüência, muitas vezes não defender o interesse de nossos ‘representados’ mas, sim, o interesse dos partidos”. Portanto, “o alinhamento é prejudicial às comunidades italianas no exterior” e a “independência é a melhor forma de se defender o interesse da comunidade italiana no exterior, desde que sejam modificadas as leis atuais”. Falando sobre o conjunto dos projetos, Petruzziello disse que ainda não viu uma proposta “que possa se considerar definitiva. Estão circulando várias propostas de vários parlamentares e cada um coloca a sua idéia no papel, mas a maioria não contempla as reais necessidades de nossas comunidades no exterior.” O advogado é um pouco cético sobre representação efetiva dos dois órgãos em reforma: “Eu ainda acredito na reforma das leis dos Comites e do CGIE que nos permitam votar o mais breve possível. Espero, porém, que não se vá votar com as leis atuais, pois os mandatos foram prorrogados para que se pudesse elaborar novas leis, e voltar atrás é fazer as comunidades italianas no exterior de bobas. Muitas pessoas, inclusive membros dos Comites e CGIE, insistem em que se façam as eleições mesmo que seja com a lei atual, mas para mim isso é falta de coragem, pois precisamos “obrigar” o parlamento a tomar uma posição definitiva; aceitar eleições com estas leis é dar a eles chances para que nunca mais se preocupem com os órgãos representativos dos italianos no exterior. Falo isso porque estes órgãos nada representam no momento, pois as leis atuais não dão, seja ao CGIE ou ao Comites, nenhuma atribuição que possa ser verdadeiramente expressão da vontade de nossos “oriundis”. Falo mesmo de poder, ter voz ativa, etc… Ou alguém acha diferente e acredita que Comites e CGIE têm algum poder e representam alguma coisa?”
Pensa um pouco diferente o deputado Ricardo Merlo, do Maie – Movimento Associativo Italiani all’Estero. Na rápida visita que fez a Florianópolis, dia 24/03, para um encontro com as lideranças de seu partido no Brasil, onde o tema foi a organização de forças e táticas para as próximas eleições do Comites, comunicou que fora da América do Sul, onde continuará com a sigla atual, a aliança já está feita com a UDC de Pier Ferndinando Casini.

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