O Consulado Geral da Itália em Curitiba continua cancelando agendamentos supostamente realizados no sistema Prenot@mi com a aparente ajuda de robôs, mas, segundo fontes categorizadas, a orientação para isso vem de Roma, mais especificamente do diretor geral para os italianos no exterior da Farnesina, Luigi Maria Vignali. No bojo de algumas medidas tendentes a neutralizar as críticas que o sistema vem recebendo em todo o mundo, ele teria autorizado os consulados a tomarem tais medidas.

O tema chegou a tratado inclusive num dos últimos encontros de Viignali com integrantes do CGIE – Consiglio Generale degli Italiani all’Estero, segundo as mesmas fontes. A medida seria paliativa enquanto a Farnesina estaria estudando outras formas de facilitar os agendamentos consulares, sejam para passaporte, vistos ou, mesmo, reconhecimento de cidadania, que representam o mais alto percentual das críticas realizadas contra os serviços consulares, principalmente na América do Sul.

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Na edição da revista Insieme deste mês, publicamos – sem saber de onde vem a “ordem superior”- matéria sobre mensagem do consulado de Curitiba no Instagram em que a autoridade consular pede a ajuda dos usuários para combater a ação dos “despachantes”. Em italiano, o texto explica que “Diante do aumento exponencial de solicitações de serviços consulares, o Ministério das Relações Exteriores e da Cooperação Internacional introduziu em toda a rede diplomático consular no mundo e, portanto, também no Brasil, o portal Prenot@mi para garantir aos usuários uma gestão legal e centralizada dos agendamentos”.

“A eficiência do sistema centralizado – continua a nota -, já minado pelos abusos cibernéticos dos bem conhecidos despachantes, tornou-se ainda mais vulnerável devido ao gigantesco aumento das demandas e também pelo aumento do número de usuários que se dirigem a empresas de intermediação”.

“Tudo isso desencadeia um círculo vicioso que dificulta o trabalho da rede consular e (torna) impossível o acesso de quem utiliza a plataforma institucional”, explica ainda a nota, para aduzir que “a rede diplomático-consular italiana no Brasil, incluindo o Consulado Geral de Curitiba, há muito está empenhada em combater o fenômeno cujas proporções estão tornando a situação incontrolável”.

Entretanto – prossegue o texto – “O sucesso depende não só do empenho das instituições italianas na luta contra a exploração, mas também da valiosa colaboração dos usuários, que convidamos a não recorrer a organismos não autorizados”.

E conclui: “Para bloquear este mecanismo e evitar que novos sistemas de exploração ilegítima dos direitos dos cidadãos e dos titulares de direitos sejam desencadeados, pedimos o apoio e a confiança no compromisso do Consulado que, com todas as forças à sua disposição, presta múltiplos serviços consulares e continua a acolher, com atenção e cuidado, as reclamações legítimas formuladas de forma não ofensiva ou insinuante”.

Algumas pessoas foram surpreendidas nos últimos dias com o cancelamento do agendamento feito. No caso de passaporte, a “descoberta” da assessoria robótica se dá, geralmente, diante de apresentação de e-mail diferente do que já consta no cadastro dos usuários. Ou do uso de um IP (Internet Protocol) cuja localização geográfica esteja estabelecida fora da circunscrição consular.

OUTRA LEITURA – Conforme publicou a revista Insieme, o texto do consulado, que aparentemente solicita a colaboração dos usuários para que não recorram às empresas de agendamento (dotadas de recursos informáticos extraordinários e que “abocanham” rapidamente todas as vagas disponíveis, quando geralmente sequer se sabe quantas são e em que horário funcionam), pode ser lido de outra maneira. Numa conclusão lógica e bastante óbvia, pode-se entender que o consulado esteja querendo dizer que a culpa pela impossibilidade do agendamento por parte dos “vis mortais”, desprovidos de recursos informáticos adequados ou de qualquer recurso informático, é dos próprios usuários. E que se eles pararem de recorrer aos “despachantes”, tudo estaria resolvido.

Será? Será que se, num passe de mágica, ninguém mais pagasse esses atravessadores robotizados – como pede o consulado de Curitiba –  os usuários seriam todos atendidos dentro de prazos razoáveis? Ou pelo menos, no caso dos passaportes, dentro daqueles prazos estabelecidos pela lei? Tendo em consideração os motivos pelos quais tais serviços surgiram, a resposta pode também ser bastante lógica e óbvia, escancarando a tentativa da autoridade consular de transferir o problema para terceiros – sejam os que ela define como “atravessadores”, sejam os próprios usuários (a essas alturas, se admitida a segunda leitura, quase otários).

A realidade praticada hoje, em função das regras naturais do mercado, fez subir o valor de um agendamento (para passaporte ou para cidadania) de algo em torno de 600 reais, cobrados há alguns anos, para algo em torno de 1.400 a 1.600 reais – bem mais que o dobro da taxa oficial de 116 euros (cerca de 600 reais) para um passaporte italiano. Há quem peça até mais que isso e o valor é cobrado por requerente. Uma família com cinco pessoas, admitindo algum desconto, pagaria algo seguramente acima dos cinco mil reais apenas para ser agendada. Se não fosse a dificuldade criada, quem em sã consciência iria recorrer aos “atravessadores”?

No esboço da campanha encetada pelo consulado de Curitiba, entretanto, pode estar em evidência uma outra questão: o rompimento de uma situação que, aparentemente, contraria um comportamento de, vamos dizer, um certo comodismo dos consulados. Até aqui dizia-se que a rede diplomático-consular não tinha interesse de dar combate aos “despachantes” porque eles serviriam, e muito, para “organizar” o próprio serviço de atendimento consular. Em outras palavras, o trabalho às vezes árduo e repetitivo de informação, orientação e filtros na organização de papéis e documentos acaba sendo uma grande ajuda em tempos de pouca paciência diante de milhões de cidadãos enfileirados e a reclamar “direitos”. Resta saber, portanto, se o consulado de Curitiba – hoje o segundo em importância no Brasil – estaria em condições de assumir esse trabalho de “garimpo” que é realizado pelos tais e detestados  “despachantes”.

Se assim for, o Prenot@mi imaginado pela Farnesina (mas, até onde se sabe, executado por empresa terceirizada que não estaria disposta a corrigir alguns erros ou efetuar algumas mudanças necessárias, como a inclusão de um simples ‘captcha’ para neutralizar a ação de robôs, sem cobrar caro pelo trabalho) terá que se apresentar em condições de dar respostas à imensa demanda por cidadanias e passaportes. E é aí que está o ‘bus illis’: o verdadeiro problema está, mesmo, no Prenot@mi?”

O tema foi discutido numa “4 Chiacchiere Insieme” recente (01/08) com a participação dos advogados Elton Stolf, representando o Comites para os Estados do Paraná e Santa Catarina, e Cristiano Girardello, além da empresária da cidadania Camila Malucelli e o conselheiro do Brasil no CGIE – ‘Consiglio Generale degli Italiani all’Estero’, Daniel Taiddone.