A reforma constitucional pretendida pelo atual governo da Itália alterará substancialmente a natureza do Senado e, nessa transformação, eliminará a representação da grande comunidade italiana que reside fora da bota, transformando os italianos no mundo em cidadãos de série C. Essa é a principal razão alinhavada pela coordenação nacional da Filef – “Federazione Italiana Lavoratori Emigrati”, para encaminhar o voto pelo Não às reformas. Traduzimos os argumentos, como se vê abaixo:

São muitas os motivos para o apoio ao NÃO.

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No que diz respeito aos italianos no exterior, a primeira coisa a ser analisada é que, com esta reforma, a representação parlamentar dos cerca de 5 milhões de italianos no mundo será reduzida drasticamente em 33%, pondo fim às seis cadeiras previstas no Senado. Como argumenta o constitucionalista Felice Besostri, é paradoxal que no novo Senado – não eletivo – “”foram dados 2 Senadores a Val d’Aosta com 126.806 habitantes ou 4 à Região Trentino Alto Ádige com 1.029.475 habitantes sobre 100 (membros do novo Senado), que tinham, respectivamente, 1 e 7 sobre 315 (membros do atual Senado), isto é, duplicam seu peso percentual e foram retirados os 6 senadores da circunscrição do exterior representativos de milhões e milhões de cidadãos italianos residentes fora da Itália. Na lógica errada dos falsos reformistas poderia ser mantida uma quota de senadores para o exterior eleitos pelos Comites ou outras novas formas de representação. A combinação de lei eleitoral e revisão constitucional torna os italianos no exterior de série C.”

Mas a coisa é ainda mais grave considerando que os cidadãos italianos no exterior crescem ao ritmo de cerca de 150.000 por ano (segundo o Aire), mas muito mais, provavelmente, 250/300.000 ao ano (uma vez que, como sabemos, muitos novos emigrados não comunicam a mudança enquanto não obtiveram um emprego estável, muitas vezes por longos anos).

Acrescentamos também que a nova lei eleitoral denominada “Italicum” não prevê a participação dos italianos no exterior no segundo turno, no caso de não ser atingido, no primeiro turno, o quorum que permita o prêmio de maioria, tornando-se fora do procersso de atribuição de uma consistente quota de cadeiras.

Tudo isto mostra a grave desatenção em relação à emigração italiana e aos italianos no exterior que, segundo a nossa Constituição, são titulares dos mesmos direitos civis de que gozam os residentes na Itália.

Mas a reforma é assim tão mal estruturada que não atinge nenhum dos objetivos que, segundo o Governo, a teriam motivado; vejamos os principais:

Elimina o bicameralismo?

NÃO, torna-o mais confuso e cria conflitos de competência entre Estado e Regiões, entre a Câmara e o novo Senado. Muitos sustentam, com razão, que se este fosse o objetivo, teria sido mais simples atingílo com a simples extinção do Senado.

Simplifica as coisas?

NÃO, multiplica em até dez vezes os procedimentos legislativos e aumenta a confusão. Muitos constitucionalistas sustentam que a simplificação poderia ser obtida com a simples modificação dos regulamentos parlamentares.

Diminui os custos da política?

NÃO, os custos do Senado serão reduzidos apenas em um quinto e se o problema são os custos por qual motivo não reduzir pela metade os deputados da Câmara? Ou, ainda, como outros sustentam, por que não reduzir, simplesmente, o atual ganho de todos os parlamentares e senadores? Uma redução de 10% de todos os salários teria produzido uma economia maior que a redução de 215 senadores.

Aumenta a participação direta dos cidadãos?

NÃO, triplica de 50.000 a 150.000 o número de assinaturas para projetos de lei a partir da iniciativa popular. Além disso, o novo Senado, reduzido a 100 integrantes, não será eleito, mas nomeado. A ligação da refirla com a nova lei eleitoral denominada “Italicum” determina uma grave redução da representação, uma vez que uma minoria (mesmo de 20% dos votantes, nem ao menos dos eleitores) pode conquistar a maioria absoluta da Câmara, colocando em minoria (de cadeiras) os 80% dos votantes. A “desproporção, na verdade, a inversão do princípio da representação de tendência proporcional tornar-se-ia, assim, dramaticamente inquietante.

É uma reforma clara e fácil de entender?

NÃO, está escrita de forma que não pode ser compreendida. Sobre isso remetemos à dificil leitura do texto de reforma; ou, se se pretende entender mais rapidamente a questão, à verificação desse vídeo breve produzido pela ANPI: Como foi reescrito o Art. 70

É uma reforma inovadora?

NÃO, conserva e reforça o poder central em prejuízo das autonomias, destituídas de meios financeiros. Também porque a remuneração dos senadores restantes ficará a cargo das regiões e das cidades metropolitanas. Que, ao mesmo tempo encontram-se com menos poderes porque muitas decisões sobre assuntos regionais e locais voltarão para as mãos do Governo. Nesse sentido, a reforma extinge grande parte dos elementos de federalização introduzidas pelas mudanças anteriores.

A que serve pois, essa reforma?

Serve essencialmente a tornar o poder executivo o menos vinculado possível às decisões do Parlamento, introduzindo de forma subreptícia uma espécie de “premierato” que, entretanto, contrariamente a muitos outros exemplos de república presidencialista, não dispõe dos necessários equilíbrios internos entre os diversos poderes do Estado. (Enquanto, ao mesmo tempo, o “Italicum” elegerá um Parlamento o menos representativo possível da vontade popular).

Uma vez adquirida a maioria absoluta na Câmara (através das normas previstas pelo “Italicum”, que de fato diz respeito apenas à eleição da Câmara, enquanto o novo Senado não vota a “Confiança” ao governo), um premier eleito, talvez no segundo turno, partindo também de um percentual relativamente irrisório de consensos (coloquemos 20%), pode ficar diante de uma maioria parlamentar absoluta com a qual, a essas alturas, pode determinar a eleição do Presidente da República, a eleição dos membros da Corte Constitucional, enfim, dos outros órgãos de garantia constitucional. A República permaneceria parlamenter apenas formalmente, enquangto na realidade todos os poderes se concentrariam nas mãos do presidente do Conselho. Como se questiona Felice Besostri, mas se este era o objetivo, porque não propor uma modificação da forma de governo e propor uma séria República Presidencialista?

A questão é que colocar em debate uma reforma desse gênero teria implicado uma discussão bem mais ampla e profunda; a proposta de transformação da natureza da República, do Parlamentarismo ao Presidencialismo, teria exigido, necessariamente, contemplar um sistema de pesos e contrapesos entre os vários poderes institucionais, como existem em todas as maiores e mais provadas repúblicas presidencialistas.

Certamente uma reforma desse tipo exigiria, desde o início, uma maioria bem mais ampla daquela simples, com a qual a atual proposta passou no Parlamento, envolvendo as oposições e fazendo os parlamentares discutirem sobre ela. E para embarcar nesse caminho dificilmente teria sido possível a um parlamento – o atual – eleito com uma lei (o “Porcellum”) que foi considerado inconstitucional pela Corte Constitucional.

Escolheu-se, assim, o clássico atalho, cujos limites são amplamente evidentes quer sob o ponto de vista do método quanto do mérito, também sob uma pressão internacional e nacional, não apenas de outros países (veja-se o recente apoio norte-americano e alemão), mas também de institucições privadas (grandes bancos e institutos financeiros, etc.) que viram na reforma uma oportunidade de reforça do assim chamada “governance”, isto é, do poder exercutivo, em detrimento dos processos parlamentares democráticos.

A recente manifestação do Embaixados dos EUA a favor da reforma, segundo o qual, se ela não for aprovada, determinaria uma redução dos investimentos externos em nosso país é, desse ponto de vista, muito emblemática e instrutiva.

É, de qualquer forma, muito estranho que países que são muito rigorosos em relação a suas constituições e ao equilíbrio de seus poderes internos, como os EUA e Alemanha, estejam assim tão dispostos a ajudar o contrário na Itália.

Não existiria também uma questão de “soberania” entre as dobras dessa reforma e do “Italicum”?

Referindo-se ao pronunciamento do embaixador norte-americano Phillips, o presidente Mattarela lembrou justamente que a soberania é – ainda – dos eleitores italianos. Não se pode desejar que eles a exercam da melhor forma possível para hoje e para o amanhã, votando NÃO no referendum de outono.