Enquanto em Roma esgotavam-se as possibilidades de formação de um novo governo italiano estável e duradouro nascido das urnas, na Circunscrição Eleitoral do Exterior já estavam iniciadas as articulações para uma possível nova eleição em breve. É o que se verificava hoje entre ex-candidatos ítalo-brasileiros e argentinos ao mesmo tempo em que o presidente da República italiana, Sergio Mattarella, via fumaça negra em sua última rodada de consultas com as principais forças políticas da Península pós-eleição de 4 de março último.
Ainda desiludidos, alguns candidatos derrotados asseguram não haver disposição (e recursos) para enfrentar outra eleição em julho ou outubro próximo – duas das hipóteses, a outra seria no início do próximo ano -, enquanto outros admitem estar em “rearticulação para uma recandidatura” assim que novas eleições forem convocadas com a dissolução de um Parlamento que sequer iniciou plenamente suas funções.
Diante das posições que permanecem praticamente as mesmas desde a divulgação do resultado das urnas, o presidente Mattarella vinha a público, no final da tarde, para devolver ao Parlamento a responsabilidade de escolha entre duas opções: um governo breve e neutro produzido pelo voto de confiança e eleições imediatas (julho ou outubro) ou, no mais tardar, no início do próximo ano.
Se as eleições forem logo, uma das teses já levantadas na Itália para encurtar caminhos advoga a participação das mesmas listas e coligações da última eleição. No exterior, isso não parece muito plausível para alguns candidatos. “Vediamo” (vejamos), respondeu o hoje senador ítalo-argentino Ricardo Merlo, sem admitir claramente que mudanças seriam operadas, enquanto candidatos de sua chapa, como Walter Petruzziello, de Curitiba, praticamente descartava sua participação no caso de a nova eleição acontecer em julho.
“Se for em outubro, posso pensar com mais calma” dizia ele a Insieme, enquanto seu concorrente de chapa com bem maior número de votos, o também advogado Luis Molossi, disparava: “Três candidatos em Curitiba é que não pode. Quem larga o osso?”. É seguro, entretanto, que as sondagens e articulações no fronte do Maie – ‘Movimento Associativo Italiani all’Estero’ estejam em franco desenvolvimento.
Também na área do PD – Partido Democratico existem sinais evidentes de movimentação. Enquanto o deputado Fausto Longo parece mais inclinado a seguir a política nacional brasileira (já se lançou, inclusive, pre-candidato a deputado federal no Brasil), o ex-candidato Pasquale Matafora é objetivo quando responde que, “com certeza” vai se recandidatar.
“Estou hoje preparando um manifesto politico, um puxão de orelha muito duro nas lideranças do Partido Democratico na Italia que se afastaram dos italianos e dos cidadãos”, disse ele. Insieme tem informações que também o advogado Fabio Vicenzi se rearticula, enquanto o ex-deputado Fabio Porta acha “cedo para falar disso”, mas admite que “tentaria articular com outros grupos para evitar dispersão de votos e fortalecer as listas da Câmara e do Senado”.
Porta, como se sabe, está ainda às voltas com os resultados eleitorais da última eleição, quando, segundo ele, mais de dez mil votos teriam sido fraudados na Argentina em benefício do candidato da Usei – ‘Unione Sudamericana Emigrati Italiani’. Enquanto seu partido está entrando com recurso perante a justiça argentina, ele diz que semana que vem “estamos preparando apresentação da denúncia à Procuradoria da República”, em Roma.
“Sinceramente não creio, tenho cansaço só de pensar”, segredava o ex-candidato a deputado Daniel Taddone, ao ser questionado se vai, outra vez, bater à porta dos eleitores. Posição mais ou menos parecida externava a conselheira do Brasil no CGIE – ‘Consiglio Generale degli’Italiani all’Estero’, Silvia Alciati. “Minha participação nas eleições se revelou desconfortável para todo mundo”, disse ela a Insieme.
Embora a ex-deputada faça silêncio, a movimentação no fronte de Renata Bueno pela sua recandidatura é grande, segundo relatam pessoas próximas a ela, incluindo ex-candidatos como Simone Sehnem que foi sondada também por outras listas em, em função disso, embora admita se recandidatar, ainda não se decidiu ao lado de quem: “Não tenho uma preferencia ainda… pois ainda não se sabe como será a formação das listas”, disse ela. Por fontes indiretas, Insieme foi informada que o ex-candidato ao Senado Fernando Mauro Trezza também tenciona se recandidatar, mas provavelmente sob outra bandeira partidária (na última eleição ele integrou a lista de Bueno). Quem não respondeu a questionamento sobre o tema foi o deputado Luis Roberto Lorenzato, eleito pela coligação de centro-direita.
Não há informações sobre como pensam os ex-candidatos pela coligação LeU – ‘Liberi e Uguali’, Silvia Rizzioli e Walter Fanganiello Maierovitch. Ainda convalescendo de recente intervenção cirúrgica, Fanganiello havia informado estar se desligando da coligação mas, segundo sua assessoria, “o partido não quer que ele saia”.
Enquanto isso, na área do ‘Movimento 5 Stelle’ percebia-se movimentação (e preocupação) maior que a verificada nas eleições recentes. O partido que, sozinho, foi o mais votado na Itália, está agora “vendo de outra forma” os italianos no mundo e pretende organizar-se melhor também na Circunscrição Eleitoral do Exterior. O conselheiro da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria de Santa Catarina, Diego Mezzogiorno, que não esconde sua simpatia pelo M5S, ontem mesmo foi sondado por próceres do partido na Itália para inscrever seu nome na próxima disputa eleitoral no exterior, que conta com 12 cadeiras na Câmara e seis no Senado.
O vídeo contendo o pronunciamento do presidente Mattarella foi por nós reeditado para dele fazer constar o texto em português, traduzido a partir do vídeo. Tem o seguinte teor: “Boa tarde. Durante as últimas semanas realizei, também com a colaboração das presidências das Câmaras, as quais agradeço, uma verificação concreta, atenta e pontual de todas as possíveis soluções num Parlamento marcado, como todos sabem, por três tendências principais, onde nenhuma delas tem maioria.
Uma condição como essa exige, necessariamente, que duas dessas tendências se entendessem para governar.
Não conseguiu dar vida a uma maioria a tentativa feita entre a Centro-Direita e o Movimento Cinque Stelle.
Não teve êxito a proposta do Movimento Cinque Stelle de formar uma maioria apenas com a Lega.
Revelou-se impraticável uma maioria entre o Movimento Cinque Stelle e o Partido Democratico.
Afirmou-se, sempre, por ambas as partes, a impossibilidade de um entendimento entre o Centro-Direita e o Partido Democrático.
Todas essas impossibilidades me foram confirmadas nesta manhã.
Durante os diálogos de hoje, eu perguntei às diferentes forças políticas – principalmente àquelas mais consistentes – se existiam novas possibilidades de entendimento. Se existissem, eu me debruçaria sobre elas. Registrando que não existem.
Como é evidente, não há nenhuma possibilidade de formar um governo apoiado por uma maioria nascida em consequência de um acordo político.
Desde o início das consultas, eu exclui a hipótese de dar vida a um governo político de minoria. Nessa manhã existiu um pedido nesse sentido que, parece, já falhou.
Um governo de minoria conduziria à eleição e me parece que, nessas condições, seja mais respeitoso dentro da lógica democrática que isso seja feito por um governo neutro.
Em todos os casos, o governo presidido por Gentilone – ao qual agradeço pelo trabalho que desenvolveu e continua a desenvolver nesta situação anômala, com as acentuadas limitações de um governo demissionário -, já esgotou suas funções e não pode ser prorrogado mais, enquanto apoiado na legislatura precedente por uma maioria parlamentar que não mais existe.
Sejam quais forem as decisões dos partidos é, de qualquer forma, imperioso dar vida a um novo governo. Não se pode esperar mais.
Continuo a desejar, naturalmente, um governo com plenas funções, que possa administrar o nosso País. Sem os limites operacionais de um governo demissionário, que coloque o Parlamento em condições plenas de desenvolver suas atividades. Que tenha todos os requisitos para representar a Itália na iminente e importante mudança na direção da União Europeia onde, em junho, serão tomadas decisões sobre os imigrantes, o orçamento dos próximos sete anos, a moeda comum.
Dos partidos, até poucos dias atrás, por diversas vezes foi pedido mais tempo para se encontrar um entendimento. Pode ser útil que dediquem mais tempo para tentar aprofundar o confronto entre eles e, se possível, para amadurecer um entendimento político para formar uma maioria de governo. Mas enquanto não se chegar a um acordo, permitam, através do voto de confiança, que nasça um governo neutro, de serviço, um governo neutro em relação às forças políticas, onde se formasse, nos próximos meses, uma maioria parlamentar. Esse governo se demitiria imediatamente para deixar o campo livre para um governo político. E se no Parlamento os partidos não chegassem a um entendimento, esse governo neutro deveria terminar no final de dezembro, após aprovar o orçamento, para ir, logo em seguida, a novas eleições.
Um governo de garantia. Exatamente por isso que seus integrantes teriam o compromisso de não se candidatarem nas próximas eleições.
A hipótese alternativa é aquela de convocar as novas eleições imediatamente, assim que possível, administrada por novo governo. Não há tempo para o voto até junho. Seria possível realizar eleição em pleno verão, mas até aqui sempre se evitou fazer isso, porque o exercício do voto pelos eleitores ficaria mais difícil. Poder-se-ia fixá-la, então, para o início do outono.
Em relação a essa última hipótese, exponho algumas preocupações: que não haja tempo, após o voto, o tempo para elaborar e aprovar o orçamento e o balanço do Estado para o próximo ano. Com o consequente e inevitável aumento do Iva e os efeitos recessivos que o aumento dessa taxa provocaria. Deve-se considerar, também, o risco posterior de expor nossa situação econômica a manobras e ofensivas da especulação financeira no mercado internacional.
Além disso, o temor que a lei eleitoral, sem mudanças, produza no Parlamento uma situação semelhante à atual, com três tendências sem que algum deles tenha a necessária maioria. Tendências essas provavelmente não disponíveis à colaboração, frutos de uma campanha eleitoral áspera e polêmica.
É preciso levar também na devida conta os tempos mínimos para assegurar a possibilidade de participação na competição eleitoral.
Espero que das diversas forças políticas venham respostas positivas no sentido do exercício da responsabilidade, no interesse da Itália, tutelando, dessa forma, o voto manifestado pelos cidadãos em 4 de março.
Na hipótese de isso não acontecer, o novo governo, politicamente neutro como disse, ficaria no cargo para as eleições a serem realizadas, ou em pleno verão, ou no outono, como disse antes. Seria a primeira vez, na história da República, que uma legislatura é encerrada sem ao menos ter iniciado. A primeira vez que o voto popular não é usado e não produz nenhum efeito.
Que os partidos escolham livremente e no lugar apropriado, o Parlamento, entre essas soluções alternativas: conferir plenas funções a um governo enquanto entre eles não se chegue a um entendimento para uma maioria política e, não além do fim de ano; ou, então, novas eleições imediatamente, no mês de julho ou no outono. Obrigado, bom trabalho”.