Uma das esculturas mais emblemáticas da grande galeria a céu aberto espelhada por ruas, praças e avenidas de São Paulo tem a marca de um italiano nascido em 1898 na cidade de Ancona (Região Marche) e falecido em São Paulo (1974). Trata-se Mausoléu do Soldado Constitucionalista (região do Parque Ibirapuera), obra de Galileo Ugo Emendabili.
O artista – O jovem Emendabili aprendeu e apaixonou-se pela arte do entalhe em madeira numa oficina de propriedade de seu pai, Ludovico. Em sua cidade natal, trabalhou no ateliê do surdo-mudo Clementi, um exímio ebanista. Em 1915 matriculou-se no curso especial de escultura da Academia Real de Belas Artes de Urbino (Italia). Foi aluno do escultor Domenico Jollo e estudou desenho com Ludovico Spagnolini. Frequentou o ateliê do escultor Arturo Dazzi e entrou em contato com a obra dos escultores Ivan Mestrovic, Adolf Wildt e Arturo Martini, entre outros.
Em 1921, executou o monumento tumular do republicano Giuseppe Meloni. Autor de diversas obras, algumas com motivos republicanos, Emendabili tornou-se célebre, mas começou a enfrentar dificuldades em concursos públicos de arte, visto que a Itália era uma monarquia à época.
Querendo continuar a exercer livremente seu trabalho, Emendabili decidiu então deixar a Itália. Já casado com sua patrícia Malvina Manfrini, partiu dia 16 de junho de 1923 com um bilhete de terceira classe, de Gênova, num navio cujo destino final era Buenos Aires. Emendabili desembarcou em Santos no dia 3 de julho, estabelecendo-se na cidade de São Paulo, onde trabalhou como entalhador no Liceu de Artes e Ofícios. Contando com o auxílio da numerosíssima coletividade italiana – tornou-se rapidamente num dos artistas mais conhecidos, tendo vencido diversos concursos.
Em 1925, ganha o primeiro prêmio no Concurso Internacional para o Monumento a Pereira Barreto, inaugurado em 1928, na Praça Marechal Deodoro. No ano seguinte, vence o concurso para o Monumento a Ramos de Azevedo, inaugurado em 1934, e que atualmente encontra-se na Cidade Universitária. Nesse mesmo ano, ganha o primeiro e o segundo prêmio no concurso para o Monumento aos Heróis Constitucionalistas de 1932.
A partir de 1933, trabalha com a colaboração de Fulvio Pennacchi, que elabora desenhos para alguns de seus projetos. Diversas de suas obras podem ser apreciadas em mausoléus dos Cemitérios da Consolação e do Araçá ou na Pinacoteca do Estado de São Paulo. Inicia, a partir de 1969, trabalhos em desenho e pintura. Em 1982 a Rádio Televisão Italiana realiza o vídeo “Ancona – San Paolo solo andata” (Ancona ” São Paulo somente ida), dando destaque ao artista. Em 1997 a Pinacoteca do Estado de São Paulo organiza a exposição Monumento a Ramos de Azevedo: do concurso ao exílio, na qual é publicado um livro organizado pela historiadora e crítica de arte Annateresa Fabris.
O Monumento-Mausoléu ao Soldado Constitucionalista de 1932 (São Paulo – região do Parque Ibirapuera) é a seu maior legado em terras brasileiras.
Obra – A paisagem urbana da cidade de São Paulo é repleta de ícones. Um dos célebres tem a assinatura de Galileo Emendabili: o Monumento-Mausoléu ao Soldado Constitucionalista de 1932, com um obelisco de 72 metros, revestido de mármore travertino. No subsolo, uma cripta em forma de cruz grega abriga uma capela e os despojos dos ex-combatentes. Popularmente conhecido como “Obelisco do Ibirapuera”, homenageia a Revolução Constitucionalista de 1932, seus heróis anônimos, “mártires”, a causa constitucionalista, as personalidades que mais se destacaram, como o poeta Guilherme de Almeida, e o “tribuno” Ibrahim Nobre, bem como o dia em que foi deflagrada a revolta armada contra o governo de Getúlio Vargas – “9 de julho”.
A simbologia do 9 de julho foi explorada pelo escultor ao projetar um obelisco que, da base ao topo, tem 72 metros de altura (7+2=9); da cripta ao topo tem 81 metros (8+1=9), sendo que 81 também é o quadrado de 9; pela soma aritmética de 72 e 81, também se chega ao número 9 (7+2+8+1=18 (1+8=9)).
Cada face do obelisco volta-se para um dos quatro pontos cardeais. Em cada uma delas, encontram-se quatro figuras em alto-relevo, com 5,75 metros de altura. Os dezesseis relevos ornamentam o terço inferior do obelisco e aludem à luta militar da Revolução de 1932 e aos feitos dos bandeirantes.
Entre os relevos, estão inscritos versos de Guilherme de Almeida: “Aos épicos de julho de 32 que, fiéis cumpridores de sagrada promessa feita a seus maiores os que houveram as terras e as gentes por sua força e fé na lei puseram sua força e em São Paulo, sua fé”. Na base do obelisco, duas portas de bronze com cerca de 3,5m de altura por 2m de largura, instaladas nas faces norte e sul, denominam-se Porta da Vida e Porta da Glória, respectivamente.
Com cenas em alto-relevo, a primeira exalta a capacidade de trabalho do povo bandeirante, enquanto a outra retrata a partida dos voluntários para as linhas de frente e o sacrifício dos jovens. Na entrada da cripta, três arcos lembram as arcadas da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, de onde saíram grande parte dos constitucionalistas. Acima dos arcos, encontra-se a inscrição: “Viveram pouco para morrer bem morreram jovens para viver sempre”.
As primeiras providências para a construção de um monumento ao soldado constitucionalista de 1932 foram tomadas em 1934, com a criação de uma Comissão Pró-Monumento por personalidades de destaque da sociedade paulistana. Um concurso público para a escolha do projeto foi realizado em 1937. O edital exigia que a obra fosse eminentemente arquitetônica e não apenas escultórica, devendo destinar espaço para acolher as urnas funerárias dos chamados “heróis constitucionalistas”.
Para a seleção final, classificaram-se Mário Ribeiro Pinto e as duplas Galileo Emendabili e Mário Eugênio Pucci, Yolando Mallozzi e Arnaldo Maria Lello. Os projetos foram expostos no foyer do Teatro Municipal de São Paulo, atraindo grande público. Da comissão julgadora faziam parte Mário de Andrade, Júlio César Lacreta, Amador Cintra do Prado, Dácio A. de Moraes e Victor Brecheret. Por decisão unânime, o trabalho de Galileo Emendabili foi selecionado.
Pucci era engenheiro e ficou responsável pela parte técnica da construção. Apesar dos esforços na arrecadação de fundos para a construção, o projeto não saiu do papel durante todo o período da ditadura Vargas, contra quem se fizera a “Revolução”.
Entre as muitas dificuldades, as verbas disponíveis não cobririam os custos com mão-de-obra e materiais. O lançamento da pedra fundamental ocorreu no dia 9 de julho de 1949. Tanto o Governo do Estado quanto a Prefeitura destinaram recursos para a construção, a cargo da “Fundação Monumento e Mausoléu ao Soldado Paulista de 32”. O Decreto Municipal nº 1.078 de 6 de julho de 1949, determinava que o “Monumento aos Mortos de 32” deveria ser erigido “na parte central da praça circular localizada no prolongamento da avenida Brasil, a 1.100,00 metros, aproximadamente, da avenida Brigadeiro Luís Antônio.”
As obras começaram em 1950 e, cinco anos depois, o monumento foi inaugurado parcialmente. A partir de então, todos os anos, durante as cerimônias do “9 de julho”, os restos mortais de inúmeros ex-combatentes passaram a ser transladados para a cripta.
À Sociedade Veteranos de 32 – MMDC cabia a organização dessas solenidades e a administração do monumento. A conclusão das obras ocorreu somente em 1970. A partir de 9 de julho de 1991, a direção do monumento-mausoléu foi confiada, em caráter perpétuo, à Polícia Militar do Estado de São Paulo, na pessoa do comandante da Academia do Barro Branco, Escola Superior de Formação de Oficiais da Polícia Militar.
Dada a série de dificuldades com a conservação do monumento-mausoléu ao longo dos anos 1990 e começo dos anos 2000, a Prefeitura e o Governo do Estado assinaram um convênio em junho de 2006, através do qual a Prefeitura passou a se responsabilizar pelo projeto paisagístico, ajardinamento, limpeza, conservação e segurança da praça em que está implantado, enquanto a responsabilidade pelo restauro e administração ficou a cargo do Governo do Estado. (Fonte: Prefeitura de São Paulo)