Frei Rovílio, em entrevista ao jornalisrta Desiderio Peron, editor da Revista Insieme,

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dizia: “O Talian é a única língua capaz de traduzir a nossa experiência migratória e cultural e familiar”.

CURITIBA – PR – O Talian, língua falada pela maioria dos imigrantes italianos que habitam o Sul do Brasil, ganha nesta terça-feira, em Foz do Iguaçu, o certificados de referência Cultural Brasileira, fazendo parte do Inventário Nacional da Diversidade Linguística – INDL. Também ganham igual status duas línguas indígenas – o Asurini do Trocará e o Guarani Mbya. Os certificados – segundo anuncia o MinC – Ministério da Cultura – são conferidos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan durante o Seminário Íbero-Americano de Diversidade Linguística que se realiza em Foz do Iguaçu entre hoje e quinta-feira.

No caso do Talian, o evento marca o ponto alto de um movimento iniciado há muitos anos no Rio Grande do Sul e que tinha como ponto de referência e principal incentivador o Frei Rovílio Costa, (colaborador da Revista Insieme desde o seu início, em 1994), falecido improvisadamente em 13 de junho de 2009, e que foi continuado sob o comando da Fibra – Federação das Associações Ítalo-Brasileiras do Rio Grande do Sul, presidida por Paulo Massolini, de Serafina Corrêa.

Segundo divulga o MinC em seu site na internet, o reconhecimento dos três idiomas ora certificados teve como ponto de partida um projeto piloto, realizado com base em pesquisas, entre 2008 e 2010. “Teve como referência a quantidade de pessoas que utilizam a língua, além da relevância para a memória, história e identidade dos grupos falantes”.

Ainda secundo o MinC, o Talian, falado na Região Sul do Brasil, é a língua utilizada por parte da comunidade italiana que chegou ao país ainda no século XIX, com influência de língua vêneta (do norte da Itália)”. Já era considerado patrimônio histórico e cultural dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Pertencente à família linguística Tupi-Guarani, o Asurini do Trocará , explica o MinC, “é a língua falada pelo povo indígena que vive às margens do Rio Tocantins, no município de Tucuruí-PA”, enquanto o Guarani Mbya, é “uma das três variedades da Língua Guarani (além do Nhandeva e o Kaiowa), utilizada por comunidades que vivem na faixa litorânea que vai do Espírito Santo ao Rio Grande do Sul”.

Segundo informa ainda o Ministério da Cultura,  o INDL foi criado em dezembro de 1910 e “tem como função preservar as línguas brasileiras de cunho indígena ou imigrante”. Explica também que para que uma língua seja reconhecida e passe a integrar o INDL, “ela precisa ser falada em território nacional há, pelo menos, três gerações, o marco temporal é em torno de 75 anos”.

A solicitação de reconhecimento é feita por meio de um pedido de inclusão no INDL para o Iphan. O requerimento é analisado por uma comissão técnica, que encaminha sua decisão para a sanção do Ministério da Cultura (MinC). No caso do Talian, o requerimento foi feito pela Fibra. A comissão técnica é composta por representantes dos ministérios da Cultura, Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação, Justiça e Planejamento. Segundo ainda  informa o MinC em seu site, no caso dessas três línguas, a aprovação da comissão técnica ocorreu no último dia 9 de setembro.

Segundo se lê na Wikipédia, “o talian (ou vêneto brasileiro ) é uma variante da língua vêneta (língua do norte da Itália) falada na Região Sul do Brasil, sobretudo nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina”.
A mesma fonte lembra que quando os imigrantes italianos começaram a chegar à região, no final do século XIX, ainda não tinha sido estabelecido um idioma italiano oficial na Itália. O uso de dialetos, então, era predominante. Observa ainda a Wikipédia que os italianos que imigraram para o Brasil eram de diferentes partes da Itália, mas no sul do Brasil predominaram os imigrantes do norte da Península Itálica, principalmente das regiões do Vêneto, da Lombardia, do Trentino-Alto Ádige e do Friuli-Venezia Giulia. Destes, cerca de 60% eram de língua e cultura vênetas.

Como formou-se o Talian? Dentre os diversos dialetos falados pelos imigrantes, com o tempo, o vêneto se soprepôs aos outros falares, “formando – como explica a mesma fonte – um coiné que servia como meio de comunicação em vista da diversidade linguística trazida pelos colonos. Em algumas localidades onde houve maior concentração de imigrantes provenientes de uma determinada localidade na Itália, ainda é possível reconhecer especificidades dialetais de alguma região da Itália (como exemplo, a comunidade de Pomeranos, onde o dialeto trentino conseguiu se manter). Mas, de maneira geral, as colônias eram habitadas por pessoas de diferentes partes da Itália, colocando em contato vênetos, lombardos, trentinos e, mais raramente, friulanos. Como havia uma predominância demográfica de vênetos, com o passar do tempo a fala foi evoluindo para um linguajar mais geral, formando um dialeto vêneto brasileiro, compreendido por todos os italianos e descendentes da região”.

As informações reunidas por Wikipédia destacam que “nas primeiras décadas de imigração, havia grande resistência da comunidade italiana em se misturar com os brasileiros. O processo de integração foi lento. Esse isolamento durou cerca de cinquenta anos, a contar do início da imigração, em 1875. No sul do Brasil, muitas colônias italianas eram situadas em regiões isoladas ou relativamente independentes da população brasileira. Isso permitiu a manutenção do uso da fala dialetal italiana por gerações. Tal fato não foi possível, por exemplo, no estado de São Paulo onde, desde o início, os imigrantes italianos tiveram contato diário com a população brasileira local, e seus dialetos foram rapidamente suplantados pela língua portuguesa”.

“O vêneto falado no sul do Brasil – continua a mesma fonte – é arcaico quando comparado ao vêneto falado atualmente na Itália, pois é semelhante ao usado no século XIX. Ademais, com o advento da rádio e da televisão, começou uma forte interferência da língua portuguesa no vêneto falado pelos imigrantes no Brasil. Em decorrência, o vêneto brasileiro evoluiu de forma diferente da variedade falada na Itália, uma vez que incorporou itens lexicais do português e se manteve ligado à maneira como era falado no século XIX. Assim, usa-se o termo talian para diferenciar o vêneto falado no Brasil do dialeto vêneto hoje usado na Itália. Contudo, o talian não é considerado um dialeto crioulo italiano, mas sim uma variante brasileira da língua vêneta.

A revista bilingue Insieme, em todas as suas edições mensais, continua a publicar textos reunidos por Frei Rovílio Costa na seção que lhe fora confiada desde o início com o título “L’Italiano che é (c’è) in te” (os primeiros textos produzidos por Rovílio estão na seção “Siamo Così” deste portal). Ali cada relato constitui um testemunho a favor do Talian, inclusive na época  da II Guerra Mundial, em que aquele jeito de falar constituía motivo para castigo, prisões e repressão por parte de agentes do Estado brasileiro.