PATROCINANDO SUA LEITURA

• Texto integral da comunicação do Mestrando em Direito, Ademir Posatti Jr, durante o Workshop “Cidadania e Nacionalidade no Direito Internacional”  (27.04.2009), promovido pelo Grupo de Pesquisas em Direito Internacional  do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina, sob a coordenação do Professor Arno Dal Ri Jr. O WorkShop é o primeiro de um ciclo de eventos sobre os aspectos políticos, jurídicos e econômicos do fenômeno da dupla Cidadania em Santa Catarina, em particular no que se refere à cidadania italiana.

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1. Primeiras palavras
Segundo Aurélio Buarque de Holanda, nacionalidade, que deriva do vocábulo latino natio, que significa nascer, é a condição ou qualidade de quem ou do que é nacional. País de nascimento. Condição própria de cidadão de um país quer por naturalidade, quer por naturalização. O complexo dos caracteres que distinguem uma nação, como a mesma história, as mesmas tradições comuns.
Para os juristas, o termo nacionalidade designa um vínculo entre o Estado soberano e o indivíduo, fazendo deste um membro da comunidade constitutiva da dimensão pessoal do Estado.


Entre os estudiosos do direito, como Tito Ballarino, o termo nacionalidade é comumente usado como sinônimo de cidadania, e se refere ao vínculo de pertencimento de uma pessoa a um determinado Estado3.
Dessa forma, a nacionalidade serve como meio para definir a lei reguladora do estatuto pessoal dos indivíduos e a disciplina de outras relações relativas ao direito privado, como as familiares e as sucessões causa mortis4. Confundindo-se com o conceito de cidadania, entende Ballarino que a nacionalidade é o título de participação na vida do Estado, que dá direito ao exercício de direitos políticos, acesso aos cargos públicos e profissões regulamentadas por lei.
No entanto parte da doutrina diferencia os termos cidadania e nacionalidade. A cidadania sendo o direito de intervir no processo governamental, compreendendo o exercício dos direitos do nacional, sobretudo o voto. Diferentemente, a nacionalidade é um status pessoal que se esclarece por contraposição ao do estrangeiro.

2. A nacionalidade no ordenamento jurídico internacional

A extensão dos domínios do Direito – nacional – extrapola a visão moderna de sua produção, linear e piramidal, restrita ao âmbito dos Estados nacionais. Muitos são os atos internacionais, ratificados pelo Brasil, e, por isso, integrante do corpo normativo brasileiro, que dizem respeito ao nacional e à situação jurídica do estrangeiro.
A nacionalidade tem caráter de direito fundamental, garantido a todo ser humano, em nível global, na Declaração Universal dos Direitos do Homem, emanada  da Organização das Nações Unidas, de 1948.
A regra expressa no artigo quinze do referido documento, de que todo o homem tem direito a uma nacionalidade, é princípio geral do Direito Internacional. No artigo segundo, a referida carta enuncia serem os direitos por ela proclamados comuns a todas as pessoas, sem distinção quanto à origem nacional.
Em 1928 surgiu o Código Americano de Direito Internacional Privado, mais conhecido como Código de Bustamante5, trazendo inúmeras regras de processo internacional. Este foi aceito por diversos países, tendo, inclusive, aplicação nos dias de hoje6.
O artigo primeiro do Código de Bustamante aduz que os estrangeiros que pertençam a qualquer dos Estados contratantes gozam, no território dos demais, dos mesmos direitos civis que se concedem aos nacionais. Cada Estado contratante pode, por motivos de ordem pública, recusar ou sujeitar a condições especiais o exercício de determinados direitos civis aos nacionais dos outros [Estados], e qualquer desses Estados pode, em casos idênticos, recusar ou sujeitar a condições especiais o mesmo exercício dos nacionais do primeiro.
Note-se que a reciprocidade, princípio enunciado na referida normativa, quando assume feições negativas, de represália, não é adotada pelo direito brasileiro.
O artigo segundo do Código de Bustamante estabelece a igualdade entre os nacionais e estrangeiros quanto às garantias individuais, salvo as restrições que em cada um estabeleçam a Constituição e as leis.
A Convenção de Havana, de 1928, estabelece no seu artigo quinto o dever de todos os Estados concederem aos estrangeiros domiciliados ou de passagem em seu território todas as garantias individuais que concedem a seus próprios nacionais e o gozo dos direitos civis essenciais.
Em 1930, a Convenção de Haia proclamou a liberdade do Estado para determinar através do direito interno quais são seus nacionais, ao mesmo tempo em que censurou a repercussão de pleno direito sobre a mulher, na constância do casamento, da eventual mudança de nacionalidade do marido. A Convenção de Haia determinou, ainda, aos Estados, cuja lei subtrai a nacionalidade da mulher em virtude da aquisição da nacionalidade do marido estrangeiro, que se certifiquem desta, prevenindo, destarte,  a perda não compensada, vale dizer, a existência de apátridas7.
Também são importantes os seguintes documentos internacionais que permearam a construção da nacionalidade no Brasil:
– Artigos 2º e 26º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, signado em Nova Iorque, em 16/12/1966, no âmbito da ONU,
– Artigo 2º do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais, firmado em Nova Iorque em 16/12/1966, sob a égide da ONU,
– Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, de São José da Costa Rica, de 22/11/1969. O seu artigo 20º prevê que toda a pessoa tem direito a nacionalidade do Estado em cujo território houver nascido, se não tiver direito a outra.
Inegável, portanto, o papel do Direito Internacional na conformação dos princípios que balizam o instituto da nacionalidade, notadamente de direito público interno, ficando a cargo do legislativo nacional.
Entre esses princípios, acentua-se o princípio da atribuição estatal da nacionalidade, em virtude do qual, somente os Estados, e não os entes federados e municípios, podem criar normas sobre a nacionalidade. Quanto ao princípio da inconstrangibilidade, enuncia que ninguém pode ser constrangido a adquirir uma nacionalidade, mesmo os apátridas. Em função do princípio da optabilidade, o indivíduo deve ser livre para optar ou mudar de nacionalidade.

3. Aquisição da nacionalidade

O constitucionalista Alexandre de Moraes distingue duas formas de aquisição da nacionalidade: a primária e a secundária.
A nacionalidade primária, ou original, está vinculada ao nascimento do indivíduo sendo, portanto, involuntária. Este tipo de nacionalidade está baseado em dois tipos jurídicos: o ius solis e o ius sanguinis.
Proclama o ius sanguinis, que consiste no vínculo sangüíneo com a pátria, que a nacionalidade dos pais determina a nacionalidade dos filhos, independentemente do lugar de nascimento destes, decorrendo assim, a nacionalidade, do próprio fato da filiação. Será brasileiro nato todo aquele que for filho de nacionais. Tal critério leva em conta a paternidade e, mais especificamente, a nacionalidade dos pais.
Se os pais tiverem nacionalidades diferentes, prevalecerá a do pai. Se o filho for natural, ou de pai desconhecido, seguirá a nacionalidade da mãe. Se ambos os pais forem desconhecidos, não será possível a adoção do ius sanguinis, fixando-se a nacionalidade pelo critério do ius soli.
O critério do ius sanguinis foi adotado na Antigüidade Clássica e Oriental. Posteriormente, com a Revolução Francesa, movimento que pôs fim ao Antigo Regime e, com ele, lembranças do feudalismo, o vínculo sanguíneo passou a ser mais utilizado.
O ius sanguinis é adotado pelos países de emigração, sobretudo os europeus, que desejam manter vínculos com seus nacionais.
Declara o ius soli que o elemento precípuo, que se une ao nascimento, é o território, base física do Estado nacional. O ius soli nasce dentro dos limites territoriais do Estado. Tal critério leva em consideração o lugar do nascimento.
O ius soli consiste na concessão da nacionalidade em função do local do nascimento, é o direito do solo. Quem Nasce no território do Estado, desse Estado é nacional8.
O sistema do ius soli foi largamente usado no período feudal no qual a idéia dominante era manter o indivíduo preso a terra9, época em que o solo era o centro da economia.
Em função do grande número de imigrantes, o ius soli tem grande aplicabilidade na América, de forma evitar a formação de minorias estrangeiras sob a proteção de outros Estados.
Hodiernamente, como critério de aquisição originária da nacionalidade, a maior parcela dos países segue o ius sanguinis, apesar de anuir a certas atenuações, especialmente em países europeus. Os paises latino-americanos privilegiam o ius soli, havendo, todavia, exceções, parecendo, não existir, nos dias atuais, Estado que adote exclusivamente qualquer dos dois sistemas.
A nacionalidade secundária ou adquirida é a que se adquire por vontade própria, após o nascimento, em regra pela naturalização, através de uma profusa diversidade de formas como o casamento, a residência no país por certo período de tempo, etc.
A naturalização é o único meio derivado de aquisição de nacionalidade pelo qual se permite ao estrangeiro que detém outra nacionalidade, ou ao apátrida10, destituído de qualquer nacionalidade, assumir a do país em que se encontra mediante o cumprimento de determinados requisitos.
Em 1954, em Nova Iorque, foi concluída uma convenção que deu aos apátridas os mesmos direitos e tratamento que recebem os estrangeiros no território do Estado. O apátrida está submetido à legislação do Estado onde se encontra.
São polipátridas11 os indivíduos que tenham mais de uma cidadania, por exemplo, um filho de italiano nascido no Brasil que, pelo ius solis, é brasileiro e, pelo ius sanguinis é italiano.

4. A nacionalidade brasileira

Conforme Naiara Posenato, o interesse-necessidade de um Estado em determinados períodos históricos determina variações relevantes no conceito e alcance jurídico da nacionalidade12.
A primeira Constituição brasileira, de 1824 considerava como cidadãos brasileiros todos quantos tivessem a nacionalidade brasileira, pois no regime político da monarquia, a condição de nacional coincidia com a de súdito.
A preocupação em consolidar o Estado recém independente, fez com que já na Constituição de 1824 fosse instituído o sistema territorial do ius soli para a determinação da nacionalidade, de modo que quem nascesse em território brasileiro, e possuísse o estado de liberdade, não sendo escravo, era considerado cidadão brasileiro13.
A adoção do ius soli, como critério definidor da nacionalidade, pela maior parte dos países latino-americanos, preocupados em efetivar uma população nacional, contrastou com o critério do ius sanguinis adotado pela maior parte dos estados europeus.
Conforme o artigo 6 da Carta de 1924, a nacionalidade também era reconhecida aos filhos de pai brasileiro e aos ilegítimos de mãe brasileira, nascidos fora do Brasil, que viessem a estabelecer domicílio no Império, a qualquer tempo ou que estivessem a serviço do Império em país estrangeiro.
A Constituição de 1891 manteve a igualdade entre nacionais e cidadãos, estabelecendo a capacidade eleitoral como resultante da diferença entre o simples nacional e o nacional com direito de voto – o cidadão ativo.
A primeira Constituição republicana manteve o ius soli, com as mesmas concessões aos ius sanguinis da Constituição monárquica. Estendeu a nacionalidade brasileira aos estrangeiros que fossem casados com brasileiros ou que tivessem filhos brasileiros, se possuíssem bens imóveis e residissem no Brasil.
Em 1891, foi empregada a naturalização tácita, concedendo naturalização a todos os estrangeiros residentes no país, a não ser àqueles que expressamente desejassem o contrário.
A Constituição de 1934 manteve os princípios fundamentais anteriores, trazendo conteúdo novo ao tornar obrigatório o voto e a admitir o voto feminino. Ademais, suprimiu todos os casos de naturalização tácita a partir da sua promulgação.
A Carta de 1934 ratificou o ius soli, ampliando a concessão ao ius sanguinis, já que extinguiu a distinção entre filhos legítimos e ilegítimos, referindo-se a filhos de brasileiro ou brasileira.
Nos casos de filho de brasileiro, nascido no exterior, inovou a Lei de 1934 ao estabelecer a prescindibilidade do domicílio no Brasil e a necessidade de uma opção expressa pela nacionalidade brasileira, uma vez adquirida a maioridade.
O Estado Novo, com a sua Carta Magna de 1937, não teceu alterações no que se refere à outorga da nacionalidade. Tampouco inova a Constituição de 1946, que apenas determina a reinclusão da abolida condição de residência no Brasil, do filho de brasileiros nascido no exterior, que veio a somar-se com o critério da opção, em um prazo estendido para quatro anos, depois de completada a maioridade.
A ditadura militar brasileira, na sua Constituição de 1967, considerava nacional somente o cidadão cooperante, excluindo da cidadania os discidentes ou perturbadores da ordem.
Mantendo o ius soli como elemento primordial de determinação da nacionalidade, a Carta de 1967 deu maior alcance ao ius sanguinis, ao permitir aos filhos de brasileiros nascidos no exterior a confirmação da nacionalidade somente através da inscrição em qualquer registro consular competente.
A Emenda Constitucional de 1969 aumentou os cargos privativos de brasileiros natos e determinou a competência do Presidente da República para o decreto de anulação da nacionalidade obtida em fraude a lei. No artigo 199, a referida EC, considerou o cidadão português merecedor de igual tratamento igual ao dispensado aos brasileiros naturalizados, sob a condição da reciprocidade.
Visto esse breve histórico, cumpre analisar o estado da questão na Constituição Federal vigente.

5. Aquisição da nacionalidade brasileira

A Constituição cidadã, de 1988, realizou poucas modificações em relação às Cartas anteriores.
Note-se que a Emenda Constitucional nº 3, de 1994, modificou o texto da CF de 1988, no que concerne à nacionalidade. Assim, o que se estuda como o Direito à Nacionalidade no Brasil hoje, data de 1994.
Quanto a aquisição da nacionalidade brasileira originária, o legislador constituinte manteve como regra o critério do ius soli, prevendo hipóteses em que adotou o critério do ius sanguinis.

Art. 12 –  São brasileiros:
I – natos:
a)  os nascidos na República Federativa do Brasil14, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país.
b) os nascidos no exterior, de pai ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil.
c) Os nascidos no exterior, de pai ou mãe brasileira desde que venham residir na República Federativa do Brasil antes da maioridade e optem, pela nacionalidade brasileira.

Denota-se que a Constituição cidadã possibilita a existência de brasileiros nacionalizados pelo critério do ius soli e ius sanguinis.
Segundo o ius soli, que leva em consideração o lugar do nascimento, conforme a alínea a, será brasileiro nato todo aquele nascido no território brasileiro.
Pelo ius sanguinis, será brasileiro nato todo aquele que for filho de nacionais. Tal critério leva em conta a nacionalidade dos pais, conforme disposição da alínea b e c.
Aquisição potestativa da nacionalidade é a hipótese prevista no o artigo  12, inciso I, c da CF.
Com a EC nº 3, de 1994, suprimiu-se os requisitos temporais e de maioridade, de modo que a aquisição de nacionalidade brasileira originária, por opção, ficou sujeita a quatro condições, que preenchidas, dá o direito à nacionalidade originária, amparada por direito subjetivo público:
a) o nascimento no exterior,
b) ser nascido de brasileira ou brasileiro nato ou naturalizado,
c) residir, a qualquer tempo, no Brasil;
d) declaração unilateral de vontade, a qualquer tempo, confirmativa da opção pela nacionalidade originária brasileira.
Essa alínea criou a possibilidade de filhos de brasileiros no exterior serem apátridas, conforme analisado anteriormente, na nota de rodapé nº 10.
Não é mais possível o registro em repartição consular de filho de brasileiro nascido no exterior, sendo a única forma de conseguir a nacionalidade brasileira, nesses casos, o estabelecimento do domicílio no Brasil e a realização da opção a qualquer tempo.
Se a nacionalidade originária depende da vontade do Estado, e a nacionalidade derivada, depende da vontade do homem: a primeira é uma nacionalidade de atribuição, a segunda uma nacionalidade de eleição. A nacionalidade derivada, comumente chamada de naturalização, que pode ser tácita ou expressa, consta no artigo 12 da CF.

Art. 12 –  São brasileiros:
II – naturalizados:
a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;
b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira.

Ainda que preenchidos os requisitos, por não haver, em princípio, direito público subjetivo à naturalização, pode ao estrangeiro ser negada a aquisição da nacionalidade brasileira. A naturalização é um ato unilateral e discricionário do Estado no exercício de sua soberania15. A satisfação das condições previstas nesta Lei não assegura ao estrangeiro direito à naturalização16.
A naturalização tácita foi empregada na Constituição de 1891, concedendo naturalização a todos os estrangeiros residentes no país, a não ser àqueles que expressamente desejassem o contrário.
A ampla naturalização foi empregada por motivos históricos, quando da necessidade de regularizar uma população brasileira, a fim de afirmar o nascente Estado brasileiro. Não houve após 1891, nenhum outro caso de naturalização tácita na ordem jurídica brasileira.
Dispunha o artigo 69, §4º, da Constituição de 1891 que passavam a ser “cidadãos brasileiros os estrangeiros que, achando-se no Brasil aos 15 de novembro de 1889, não declarem, dentre em seis meses depois de entrar em vigor a Constituição, o animo de conservar a nacionalidade de origem”.
A naturalização expressa tem seu tratamento na lei ordinária, conforme disposição do artigo  22, XIII, da Constituição Federal17.
A naturalização expressa é dividida em naturalização ordinária, ou comum, e extraordinária, que classifica o procedimento de radicação precoce.
A naturalização ordinária se concede ao estrangeiro residente no país e que seja originário de países de Língua Portuguesa18. Exige-se desses estrangeiros apenas residência no país por 1 ano ininterrupto e idoneidade moral.
Já a naturalização extraordinária atinge os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes no Brasil, exigindo-se deles o domicílio no país por mais de 15 anos ininterruptos e sem condenação penal. O prazo anterior, que era de 30 anos, foi alterado pela Emenda Constitucional nº 3, de 1994.
Observe-se que no Brasil, a nacionalidade dos demais membros da família não ocorre quando da naturalização do chefe de família, diferentemente do que ocorre na Inglaterra, Bélgica, Bulgária, Estados Unidos, China, Dinamarca, Espanha, Finlândia, Holanda, Hungria, Itália, Japão e Noruega.
Também no Brasil não há naturalização pelo ius laboris, como ocorre no Haiti, Panamá, Rússia e Uruguai. Tampouco há naturalização no Brasil por aceitação de emprego público ou pensão do governo, ou por prestação de serviço militar, assim como pela prestação de serviços relevantes ao Brasil.

7. Limitações aos naturalizados

Aos natos a Constituição não faz qualquer limitação, a não ser aquelas decorrentes dos deveres que se impõe a todos. Isso é o que constitui a vantagem do nato em relação ao naturalizado. Já aos naturalizados se impõem algumas limitações.
As diferenciações só são possíveis se estabelecido na própria Constituição, não cabendo à lei criar diferenciações19.
A Constituição, no artigo 12, § 3º da CF, reserva alguns cargos aos brasileiros natos, em atenção à linha sucessória, conforme os artigos 79 e 80 da CF, e à segurança nacional.
Não podem os naturalizados ocupar os cargos de Presidente e Vice-presidente da República; de Presidente da Câmara dos Deputados e do Senado Federal; de Ministro do Supremo Tribunal Federal (até aqui, por estarem na linha sucessória do Presidente da República.); da Carreira Diplomática e de Oficial das Forças Armadas.
Essas restrições se dão pela necessidade de defesa dos interesses nacionais, que podem ficar à mercê de grupos estrangeiros, os quais, através de um membro naturalizado brasileiro, poderiam alcançar um enorme poder em nosso país, portanto a segurança nacional justifica as limitações.
No Conselho da República, órgão superior de consulta do Presidente da República, são reservados seis espaços para brasileiros natos. Entretanto, tal função pode ser desempenhada por brasileiros naturalizados, pois os postos de lideres da maioria e minoria na Câmara e no Senado não são restritos aos natos e também têm assento no Conselho da República20.
Também o naturalizado é impedido de ser proprietário de empresa jornalística e de radiodifusão de sons e imagens. Essa proibição vale para o naturalizado com menos de 10 anos. Ao naturalizado há mais que esse tempo, não existe essa limitação, conforme o artigo 222 da CF. Tal reserva se dá pela notável influência dessas empresas na formação da opinião pública.
O brasileiro nato, em nenhuma hipótese pode ser extraditado, o que já não ocorre com o naturalizado, que poderá ser entregue à Justiça de outro país, competente para julgá-lo e puni-lo, em caso de crime comum, cometido antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes21.

8. Procedimento de naturalização

A nacionalidade secundária é adquirida através da naturalização. Esse procedimento permite ao estrangeiro ou ao apátrida assumir a nacionalidade do país em que se encontra, mediante a satisfação de requisitos, que variam nos diferentes Estados.
No Brasil, a concessão da naturalização é faculdade do Poder Executivo. É ato unilateral, em que, à parte o preenchimento dos requisitos previstos em lei, o naturalizando deve manifestar expressamente à vontade de tornar-se nacional brasileiro.
Observa-se que a naturalização se tornou ato discricionário do Estado, no exercício de sua soberania, podendo negar ou conceder a nacionalidade brasileira ao estrangeiro.
O procedimento de naturalização está previsto no Estatuto do Estrangeiro – a Lei n° 6.815, de 19 de agosto de 1980, modificada pela Lei n° 6.964, de 9 de dezembro de 1981.
De acordo com o artigo 112 do Estatuto do Estrangeiro, podemos observar as seguintes condições necessárias para a naturalização ordinária e extraordinária:
– a capacidade civil, segundo o Código Civil brasileiro;
– o naturalizando deve ser registrado como permanente no Brasil;
– ter residência contínua no território brasileiro pelo prazo mínimo de quatro anos, imediatamente anteriores ao pedido de naturalização;
– ler e escrever a língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando;
– exercício de profissão ou posse de bens suficientes à manutenção própria e da família;
– bom procedimento;
– inexistência de denúncia, pronúncia ou condenação no Brasil ou no exterior por crime doloso a que seja cominada pena mínima de prisão, abstratamente considerada, superior a um ano;
– boa saúde22.
Dispõe o artigo 113 que o prazo de residência fixado no artigo 112 poderá ser reduzido se o naturalizando preencher determinados requisitos.
Assim, se o naturalizando tiver filho ou cônjuge brasileiro, se for filho de brasileiro ou haver prestado ou poder prestar serviços relevantes ao Brasil, ajuízo do Ministro da Justiça o prazo de residência será no mínimo, de um ano.
A residência será, no mínimo, de dois anos, se a naturalização for recomenda-se pela capacidade profissional, científica ou artística do naturalizando.
No caso de o naturalizando ser proprietário, no Brasil, de bem imóvel, cujo valor seja igual, pelo menos, a mil vezes o Maior Valor de Referência; ou ser industrial que disponha de fundos de igual valor; ou possuir cota ou ações integralizadas de montante, no mínimo, idêntico, em sociedade comercial ou civil, destinada, principal e permanentemente, à exploração de atividade industrial ou agrícola, o prazo de residência dera de três anos.
Ademais, conforme o artigo 114, dispensar-se-á o requisito da residência, exigindo-se apenas a estada no Brasil por trinta dias, quando se tratar de cônjuge estrangeiro casado há mais de cinco anos com diplomata brasileiro em atividade ou de estrangeiro que, empregado em Missão Diplomática ou em Repartição Consular do Brasil, contar mais de dez anos de serviços ininterruptos. Este é o caso da chamada naturalização especial.
Conforme o artigo 115 do Estatuto do Estrangeiro,  aquele que pretender a naturalização deverá requerê-la ao Ministro da Justiça, e declarar:
– nome por extenso,
– naturalidade,
– nacionalidade,
– filiação,
– sexo,
– estado civil,
– dia mês, ano de nascimento,
– profissão,
– lugares ande haja residido anteriormente no Brasil e no exterior,
– inexistência de denúncia, pronúncia ou condenação no Brasil ou no exterior por crime doloso a que seja cominada pena mínima de prisão, abstratamente considerada, superior a 1 (um) ano,
– se deseja ou não traduzir ou adaptar o nome à língua portuguesa.
Quando se tratar de estrangeiro admitido no Brasil até a idade de cinco anos, radicado definitivamente no território nacional, desde que requeira a naturalização até dois anos após atingir a maioridade, o §2º do artigo 115 exige apenas:
– apresentação de documento de identidade para estrangeiro,
– atestado policial de residência contínua no Brasil,
– atestado policial de antecedentes, passado pelo serviço competente do lugar de residência no Brasil.
O mesmo vale para o estrangeiro que tenha vindo residir no Brasil antes de atingida a maioridade e haja feito curso superior em estabelecimento nacional de ensino, se requerida a naturalização até um ano depois da formatura.

Conforme o artigo 116, o estrangeiro admitido até os cinco anos, e estabelecido definitivamente no território brasileiro, poderá, enquanto menor, requerer ao Mistério da Justiça, através de seu representante legal, a emissão de certificado provisório de naturalização, que valerá como prova de nacionalidade brasileira até dois anos depois de atingida a maioridade.
Esta emissão do certificado provisório de naturalização é requisito essencial para a confirmação da nacionalidade brasileira, que se dá através da naturalização definitiva.
A naturalização definitiva se expressa como opção do menor em confirmar a naturalização provisória, tornando-a, portanto, definitiva.
Conforme o parágrafo único do artigo 116 do Estatuto do Estrangeiro, a naturalização se tornará definitiva se o titular do certificado provisório, até dois anos após atingir a maioridade, confirmar expressamente a intenção de continuar brasileiro, em requerimento ao Ministro da Justiça.
Assim, para ser concedida a naturalização definitiva, deve-se primeiramente ter adquirido a naturalização provisória. A confirmação da nacionalidade brasileira é um processo reduzido, já que a complexidade do procedimento para a obtenção do certificado provisório de naturalização, envolve uma série de exigências para sua aquisição.
A caducidade ocorrerá a partir do momento que o naturalizado não solicita a entrega do certificado de naturalização no prazo de doze meses, contados da publicação do ato, salvo motivo de força maior devidamente comprovado, conforme o parágrafo terceiro do artigo 119.
A invalidação da naturalização será declarada quando se fizer presente qualquer vício que a autorize e não incidirão sobre ela os efeitos da prescrição ou da decadência. Nesse caso, ao apresentar algum documento ou informação falsos, para obter alguns dos requisitos exigidos, o naturalizando, estará praticando ato criminoso, podendo o Estado caracterizar a perda da nacionalidade adquirida.
A naturalização não importa a aquisição de nacionalidade brasileira pelo cônjuge e filhos do recém-naturalizado e não autoriza estes a se radicar no país.

9. Perda e a reaquisição da nacionalidade brasileira 

Art. 12, § 4º – Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
I – tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional;
II – adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:
a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;
b) de imposição de naturalização, pela forma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis.

A perda da nacionalidade consiste no rompimento do vínculo jurídico- político existente entre o indivíduo e o Estado. Se o indivíduo era detentor de apenas uma nacionalidade, e a perde, gera uma situação de apatria.
Salienta-se que esta perda gera efeitos personalíssimos, não atingindo os ascendentes e tampouco os descendentes da pessoa que perdeu a nacionalidade.
Note-se que as hipóteses arroladas no dispositivo constitucional atingem tanto brasileiros natos como naturalizados, e autorizam o Presidente da República a declarar a perda da nacionalidade brasileira.
O cancelamento da naturalização por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse social é também chamada de perda-punição. Nesse caso, é previsto no Brasil a Ação de Cancelamento de Naturalização proposta pelo Ministério Público Federal. Uma vez perdida a nacionalidade mediante sentença transitada em julgado da Ação de Cancelamento de Naturalização, somente será possível readquiri-la por meio de ação rescisória e nunca por novo processo de naturalização.
A aquisição de outra nacionalidade, voluntariamente, ocasiona a perda da primeira nacionalidade, a chamada perda-mudança, nos casos em que não é admitida a dupla cidadania.
Ainda, a nacionalidade pode ser perdida:
– pelo casamento,
– por cessões ou anexações territoriais,
– pela presunção de renúncia, em conseqüência de residência, mais ou menos prolongada, em país estrangeiro, sem intenção de regresso.
A regra é a perda da nacionalidade primária quando se adquire outra nacionalidade. A alíneas a do inciso II do artigo 12, §4°, excepciona tal regra,  resguardando o adquirente de outra nacionalidade por aquisição originária (pelo nascimento) e protegendo o constrangimento de brasileiros que, por força de contratos, trabalhavam em países que requeiram naturalização para trabalhar em seu território. Da mesma forma, a alínea b faz manter a nacionalidade brasileira, originária, quando a norma de outro Estado impõe a naturalização do brasileiro nele residente, como condição de permanência em seu território ou do exercício de direitos civis.
Assim, verifica-se que a perda da nacionalidade de um país ocorre pelos mesmos motivos que prevêem a aquisição de outra, pois a perda é conseqüência da aquisição de outra, já que a obtenção da nacionalidade sempre gera a extinção da nacionalidade anterior.
Observa-se que no Brasil a reaquisição da nacionalidade é prevista no na Lei de Estrangeiros, Lei nº 818/49, ainda em vigor, pois não expressamente revogada.
Segundo o disposto no artigo 36 da Lei nº 818/49 o brasileiro que, por qualquer das causas do art. 22, nº I e II desta lei, houver perdido a nacionalidade, poderá readquiri-la por decreto, se estiver domiciliado no Brasil.
Dispõe o artigo 22, que perde a nacionalidade o brasileiro que, por naturalização voluntária, adquirir outra nacionalidade (I) ou que, sem licença do Presidente da República, aceitar, de governo estrangeiro, comissão, emprego ou pensão (III).
Dispõe o parágrafo primeiro que o pedido de reaquisição, dirigido a Presidente da República, será processado no Ministério da Justiça e Negócios Interiores, podendo ser por intermédio do Ministério das Relações Exteriores, ao qual será encaminhado por intermédio dos respectivos Governadores, se o requerente residir nos Estados ou Territórios.
A reaquisição, no caso do artigo 22, I, não será concedida, se apurado que o brasileiro, ao eleger outra nacionalidade, o fez para se eximir de deveres a cujo cumprimento estaria obrigado, se conservasse brasileiro.
No caso do art. 22, II, para a  reaquisição, é necessário que o ex-nacional tenha renunciado à comissão, ao emprego ou pensão de Governo estrangeiro.
A condição básica para a reaquisição da nacionalidade é a residência e domicílio do ex-nacional no Brasil.
Aqueles que tiverem perdido a nacionalidade por motivos inexistentes na CF/1988 poderão, desde logo, recuperá-la, vez que hoje não são considerados, pelo ordenamento jurídico-constitucional, como causadores da perda da nacionalidade brasileira.
A reaquisição da nacionalidade opera efeitos ex nunc, voltando a ser brasileiro nato se assim o era, ou naturalizado, se naturalizado o era.
Fica impossibilitada a reaquisição de nacionalidade quando atingido por  sentença de cancelamento de naturalização. Nesses casos, somente poderá ocorrer a reaquisição através de uma ação rescisória.

10. Dupla nacionalidade no Brasil

Até 1994, o Brasil não admitia a dupla nacionalidade para os seus nacionais e decretava a perda da nacionalidade brasileira sempre que alguém se naturalizasse em outro país. Até 1994, não era argüida a voluntariedade dessas segundas naturalizações.
A simples decisão da pessoa de estabelecer vínculo político-jurídico com outra nação determinava o desaparecimento da nacionalidade brasileira originária era. Independia que o cidadão brasileiro não desejasse abdicar de sua cidadania brasileira. Dessa forma, o Brasil fechava as portas aos filhos de imigrantes aqui nascidos.
A EC nº 03/94 inovou ao inserir no texto da CF/88 dispositivo destinado a preservar a nacionalidade brasileira daqueles que se naturalizassem em outro país.
A EC acrescentou duas ressalvas à perda da nacionalidade daquele que obtivesse uma segunda nacionalidade, conforme previsto no artigo 12, §4, II. Assim, quando do reconhecimento da nacionalidade originária (pelo nascimento) pela lei estrangeira e quando de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis, não era cancelada a nacionalidade brasileira.
Ao implantar essas modificações, o Brasil se atualizou, acompanhando as mudanças de uma sociedade cujos indivíduos não mais se vinculam às suas fronteiras originais. A EC nº 3 de 94 flexibilizou a soberania absoluta, adequando-se à realidade que comporta uma série de imigrações e processos de integrações regionais da qual o Brasil participa.

11. Últimas palavras

A nacionalidade é o direito adquirido pelo cidadão a partir do momento de seu nascimento, seja lá onde este estiver ocorrido, dentro do sistema ius soli ou ius sanguinis, sendo um direito universal oferecido em todas as nações do mundo, conforme determinação das Nações Unidas.
Feita a evolução normativa do instituto da nacionalidade no Brasil, e  levantados alguns aspectos universais, oriundos do direito internacional, percebe-se a mudança do trato dessa temática na contemporaneidade.
Desde a segunda metade do século XX, quando o mundo viu nascerem novas formas de organização político-social, notadamente os processos de integrações regionais entre nações, os Estados deixam de lado a rigidez do seu nacionalismo, possibilitando uma flexibilização do estatalismo, que se abre às novas formas de organização social.
Também por isso, o instituto da nacionalidade atualizou-se de forma geral, no Brasil e no mundo. Os Estados não mais prendem os seus nacionais a uma única nacionalidade, como forma de  manter intactos e puros os caracteres do Estado, no caso o povo, cuja constituição abrange os cidadãos pátrios.
Hoje, dinamizados pelos fluxos migratórios, muito em função das integrações regionais os Estados  abrem-se para a convivência com diversos nacionais, permitindo a poli-nacionalidade, inclusive.
O Brasil acompanha essa mudança. A legislação pátria vigente é liberal e inovadora, por tratar o estrangeiro como igual, desde que haja reciprocidade, dando exemplo de tratamento respeitoso dado aos diversos nacionais.
O sistema pátrio afirma que a construção da nacionalidade faz parte do processo de democratização da sociedade, em que o convívio com indivíduos que dividem direitos e deveres, em função de uma sociedade, nos dá a visão de devermos ser iguais perante o Estado.
Por fim, o estado atual da nacionalidade remete aos primórdios da organização social, em que os cidadãos não se submetiam a qualquer – única – fronteira, imbuindo-se num crescimento mútuo, entre a sociedade e os diversos cidadãos, independente do seu local de proveniência.

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