Prezados leitores: dando sequência ao tema da presente série de artigos, hoje falaremos sobre os limites éticos impostos aos advogados no exercício da publicidade e propaganda de sua prestação de serviços profissionais.

Por todo o mundo, varia fortemente a forma com a qual é permitido aos profissionais do direito realizarem a divulgação dos serviços que prestam. Uma primeira distinção vale a pena ser considerada aqui: a diferença entre “propaganda” e “publicidade”. Entende-se que a propaganda possui evidente apelo mercantilista, enquanto a publicidade não possui, necessariamente, o mesmo apelo. Assim, os sistemas éticos advocatícios espalhados pelo mundo podem ser inicialmente divididos entre aqueles que permitem a propaganda dos serviços advocatícios (como, por exemplo, nos EUA) e aqueles que permitem somente a publicidade dos serviços prestados pelos profissionais do direito (o Brasil e a Itália se enquadram no segundo sistema).

PATROCINANDO SUA LEITURA

Quando avaliamos os sistemas que permitem a publicidade, abre-se um novo leque de opções. Há sistemas que permitem uma publicidade mais mercantilizada e sistemas que somente permitem a chamada “publicidade informativa” – nesta modalidade de publicidade, o advogado somente pode levar ao conhecimento do público em geral, sem abuso de poder econômico e sem o objetivo de captação de clientela, informações relacionadas ao seu perfil profissional, como, por exemplo, contatos, currículo, áreas de atuação, títulos que possui, qualificações e habilidades profissionais específicas, dentre outras informações estritamente relacionadas à sua prática profissional. No Brasil, adota-se este último sistema – e as fontes da regulamentação são o próprio Código de Ética e Disciplina da OAB e o recentíssimo Provimento nº 205/2021 do Conselho Federal da OAB.

Muito embora o recente provimento do Conselho Federal tenha avançado discretamente em direção a um sistema mais permissivo, ele ainda se sujeita aos limites éticos traçados pelo Código de Ética e Disciplina, estando o regramento, sem dúvida alguma, ainda no campo da publicidade informativa. O art. 3º do provimento diz que “a publicidade profissional deve ter caráter meramente informativo e primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão”, trazendo vedação expressa às seguintes condutas:

a) referência, direta ou indireta, a valores de honorários, formas de pagamento, gratuidade ou descontos e reduções de preços como forma de captação de clientes;

b) divulgação de informações que possam induzir a erro ou causar danos a clientes, a outros advogados ou à sociedade;

c) anúncio de especialidades para as quais não possua título certificado ou notória especialização;

d) utilização de orações ou expressões persuasivas, de autoengrandecimento ou de comparação;

e) distribuição de brindes, cartões de visita, material impresso e digital, apresentações dos serviços ou afins de maneira indiscriminada em locais públicos, presenciais ou virtuais, salvo em eventos de interesse jurídico.

O provimento veda igualmente “a referência ou menção a decisões judiciais e resultados de qualquer natureza obtidos em procedimentos que patrocina ou participa de alguma forma, ressalvada a manifestação espontânea em caso coberto pela mídia”.

No Código de Ética e Disciplina se encontram outras importantes vedações, como, por exemplo:

a) remessa de correspondência a uma coletividade (malas-diretas, art. 32, §2º);

b) responder com habitualidade consulta sobre matéria jurídica, nos meios de comunicação, no intuito de se promover profissionalmente;

c) debater, em qualquer veículo de divulgação, causa sob seu patrocínio ou patrocínio de colega;

d) divulgar ou deixar que seja divulgada a lista de clientes e demandas (art. 33, I, II e V).

A Itália adota um sistema muito parecido com o brasileiro, guardadas as devidas proporções. O Código Deontológico Forense italiano traz um sistema análogo ao brasileiro, permitindo somente a publicidade informativa e vedando a mercantilização da profissão e a exposição do profissional com a finalidade de captação de clientela ou de concorrência desleal. O art. 35 do Código Deontológico dispõe que “o advogado que presta informação sobre sua atividade profissional, seja qual for o meio para a prestar, deve respeitar os deveres de verdade, correção, transparência, sigilo e confiabilidade”, estando vedada a realização de comparações com outros profissionais, prestação de informações inequívocas, enganosas e difamatórias. Aliás, o art. 17 do mesmo Código elenca as informações sobre o exercício da atividade profissional que podem ser divulgadas – todas elas relacionadas ao perfil do profissional e de seu escritório –, em franco alinhamento com o sistema brasileiro, qual seja, o da publicidade informativa (consulte o Código Deontológico Forense italiano neste link)

Uma rápida pesquisa pelas redes sociais e canais de streaming (principalmente o YouTube) nos permite antever como os mais conhecidos prestadores de serviços no campo da cidadania se afastam da deontologia advocatícia, seja pela ótica da regulamentação brasileira, seja pela ótica da regulamentação italiana. Tais advogados e advogadas publicam e comentam sentenças como forma de autopromoção; fazem comparações explícitas com outros colegas (quando não brigam publicamente com eles), com a franca intenção de difamar (ainda que de forma “impessoal” e coletiva) “todos os outros”, colocando-se como “bastiões da moralidade” e, portanto, como os únicos profissionais viáveis para o encargo profissional da cidadania; fazem “brindes” e promoções; divulgam honorários; publicam o número de processos que possuem sob seu patrocínio, fazendo inclusive posts comemorativos a respeito; fazem referências às famílias que estão sob seu patrocínio, sem que isto corresponda a qualquer benefício para a coletividade; muitas vezes, alteram a verdade, seja ocultando ou minimizando os riscos dos processos judiciais, seja anunciando factoides – como, por exemplo, o “fim” da via administrativa ou o “fim” dos recursos à Corte d’Appello –, seja publicizando vantagens inexistentes com relação à sua própria prática profissional – como, por exemplo, “nunca haver perdido uma causa” (em uma matéria em que vitualmente não há sucumbência), “ter criado uma prova que ainda ninguém pensou” para contornar a tese da Grande Naturalização (quando, na verdade, foram estudos coletivos – publicados na Insieme, inclusive – que apontaram para esta possibilidade), “ter processos que não são recorridos por causa do diferencial na prática” (quando, na verdade, estima-se que 10 a 20% dos processos são recorridos de forma totalmente aleatória pelo Ministero dell’Interno, sem que o Ministério faça quaisquer considerações mais apuradas acerca do próprio caso concreto), dentre outras mentiras ordinariamente contadas.

A prática forense em matéria de cidadania italiana tornou-se, infelizmente, um livre, desonesto e desordenado mercado, em detrimento de todos nós, ítalo-descendentes, que ficamos à míngua de informações fidedignas e oriundas do esforço ético de melhor informar, com base em fatos concretos e mensuráveis, fundamentados na ciência jurídica.

É sempre bom lembrar que cabe a nós, os interessados, buscar a prestação ética dos serviços advocatícios, somente contratando profissionais que respeitam os códigos deontológicos e questionando os outros, quando for o caso, a respeito de suas próprias condutas.

Ademais, é necessário conhecer os canais de denúncia, tanto junto às diversas Seccionais da Ordem dos Advogados no Brasil, quanto junto às Ordine degli Avvocati italianas, pois, sem denúncias torna-se impossível o controle das práticas inescrupulosas de profissionais desviantes da ética.

No próximo número, em matéria especial dedicada ao ‘julgamento do século’ (na Corte Suprema di Cassazione, audiência prevista para 12/07), trataremos do vetusto julgado de 1907, da Corte di Napoli que, conforme sabemos, tem sustentado as decisões favoráveis dos juízes singulares do Tribunale Ordinario di Roma. Até lá!