Nino Botter, em imagem de setembro de 2010. (Foto Desiderio Peron / Arquivo Insieme)

Foi enterrado hoje, no final da tarde, o corpo do imigrante italiano Sante Serafino Botter, falecido na última madrugada vítima de um AVC. O corpo de “Nino” repousa no Cemitério Parque Iguaçu, onde aconteceu a despedida dos familiares e de um punhado de amigos. Ele deixa três filhos, seis netos e seis bisnetos e um livro com suas memórias, escrito de próprio punho e publicado em 2017, intitulado “Memórias de um Imigrante”, bilingue.

Nino Botter completaria 99 anos em 1º de novembro próximo, e já se preparava para comemorar o centenário de nascimento. Natural de Castelli di Monfumo, província vêneta de Treviso, na Itália, havia perdido a esposa Resi em 2013, naquela que ele próprio considerou “a prova mais difícil que Deus me deu”, “depois de quase 60 anos de felicidade”.

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De empregado a empresário (foi o proprietário da antiga Cerâmica Klemtz, cuja área foi desapropriada para a barragem do Passaúna), Nino foi o último dos “Três Mosqueteiros” que formaram a capa da edição 142 (outubro de 2010) da revista Insieme, ao lado de Giuseppe Athos Vallicelli e Gian Luigi Corso. Embora em frentes ideologicamente confrontantes, eles lutaram durante a II Guerra Mundial e acabaram se encontrando em Curitiba, para onde imigraram em tempos também diferentes.

Reprodução da capa do livro de memórias de Sante Serafino Botter, Editado por SOMMO Editora Ltda.

De trato afável, empático e discreto, Sante Serafino Botter era o filho caçula de uma família com cinco irmãos que, depois do período de guerra (alguns batalharam também na I Guerra), decidiu imigrar para outros países em busca de uma melhor condição de vida, que não se encontrava mais em seu país. Primeiro foi para a Bélgica, passou pela Holanda e, depois de retornar à Italia, decidiu imigrar para outro continente, chegando ao Brasil.

“Encarou – como consta da apresentação de seu livro de memórias – os desafios de se adaptar a uma nova cultura, pois acreditava ser a melhor opção para buscar o sustento e ajudar sua família. Com muito trabalho, honestidade e um sorriso no rosto conquistou tudo que havia planejado”Enquanto pôde, todos os dias “Nino” ia para sua chácara, onde plantava e colhia frutas e verduras para proporcionar a seus descendentes e à instituições de caridade, entre elas o Pequeno Cotolengo, que inclusive ajudou a construir, doando material de construção.

Mesmo tendo vivido mais de 72 anos no Brasil, “Nino” morreu italiano: “Devido às leis brasileiras não obrigarem a naturalização, eu sempre quis manter a nacionalidade italiana. Minha esposa, minhas filhas e também meus netos possuem a dupla nacionalidade, italiana e brasileira. Todos têm orgulho da dupla cidadania e eu fico muito feliz. Eu nunca consegui e não fiz questão de perder o sotaque. Todo mundo acha uma coisa adorável, pois guarda o passado de uma pessoa, que é a sua história”, confessa ele em suas memórias.

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Em sua vida, foi condecorado com a “Cruz de Guerra”, medalha de bronze de valor militar, “Cruz de Cavalheiro de República Italiana” e a medalha de ouro como “Trabalhador Italiano no Mundo”, da Câmara de Comércio de Treviso. Em 2016 ele recebeu também a “Medaglia della Liberazione”, concedida pelo Ministério da Defesa do governo italiano por ocasião do 70º aniversário da luta pela libertação.

Reprodução da capa da edição 142 da Revista Insieme.

Em sua epopeia imigratória, antes de estabelecer-se em Curitiba, Nino viveu em Joinville-SC e em Irati, no interior do Paraná. Mais confissões: “Eu tenho certeza de nunca ter enganado ninguém. Porém, fui enganado muitas vezes. Nunca tive nenhum vício: álcool, fumo, jogo e drogas. Sempre respeitei as ideias dos outros e posso também garantir que nunca fiquei feliz com a infelicidade dos outros. Trabalhei muito, demais! Até agora, ainda trabalho e não consigo parar! Tendo saúde, assim será até o fim da minha vida! Peço ao bom Deus que os meus descendentes sigam os bons exemplos para merecerem a sua benção!”.

“Nino” Botter, durante muitos anos, foi diretor do Centro Cultural Ítalo-Brasileiro Dante Alighieri, de Curitiba. Participava também, sempre ativamente até que pôde, dos encontros das quartas-feiras, constituído por imigrantes desde suas chegadas em Curitiba – hoje já com poucos integrantes originais.