O advogado Luis Molossi, coordenador do Maie no Brasil (Foto Desiderio Peron / Arquivo Insieme).

Os eleitos no exterior para o Parlamento italiano “deveriam ser a nossa voz e não a dos seus partidos ou de seus próprios interesses”, disse o coordenador geral do Maie – Movimento Associativo Italiani all’Estero no Brasil, Luis Molossi, ao comentar matéria divulgada pelo portal Insieme sobre a classificação de desempenho dos parlamentares italianos, que coloca o deputado Fabio Porta (PD) em terceiro lugar dentre os 630 colegas no quesito ‘produtividade’.

Sem falar em nomes, mas evidentemente na defesa do deputado ítalo-argentino Ricardo Merlo (presidente do Maie), que ficou na 480ª posição no mesmo quesito, registrando menos de 12% de comparecimento nas sessões, Molossi observou: “Quando se vota sistematicamente a favor do governo, até mesmo naquilo que penaliza ainda mais os italianos no exterior em suas necessidades, como conhecemos muito bem, não nos parece [haver, nr] motivo para festa”. É pública e notória a divergência entre Porta e Merlo sobre diversas questões de interesse dos ítalo-sulamericanos.

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Molossi não economiza críticas quando o tema é a taxa dos 300 euros, desde meados de 2014 cobrada para o reconhecimento da cidadania “iure sanguinis”, que foi aprovada pelo Parlamento, sob regime de ‘fiducia‘, isto é, sem possibilidade de alteração no texto geral em apreço). E também aqui Molossi não nomina os parlamentares que critica, enquanto observa o “desmantelamento progressivo da rede consular”. Ele, que foi o primeiro não eleito da América do Sul durante as últimas eleições, em 2013, lamenta que não haja “uma força conjunta dos eleitos, que deveriam se unir para combater estas medidas” mas, “ao contrário, devem votar pela lógica do partido e, então, “produtivamente”, votam contra os seus próprios eleitores quando aprovam cortes sucessivos nos recursos para a língua italiana, por exemplo”.

Para explicar como recebeu o resultado sobre os índices de produtividade parlamentar divulgados pela conceituada associação italiana ‘Openpolis’, Molossi ironizou, contando o que disse em sala de aula um professor seu de Direito:  “Se forem trabalhar no meu escritório, terei muitas ressalvas com os “caxias” demais”.

Como recebeu o resultado sobre os índices de produtividade dos parlamentares italianos da América do Sul? Temos desde o terceiro lugar até quase os últimos…

Quando era estudante no primeiro ano na Faculdade de Direito, o professor de Direito Civil, hoje desembargador no TJ/PR, após alguns questionamentos de quanto estudo teríamos que ter para sermos bons advogados, nos disse sem nenhuma cerimônia: se forem trabalhar no meu escritório, terei muitas ressalvas com os “caxias” demais, que assistem todas as aulas, que estudam demais a teoria, que tiram notas altas, mas não sabem resolver questões práticas de como atender bem um cliente, conduzir uma audiência com inteligência e organizar bem as práticas do escritório. De nada adianta produzir uma defesa magnífica e protocolar no dia seguinte ao prazo. Enfim, prefiro estudantes com notas medianas, mas que tenham estas outras qualidades também, especialmente inteligência emocional, que determinam a formação de um profissional equilibrado e que saiba agir quando necessário.

O fato de morar longe da sede do Parlamento – o lugar da luta parlamentar por excelência – justifica o “estar em viagem” tão frequentemente de alguns? Ser ausente a mais da metade das sessões é defensável?

Isso quer dizer que estar presente em quase todas as sessões do Parlamento seja negativo? Absolutamente não. Mas, esta presença é efetiva produtividade, especialmente para os eleitores do Brasil? Quando se vota sistematicamente a favor do governo, até mesmo naquilo que penaliza ainda mais os italianos no exterior em suas necessidades, como conhecemos muito bem, não nos parece motivo para festa. Uma conclusão óbvia – e preocupante para os italianos no exterior – é que os campeões de presenças nas sessões, de qualquer importância, estão efetivamente residindo em Roma, o que não é errado, mas complica e muito a representatividade e presença territorial que deve ser exercida plenamente.

Líderes de partido são requisitados para muitos compromissos e, como bem diz o artigo publicado na Revista Insieme, o levantamento “não leva em consideração o trabalho, ainda que relevante, que alguns parlamentares desenvolvem em cargos necessários ao funcionamento da máquina política e administrativa do Parlamento, como comissões, grupos e outros.”

Mais de uma vez citei o exemplo do Pier Luigi Bersani que, enquanto líder do PD não era nenhum pouco assíduo no Parlamento, enquanto deputado eleito.

Desde que iniciamos a eleger parlamentares no exterior, só pioraram as coisas: as filas da cidadania continuam; os consulados têm cada vez menos funcionários; estamos sendo até constrangidos a pagar 300 euros para o reconhecimento de um direito de sangue… A que servem e a que deveriam servir tais parlamentares?

Esta deveria ser a “verdadeira” produtividade, não aquela do levantamento “OpenParlamento/OpenPolis” tão comemorado. O que fizeram até agora a este respeito? De concreto, uma nova taxa de Eu$ 300,00.

Na esteira de tudo isso, enfraqueceram-se o CGIE e os Comites, que sequer conseguiram até aqui dizer a que vieram e o que fazem exatamente. As propaladas mudanças ficaram para as calendas. Considera isto um erro? Se sim, quem está errando?

Escrevi na Insieme 216, jan/fev 2017, que, “com toda a ebulição política que vimos nos últimos meses, com o referendum constitucional, cujo resultado foi de 60% pelo ‘Não’ e que determinou o fim do Governo Renzi, a nova tentativa de Governo PD, com Paolo Gentiloni no comando e as prováveis novas eleições parlamentares que se avizinham, com ou sem nova lei eleitoral, as reformas dos Comites e CGIE podem e devem acompanhar este período de transição, de efetiva crise política para se reinventar e manter o firme propósito de bem representar o cidadão italiano residente no exterior. Aos novos conselheiros eleitos está posto o desafio. E que não fique no velho jargão que ´tudo se reforma para ficar como está. (Il Gattopardo – Giuseppe Tomasi di Lampedusa).”

Depois do regime fascista, que desenvolvera uma política voltada aos italianos no mundo, tivemos até um Ministro para os Italianos no mundo… mas, enquanto se fecham escolas de língua italiana, não se vislumbra uma política consistente e perene voltada a esta outra Itália. Acredita mesmo que devemos continuar com esse modelo?

Ainda acredito no sonho do Ministro Tremaglia, quando, depois de anos de luta de muitos abnegados – alguns já mortos e esquecidos – nos deu esta oportunidade inédita no mundo de eleger diretamente representantes no Parlamento (seis na América do Sul: quatro deputados e dois senadores) e que deveriam ser a nossa voz e não a dos seus partidos ou de seus próprios interesses. Claro que são poucos e existe uma crise econômica interminável, que determina os cortes orçamentários do governo. Mas, não há uma força conjunta dos eleitos no exterior, que deveriam se unir para combater estas medidas. Ao contrário, devem votar pela lógica do partido e, então, “produtivamente”, votam contra os seus próprios eleitores quando aprovam cortes sucessivos nos recursos para a língua italiana, por exemplo.

E o que falar do desmantelamento progressivo da rede consular e os seus serviços cada vez mais difíceis para chegar ao cidadão comum, como a interminável fila da cidadania e a loteria da agenda do passaporte? Como insistimos diariamente, o consulado deveria ser a casa do cidadão italiano, com atendimento acolhedor e eficiente. Basta verificar os recursos que estão sendo arrecadados desde julho de 2014, com a taxa da cidadania (25 milhões de euros por ano em todo o mundo), para se constatar que é uma atividade altamente rentável. Só os responsáveis pelas políticas a nós destinadas é que nos vêem e nos tratam como cidadãos de série “B”, mesmo com esta verdadeira exploração.

Estamos na iminência de novas eleições políticas. E existe muita desilusão no ar. O que há de sincero e de eleitoreiro no discurso de cada um de nossos representantes?

Eu milito nesta área desde 2004, quando participei pela primeira vez da eleição para o Comites PR/SC. São 13 longos anos de intenso trabalho, muitas alegrias, realizações e muitas frustrações também. Mas, na falta de recursos (política jamais deveria ser medida pela força do dinheiro), o voluntariado tem sido a arma da grande maioria das pessoas que conheço, que fazem um ótimo trabalho neste setor e que, invariavelmente nos apoiam quando apresentamos um bom projeto. E não exigem nada, apenas serem ouvidas e prestigiadas nas suas ideias.

Mas, a política também tem seu lado perverso, da ocupação de espaço por figuras que aparecem na véspera e, de repente, despejam toda uma estrutura político-partidária e muitos recursos financeiros para alcançar a cadeira tão almejada e que deveria ser do cidadão e não do postulante.

Preparem-se para os próximos e endinheirados “candidatos” que já estão circulando pelo Brasil e até em Roma! Dos atuais representantes, gostaria que eles mesmos mostrassem o que fizeram em ações concretas aqui no Brasil, resultados práticos a nosso favor nestes últimos quatro anos. Nada de produtividade de planilha de comparecimento!