Documento emitido com data de ontem (23/02/2021) pelo ‘comune’ italiano de Arezzo certifica que a cidadania italiana de José Laurentino Gomes continua plenamente válida e nunca foi cassada, contrariando alegação do Consulado Geral da Itália em Curitiba ao negar o passaporte para a esposa do premiado escritor e jornalista. O documento – um ‘Certificato di Cittadinanza’ – traz a assinatura da “Ufficiale di anagrafe” Silvia Stocchi, e tem por base legal os dados constantes do quanto está registrado no ‘comune’ de Brusciano, local onde, em 2016, o escritor teve assentados os dados que o fazem “possuidor da cidadania italiana”.
A cassação da cidadania de Laurentino foi matéria de capa da edição número 249 da Revista Insieme, no início do ano passado, onde ele narra que o passaporte de sua esposa, naturalizada cidadã italiana por matrimônio, foi negado pelo consulado italiano em Curitiba sob a alegação de que a cidadania do marido fora cancelada. Inconformado com a notícia transmitida pelo consulado por e-mail, ele entrou com processo judicial em Roma, com previsão de julgamento para o final do ano, mas, diante da informação recente em suas mãos, aguarda um pronunciamento da autoridade consular.
“Não sou um criminoso nem delinquente, não enganei ninguém e espero que o Estado italiano me trate como cidadão que tem direitos, que merece ser levado em conta”, disse hoje Laurentino em telentrevista ao editor de Insieme.
O escritor tem filhas residindo na Itália e na Alemanha para onde, além de inúmeros países onde realiza suas pesquisas, viaja constantemente usando o passaporte Italiano sem problemas, mesmo após a notícia do cancelamento de sua cidadania. “Tudo isso é muito estranho: de um lado eu sou reconhecido pelo serviço de imigração, inclusive da própria Itália onde estive recentemente antes da pandemia, mas o Consulado de Curitiba diz que não. Uma situação absurda”, considera o escritor paranaense que atualmente reside em Itú-SP.
Ele deposita muita esperança na possibilidade de o atual cônsul [Salvatore Di Venezia] esclarecer essa questão, mesmo antes do desfecho do processo judicial em Roma. Antes da entrevista, o editor de Insieme encaminhara a Di Venezia uma solicitação de pronunciamento sobre o caso, anexando uma cópia do “Certificado de Cidadania” do escritor. “Vou pegar informações a respeito e me comunico com você”, respondeu incontinenti, ainda ontem, o Cônsul Geral da Itália em Curitiba.
O autor de “Escravidão” disse que, apesar do desgaste e dos gastos que a situação está lhe impondo para a manutenção de seus direitos (soma que, segundo seus cálculos já ultrapassa, no total, a casa dos 100 mil reais), não guarda mágoas da Itália. “Não me considero prejudicado pelo Estado italiano, como instituição”- disse -; “acho que foi um ponto de vista unilateral de um cônsul [à época era cônsul em Curitiba Raffaele Festa – NR], com um ponto de vista muito rígido, intolerante no exercício de suas funções, e acredito que as instituições mudam também de acordo com as pessoas que estão à frente”.
Laurentino diz ter ouvido referências muito boas sobre o atual cônsul, mais disposto ao diálogo com os jurisdicionados. Por isso está confiante que, com sua cidadania em ordem, também o passaporte de sua esposa venha a ser emitido. “Estou muito otimista, acho que tudo se corrige nessa vida. Mas até tem uma coisa de sentimento pessoal: me lembro da alegria com que sobrevoei a Itália vindo para o Brasil quando obtive o reconhecimento da cidadania. Eu dizia: meu pequeno-grande país, que beleza tem aqui! E eu não gostaria de voltar à Itália no futuro com o coração amargurado. Isso seria muito triste. Eu quero manter aquela alegria, a gratidão do momento em que eu tive a minha cidadania reconhecida e acho que isso vai acontecer”.
No vídeo-entrevista que acompanha essa matéria, José Laurentino Gomes narra em detalhes todos os fatos acontecidos desde que iniciou a busca pelo reconhecimento de sua cidadania, de seus filhos e esposa. E explica também sobre o conteúdo de suas pesquisas para o terceiro volume da trilogia “Escravidão”, que abordará aspectos da imigração europeia – a italiana principalmente – dentro do processo de ‘branqueamento’ da população brasileira. Laurentino é membro titular do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e da Academia Paranaense de Letras.