Obter o documento de viagem, ou passaporte, junto aos consulados italianos que operam no Brasil tem sido um drama para milhares de pessoas nos últimos tempos. Sem uma estrutura capaz de fazer frente à demanda, os serviços prestados deixam a desejar e, em função disso, cresce o volume de reclamações que começam com as dificuldades de agendamento, passam por um sistema impessoal de atendimento e vão até o tratamento final dispensado aos que conseguem um lugar na fila para obter o documento após períodos de espera que podem superar um ano.

O volume de reclamações que circulam pelas redes sociais é enorme. E também os que chegam à redação de Insieme, muitas vezes até de fora do País. Para superar o problema, cada consulado tem procurado estabelecer critérios diferentes, ora criando filas preferenciais, ora alterando o sistema de agendamento que, do sistema ‘Prenota Online’, pode saltar ao uso do WhatsApp, como em São Paulo, na tentativa de fugir dos serviços particulares que, quase misteriosamente (há quem diga criminosamente), conseguem driblar a barreira informática.

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O problema, já bastante antigo, chegou a levar o senador Ricardo Merlo, subsecretário para os italianos no mundo da Farnesina (Ministério das Relações Exteriores), a colocar seu e-mail à disposição: “Se vocês forem maltratados num consulado, mandem um e-mail a ricardo.merlo@senato.it”, dizia ele em vídeo, no começo do ano, exorcizando a iniciativa de filas preferenciais aos chamados “italianos natos”. Isso também motivou a implantação de serviços descentralizados para a captação de dados biométricos em cidades distantes das sedes consulares em diversos Estados.

Dentre tantas reclamações, destacamos uma que nos chegou em forma de denúncia e serve bem para demonstrar o grau de tensão em que se situam as coisas, pelo menos no Consulado Geral da Itália em Curitiba – um dos campeões de críticas: uma gravação de um cidadão (cujo nome mantemos em reserva por motivos óbvios) que havia perdido a data agendada devido a seu trabalho, mas precisava do passaporte em função de suas viagens também a trabalho. Na gravação, a secretária do consulado, senhora Rita Bernardini, é clara e repetitiva ao dizer que transmitia ordens do cônsul Raffaele Festa: “Se o senhor quiser seu passaporte, se retrate”, isto é, retire sua queixa.

É que, segundo se infere do próprio conteúdo do vídeo, o cidadão italiano havia reclamado do atendimento consular recebido em conversas anteriores, diretamente ao Embaixador da Itália. Ao tentar re-agendar o atendimento por telefone, ele se depara com a insólita exigência (“se o senhor se retratar, nós pensaremos em fazer-lhe o passaporte”) e diz: “Então a senhora está fazendo uma ameaça”.

No curso do diálogo áspero travado às vezes no atropelo, a secretária sugere ao cidadão que ele escreva outra vez ao cônsul, mas recebe como resposta a informação de que a autoridade costuma não responder e faz um desafio: realizem uma pesquisa para saber o que pensam as pessoas: “Quando digo que vocês são mal-educados, não sou eu. Faça uma pesquisa em Curitiba sobre o cônsul, sobre o que pensam as pessoas. Todos dizem que vocês são mal-educados. Me desculpe”, desabafa ele no áudio que chegou à redação de Insieme sem precisar datas.

O editor de Insieme tentou obter explicações do cônsul Raffaele Festa, e também de sua secretária, mas ambos não deram resposta ao e-mail enviado nos seguintes termos: “Embora o senhor tenha preferido, sistematicamente, não responder às indagações deste jornalista, volto com outra: tenho aqui informação que sua secretária, dizendo agir sob seu mando, ordena que um cidadão se retrate de queixas realizadas quanto ao atendimento recebido no consulado, caso contrário não lhe será concedido o passaporte solicitado. A natureza da matéria entra no perfil de inúmeras queixas recebidas contra o atendimento dispensado às pessoas neste Consulado. Entretanto, antes de publicá-la, pergunto se o senhor, ou sua secretária, tem algo a declarar sobre orientações desse tipo”.