Print da página retirada do site do Consulado Geral da Itália em SP que vinha sendo objeto de críticas. (Reprodução)

Os consulados da Itália em São Paulo e Curitiba cederam às críticas e retiraram de seus sites a literatura sobre o “Canale rapido figli diretti”, que privilegiava no atendimento os filhos de cidadãos nascidos em território italiano, mas pelo menos o de São Paulo continua sob fogo cruzado devido a outras exigências “praeter legem” que dificultam a vida dos requerentes de reconhecimento da cidadania italiana por direito de sangue. Agora o alvo é a exigência da apresentação obrigatória para cada requerente de documentos comuns a integrantes diversos de uma mesma família, mesmo se já existentes nos arquivos dos consulados.

“Aguardamos que seja retirado outro absurdo que faz o cidadão gastar dinheiro e perder tempo nos casos de anexação [de documentos]”, escreveu em seu perfil do Facebook o deputado ítalo-brasileiro Luis Roberto Lorenzato, ao agradecer publicamente o cônsul geral da Itália em São Paulo, Felippo La Rosa, por ter atendido um de seus pedidos realizados por carta há cerca de um mês. No site de ambos os consulados, entretanto, ainda remanesciam, no final da tarde de hoje, referências ao serviço em tese extinto.

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A exigência de documentos em duplicata “é protelatório – diz Lorenzato – pois os documentos que estão no consulado devem ser transcritos na Itália! Isso é um descaso conosco que já pagamos 300 euros por pessoas”. “Funcionários do consulado não podem pegar a pasta da “pratica” (processo) da família no Arquivo?”, pergunta o parlamentar.

O presidente do Comites – ‘Comitato degli Italiani all’Estero’ do Recife, Daniel Taddone, diz que há consulados que exageram na dose: Belo Horizonte, por exemplo, pede, segundo ele, “documentos originais idênticos até mesmo para irmãos que se apresentam no mesmo dia. Primos, então, nem pensar…”. “Eles querem que cada pessoa apresente tudo igual em original”, “querem tudo em original, até mesmo as certidões italianas, para as quais bastaria uma cópia simples tirada na impressora de casa”, completa Taddone.

A denúncia de discriminação através de um canal preferencial para filhos de italianos nascidos na Itália foi apresentada na reunião do “Sistema Itália” no Rio de Janeiro, realizada no começo de dezembro último, por Taddone, na presença de Lorenzato e também do senador Ricardo Merlo. Nada ocorreu, entretanto, antes de Taddone vir a público, através de uma vídeo-entrevista publicada no site de Insieme, enquanto o deputado Lorenzato dirigia carta ao cônsul La Rosa, também sem obter resposta.

O assunto passou a ser questionado também nas redes sociais, Lorenzato também veio a público cobrando uma providência, e assumiu dimensão a ponto de o subsecretário Ricardo Merlo, para os italianos no mundo, tratar dele durante encontro recente, em Roma, com o embaixador da Itália no Brasil, Antonio Bernardini, deixando clara sua posição completamente contrária à discriminação em curso e definindo-a como uma “gravíssima discriminação.

A retirada, entre ontem à noite e hoje pela manhã, do aviso sobre o “Canale rapido” dos sites dos dois consulados, imediatamente repercutiu nas redes sociais, onde muitos internautas manifestam alívio e outros, preocupações. Em função de dúvidas e também críticas, Taddone veio outra vez a público para dizer que “igualdade perante a lei não se negocia, não se transige e não se condiciona”.

“Após ter obtido uma grande vitória com o fim da discriminação cometida por consulados ao diferenciar a prestação de serviços entre nascidos na Itália e nascidos no exterior – escreveu Taddone em postagem no Facebook -, leio uma série de críticas que me deixam absolutamente chocado. Portanto, vou dizer algumas coisas aqui em oito tópicos.” E enumera:

1) A discriminação feita por alguns consulados em que filhos de “italianos nascidos na Itália” tinham um canal preferencial para o reconhecimento da cidadania italiana é absolutamente intolerável e inacreditável.

2) Nós, como cidadãos italianos nascidos fora da Itália, jamais poderemos permitir que consulados oficializem políticas de prestação de serviço que diferenciem cidadãos nascidos na Itália e cidadãos nascidos no exterior.

3) Os consulados não nos oferecem ‘regali’ (presentes)! Os consulados devem cumprir a lei. ‘Punto e basta’. Consulado não concede benefícios, consulado cumpre o que determina a lei. Parem de uma vez por todas de se contentar com ‘briciole’ (migalhas)!

4) Não tenham medo de funcionários consulares se a lei está a seu lado. Qualquer incumprimento da lei e abuso deve ser denunciado.

5) O fim da discriminação no ‘Canal filhos diretos’ visava apenas a igualar filhos de italianos nascidos na Itália ou fora dela. O fato de os consulados terem retirado de seus websites as informações não quer dizer que o canal será abolido para todo o sempre. Solicitaremos que seja reformulado para que respeite os preceitos constitucionais.

6) Não caiam na ilusão e na falácia de que o canal ‘Filhos diretos’ diminui a fila daqueles que devem esperar anos e anos (netos, bisnetos etc.). Isso simplesmente não ocorre. O fluxo de demanda é outro e na verdade apenas se retira um recurso humano para resolver a fila geral para tratar de uma fila de privilegiados.

7) Fui funcionário consular. Fiz centenas (talvez milhares, pois nunca contei) de reconhecimentos de cidadania. Fiz reconhecimentos com uma geração e com quatro gerações. Sabe qual é a diferença de tempo entre um e outro? Sendo generoso, talvez 10 minutos. É outra ilusão achar que os pedidos de reconhecimento de filhos maiores é diferente de netos ou bisnetos.

8) Peço pelo amor de Deus que tenham brio e entendam que vocês são cidadãos italianos natos. Não aceitem ser tratados como cidadãos de série B. Com desrespeito a um princípio básico da Constituição não se transige, não se aceita em nenhuma hipótese. Discriminação nunca é algo positivo. Igualdade é um bem inegociável.”

Já o deputado Luis Roberto Lorenzato, além de um vídeo, também escreveu, logo no início da manhã, em seu perfil sobre “Uma boa notícia” para dizer que “O Consulado de São Paulo acabou de me informar que retiram do site a questão dos ‘Figli Diretti’ – filhos diretos de pais nascidos no território da Itália que eram tratados com preferência e sem ficar nas filas conosco!”. E prosseguiu:

Publicado por Vote pela Cidadania Italiana em Quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

“Agora aguardamos que seja retirado outro absurdo que faz o cidadão gastar dinheiro e perder tempo nos casos de anexação! Isso é protelatório pois os documentos que estão no consulado devem ser transcritos na Itália! Isso é um descaso conosco pois já pagamos 300 euros por pessoas e funcionários do consulado não podem pegar a pasta “pratica” da família no Arquivo? Vamos exigir respeito! Estamos pagando!”

O deputado citou a exigência contida no site do Consulado de São Paulo: “3. PROCESSOS NOS AUTOS DO CONSULADO – Para os pedidos de reconhecimento da cidadania italiana, os requerentes deverão apresentar toda a documentação prescrita, incluindo a certidão de nascimento original do antepassado italiano imigrante e eventuais certidões de seus descendentes. Não é possível assegurar uma atividade de consulta para a busca e localização de certidões que possam estar entre os documentos arquivados junto a este Consulado, nos processos de parentes que já obtiveram o reconhecimento da cidadania”.