O ex-deputado Fabio Porta e candidato ao Senado nas últimas eleições italianas confirmou a Insieme, nesta manhã, a apresentação de queixa contra a chapa argentina da Usei – ‘Unione Sudamericana Emigrati Italiani’, colocando sob suspeita milhares de votos atribuídos a seu concorrente Adriano Cario, em diversas urnas de Buenos Aires.
A queixa foi apresentada ainda durante o processo de apuração e divulgação oficial do pleito que elegeu senadores o ex-deputado Ricardo Merlo (Maie) e Adriano Cairo (Usei), ambos da Argentina, e deputados os também ítalo-argentinos Mario Borghese (Maie) e Eugenio Sangregorio (Usei), e os ítalo-brasileiros Fausto Longo (PD) e Luis Roberto Lorenzato (Lega). Dependendo do rumo das investigações, disse Porta, será oferecida denúncia penal.
O caso já ontem ganhou as páginas do jornal “Ambito Financeiro” que falava em “irregularidades graves” na eleição por correspondência para o Parlamento italiano na Argentina. O jornal alude a “10.000 votos que não são coerentes com o resto das urnas, num caso totalmente anômalo”. Segundo Porta, esse número pode ser bem maior. Entretanto, isso nada tem a ver com a lentidão apresentada na atualização de resultados, a partir de ontem de manhã, pelo site do Ministério do Interior italiano.
Para Porta, “precisa investigar” pois a “evidência do que aconteceu é muito grave” e, segundo ele, deve ter havido “a cumplicidade do pessoal dos correios. Não sei em que nível, se do [envolvimento] de carteiros, mas com esses números não seria questão de carteiros, mas seria mais acima”. A queixa foi apresentada perante o serviço central para a Circunscrição Eleitoral do Exterior junto à “Corte di Appello” de Roma.
Insieme procurou ouvir o outro lado, isto é, de representante da Usei, que assim respondeu: “Sobre os comentários de fraudes, diz-se sempre o mesmo em todas as eleições. Entretanto, além de obter a maioria dos votos de Sangregorio, nós fizemos uma campanha porta a porta nos quarteirões da periferia de Buenos Aires, sem fazer muita publicidade nas mídias”, pois “aquela estratégia já tinha sido empregada por Sangregorio”
Na entrevista exclusiva que concedeu a Insieme na manhã de hoje, Fabio Porta, além de fazer uma análise das eleições e de sua própria candidatura, conta como e porque seu partido apresentou a queixa, ponto de partida para uma eventual ação penal.
O que aconteceu na Argentina?
Este episódio da Argentina é bastante grave. Não confio muito nas hipóteses de recontagem ou de suspensão. Com o pouco de experiência que tenho, sei que essas coisas levam tempo e podem não ter solução concreta senão depois do final deste mandato. Mas é também uma questão de princípios. Precisa investigar. A evidência do que aconteceu é muito grave e denuncia um tipo de influência externa nas eleições, principalmente em Buenos Aires, porque tem muitas seções eleitorais com dados fora da média das demais.
Quando você acompanha a apuração, você vê: A Usei está neste patamar, o Maie está noutro e os demais… pelo menos dentro da mesma circunscrição consular ou dentro do mesmo país. E depois aparecem 10 ou 15 seções eleitorais onde você vê que o dado passa de 100 para 700; de 80 para 800 e isso se repete de uma forma… é claro que são votos que, com muita probabilidade nem chegaram nas mãos dos eleitores; foram pegos em outras maneiras, pelos correios ou… isso o voto por correspondência infelizmente apresenta esta falha que é quase impossível eliminar e controlar. Quando isso acontece em forma pequena, digamos fisiológica, não interfere no resultado. Mas quando a “fisiologia” se transforma em “patologia”, aí altera o resultado final”.
Como isso poderia acontecer, com o envolvimento do pessoal do correio?
Penso que sim. Infelizmente, o pessoal dos correios na Argentina, não sei a que níveis… em situações como a Argentina, onde temos centenas de milhares de cédulas, [o processo] é facilmente exposto a este tipo de situações. Acredito que isso só pode acontecer com a cumplicidade do pessoal dos correios. Não sei em que nível, se do [envolvimento] de carteiros, mas com esses números não seria questão de carteiros, mas seria mais acima, sem dúvida.
O material eleitoral seria o mesmo, original, com os “tagliando” que identificam os eleitores… como isso?
Na verdade eu já pedi para o Consulado de Buenos Aires, para a Embaixada e para o Ministério do Exterior para deixar todas as informações à disposição para uma investigação. Porque o que acontece? O Consulado tem toda a rastreabilidade do voto que é exatamente aquele código de barras no “tagliando” que identifica o eleitor; ele sabe se a cédula foi entregue ou não, quando foi a entrega, para quem, etc.
Agora, se nós vamos identificar 20 desses votos de Buenos Aires através desse “tagliando”, desse código do eleitor, e se o eleitor nunca recebeu esta cédula, se ele fizesse uma declaração de que a cédula não chegou na minha casa, eu não votei e o voto dele está lá, ou eleitor é falecido, enfim toda aquela situação… isso permitiria uma contra-prova, uma verificação de que isto que estamos denunciando tem fundamento e que não seria totalmente impossível.
Claro que isso é um processo um pouquinho complicado e demorado, nem sei se isso é possível realizar, mas nós vamos tentar ir atrás disso até porque nem só para alterar o resultado, mas são coisas graves, que aconteceram já várias vezes e infelizmente poderão se repetir. Quanto maiores são os números envolvidos, como no caso da Argentina, mais fácil é esta possibilidade.
Como funciona: o partido ofereceu denúncia perante a justiça italiana, é isso?
Não. Na realidade, ainda não é isso. O primeiro passo, ainda durante a operação de escrutínio, é fazer um ‘esposto’ [queixa), seria uma sinalização dessa situação irregular, anômala, à ‘Corte d’Appello’ que é, digamos, o tribunal, a entidade da justiça que está fazendo este trabalho de apuração e finalização do escrutínio. Fizemos apenas isso, que é a única coisa que se pode fazer nesse momento.
Outra coisa: já alertei o Ministério das Relações Exteriores, o Consulado e a Embaixada para uma eventual segunda etapa, que seria uma investigação por parte da Administração, mas essa parte vai precisar de uma denúncia mais de tipo penal, num segundo momento. Mas isso ainda não foi feito porque temos que esperar a finalização desse primeiro momento que é, justamente, a apuração de todos os dados. Então, para ser claro, ainda não tem uma denúncia formulada à Magistratura.
Essas urnas que faltam apurar, segundo o site do Ministério do Interior, seriam as suspeitas?
Não. Também não sei. Talvez não seja isso necessariamente. Pelo contrário. Porque estas urnas que estamos indicando foram já consideradas. O que está faltando pode decorrer de qualquer outro tipo de problema. Várias pessoas não conseguiram desenvolver seu trabalho porque faltava o presidente, faltava o pessoal escrutinador…. então pode ser que isso tenha sido feito depois por parte de pessoal do Município ou da própria ‘Corte d’Appello’.
Então o fato de estarem faltando algumas urnas ainda, isso não quer dizer que elas estejam ligadas ao problemas que indicamos. Notícias que circularam, como vi, que a suspensão está ligada à nossa denúncia, do meu lado, não procedem. Falei com o pessoal do nosso partido que cuida do caso e não há uma relação direta. É só um processo demorado que deve finalizar até amanhã ou depois de amanhã. Pode ser simplesmente que esteja faltando atas ou algum problema formal que não está permitindo a finalização do processo, mas não ligado à minha questão, isto é evidente.
Esse ‘esposto’ é um relatório, uma queixa?
É a formalização de uma queixa, exato! Uma queixa que já claramente indica uma coisa que deve ser avaliada com atenção. Que isso seja agora, nesta fase, ou que isso possa acontecer, na minha opinião, mais provável, num segundo momento, porque duvido que eles venham a fazer uma recontagem ou coisa assim, até porque os problemas realmente seriam de todo o voto no exterior e, nessas alturas, não sei se é isso que vai ser o resultado.
De qualquer forma é com base no resultado dessa análise inicial que vai ser avaliada a possibilidade de entrar com denúncia penal?
É, isso é possível que aconteça. Ainda não tomamos essa decisão e vamos ver qual vai ser a resposta e depois vamos decidir.
Um jornal argentino ontem falava em dez mil votos ‘anômalos’… Dez mil?
Ah, sim, sim. Penso que estamos nesta ordem, nesta faixa de dez mil para cima. Não estamos falando de poucos votos. Penso de dez mil para mais. Até porque você considera que a Usei teve 65 mil votos agora; em 2013 teve 45 mil. Destes 45 mil, mais da metade eram votos brasileiros do Pollastri e da Renata Bueno. Ou seja, na Argentina, a Usei tinha pouco mais de vinte mil votos. Passar de vinte mil para 65 mil é um salto que também não se justifica… e somente com presença em um país, porque eles não têm praticamente voto no resto da repartição. Então tem também esta evidência.