Como anunciado recentemente, o senador Fabio Porta (PD) comunicou à imprensa ter encaminhado aos ministros do Interior e das Relações Exteriores e Cooperação Internacional do governo italiano um pedido de informação sobre a orientação dada para o sobrestamento dos pedidos de reconhecimento da cidadania italiana ‘iure sanguinis’ apresentados por ítalo-brasileiros cujos ancestrais chegaram ao Brasil antes da chamada Grande Naturalização.
O senador pergunta se ambos os ministérios, cada um na área de sua competência, não estariam dispostos a mudar a orientação fornecida aos prefeitos e consulados, restabelecendo “o critério cronológico ordinário de análise dos processos, pelo menos até que o legislador – e somente ele – pretenda dar uma padronização diferente à matéria”.
Como se sabe, a orientação referida ocorreu logo após duas decisões da ‘Corte d’Appello’ terem acatado a tese da ‘Avvocatura dello Stato’, negando em grau de recurso a cidadania a ítalo-brasileiros. Na orientação fornecida ainda no ano passado, o Ministério do Interior desconsiderou decisões da mesma corte em sentido contrário e, em consequência dela, grande número de municípios italianos passaram a engavetar processos.
Sobre a mesma matéria, o também senador Ricardo Merlo (Maie) encaminhou pedido de informação ao Ministério do Interior. Anteriormente, ainda no ano passado, também o deputado Luis Lorenzato (Lega), interpelou sobre o mesmo assunto o Ministério das Relações Exteriores e está, segundo consta, sem resposta até hoje.
A interpelação de Fábio Porta coincide com a retomada no Parlamento, no final da semana que passou, da análise pela Comissão de Assuntos Constitucionais de um projeto de Lei com texto unificado para a mudança da lei da cidadania, atendendo à insistência de Enrico Letta, que é o secretário geral de seu partido. O texto unificado pretende introduzir o chamado ‘ius scholae’ e inclui também aspectos relacionados à limitação geracional na transmissão da cidadania por direito de sangue.
A seguir, publicamos o texto traduzido do pedido de informações feito (não há referência à data de entrega) pelo senador Fabio Porta e, também, de seu comunicado à imprensa, distribuído no começo da noite de domingo com data de hoje: “Pergunta para resposta oral na Comissão pelo senador Fabio Porta ao Ministro do Interior e ao Ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação Internacional
Dado que:
– O Ministério do Interior – Departamento de Liberdades Civis e Imigração, em 6 de outubro de 2021, enviou aos “Prefetti” e, por meio deles, aos prefeitos dos municípios italianos, uma circular sobre os pedidos de reconhecimento da cidadania italiana jure sanguinis apresentados por descendentes de italianos que emigraram para o Brasil na segunda metade do século XIX;
– Nesta circular faz-se referência a um trabalho de investigação complexo e coordenado entre o Ministério do Interior, o dos Negócios Estrangeiros e Cooperação Internacional e a Advocacia do Estado que teria levado a realçar os efeitos inovadores de duas sentenças proferidas pelo Tribunal de Recurso de Roma, que declara a perda tácita da cidadania italiana por compatriotas que residiam no Brasil no período da chamada Grande Naturalização Brasileira de 1889-1891, com conseqüente interrupção da linha de transmissão da cidadania aos descendentes;
– A partir destes pressupostos jurisprudenciais, a circular, paralelamente a indicações semelhantes prestadas pelo Mseci aos funcionários do estado civil que operam na rede consular no estrangeiro, decorrem consequências operacionais significativas para os interessados, uma vez que dispõe para sobrestar as práticas de reconhecimento da cidadania ‘jure sanguinis’, diante de um imprecisado aprofundamento jurisprudencial e de uma eventual decisão do Tribunal Constitucional, nos casos em que se alega descendência de italiano presente no Brasil no período da Grande Naturalização;
Dado que:
– É surpreendente a diligência com que, em fase de formação ainda inicial de orientação jurisprudencial e apenas alguns meses após a prolação de somente duas sentenças, decidiu-se fazer recair o resultado na ação administrativa, que deveria ter como requisito apenas o texto das leis vigentes e a prática interpretativa consolidada há décadas; uma diligência, aliás, não aplicada sobre casos muito mais claros e definidos, como, por exemplo, o da sentença n. 4.466, de 25 de fevereiro de 2009, pela qual a Suprema Corte de Cassação, também à luz de decisões anteriores da Corte Constitucional, reconheceu a condição de cidadão italiano também aos filhos de mulheres que perderam a cidadania após casamento com estrangeiros, ainda que com contrato anterior ao 1º de janeiro de 1948;
– A transferência ao plano administrativo do conteúdo dos recentes acórdãos da ‘Corte d’Apello’ de Roma, além de ser intempestiva e de dúbia correção nas relações entre os poderes do Estado, também corre o risco de ser descuidada devido à complexidade da matéria em discussão e à solidez das posições que emergem tanto na doutrina quanto em outros julgamentos, que levam a aceitar que a perda da cidadania italiana por força dos dispositivos ligados à chamada Grande Naturalização Brasileira só poderia ser concretizada com a aceitação efetiva e concreta de uma nova cidadania estrangeira, bem como na presença de vontade expressa de renúncia à cidadania de origem: condições que para quase todos os italianos residentes no Brasil naquele período não ocorreram;
– Os tempos de definição das práticas de reconhecimento de cidadania nos consulados sul-americanos, como se sabe, de fato já se estendem ao ponto de se duvidar da certeza do direito do cidadão de ter uma resposta em tempos certos da Administração Pública, de modo que uma indicação de sobrestamento pode significar concretamente a anulação de uma espera legítima;
Para saber:
– se os Ministros questionados, cada um na parte de sua competência, não pretendem retirar as indicações de sobrestamento dos pedidos de reconhecimento da cidadania italiana ‘jure sanguinis’, apresentados por descendentes de italianos que emigraram para o Brasil na segunda metade do século XIX, e restabelecer o critério cronológico ordinário de processamento dos processos, pelo menos até que o legislador – e somente ele – pretenda dar uma padronização diferente à matéria.