O ministro João Otávio Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, e o advogado Luiz Scarpelli (Foto Cedida)

Assegurando que pelas informações até aqui disponíveis “foram lesadas 5.000 famílias, num golpe já de 25 milhões de euros”, e que “estão sob suspeição outros 30.000 processos na Itália, num golpe que pode atingir 150 milhões de euros”, o advogado Luiz Scarpelli protocolou nesta última quinta-feira, em Brasília, cinco “peças técnico-jurídico-procedimentais” – como ele denomina – todas pedindo investigação sobre a atuação, no Brasil, da “já conhecida máfia da cidadania italiana”.

Ao ministro da Justiça, Sérgio Moro, o advogado mineiro com residência também em Roma pede a abertura de “inquérito policial judiciário” – segundo diz – “tendo em vista a possível prática, em tese” e “eventual”, de diversos crimes, que descreve como tráfico internacional de pessoas, tráfico internacional de drogas, corrupção ativa, corrupção passiva, e estelionato, além de falsificação de documentos públicos, falsidade ideológica, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

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Scarpelli, que há tempo vem enfrentando ácidas críticas em grupos de redes sociais que combate, diz que age “em nome próprio em defesa da honra, da moral, da imagem e dos direitos e interesses de milhões de famílias de cidadãos ítalo-descendentes residentes no Brasil e em vários países pelo mundo”, diante de “graves escândalos e fatos veiculados na imprensa brasileira e italiana nos últimos meses, envolvendo a já conhecida máfia da cidadania italiana, que opera e aplica golpes em série de forma sistemática e cotidiana, no Brasil e na Itália”.

A argumentação e alegadas provas colhidas ao longo dos últimos três anos, apresentadas em diversas instâncias dos três poderes da República, são basicamente as mesmas. Nelas se lê afirmações como a de que “conhecidos ‘assessores’ e ‘assessoras’ convencem pessoas a supostamente contratarem seus serviços de ‘coiotes’, para burlarem as leis de imigração no Brasil e na União Europeia”.

“Essa quadrilha – escreve ainda o requerente – conta com a colaboração de um braço no Brasil que monta pastas de documentos, inclusive falsas; e um braço na Itália, que simula possíveis processos ilegais de residência”.

Scarpelli descreve que a grande maioria das pessoas sequer chega a viajar para a Itália, “sendo que as que chegam a viajar, ficam apenas uma diária em um hotel, declarando que residem em endereços falsos e simulados providenciados pela suposta organização criminosa, tudo isso com ajuda de servidores públicos italianos corruptos que integram a possível quadrilha na Itália”.

O requerente cita o episódio de Ospedaletto Lodiggiano, cidade italiana onde, no início do ano passado, foram cancelados 1.188 processos de reconhecimento da cidadania italiana “iure sanguinis” e em cuja relação de nomes estava o atual governador de Minas Gerais, Romeu Zema. Cita também os casos de Siracusa (500 processos), Brusciano (500processos) Maddaloni (251 processos), Verbania e Novara (800 processos), e Val di Zoldo (1.600 processos sob suspeita).

Enquanto preparávamos esta matéria, chegava a notícia de que a polícia italiana acabara de “estourar” outro grupo em Todi, na Úmbria, envolvendo nove pessoas, entre eles um brasileiro residente em Terni. Entre 80 e 90 processos de cidadania teriam sido ali colocados sob suspeita e para as quais eram cobrados valores que iam de 7 a 10 mil euros. A notícia fala em cidadanias “iure sanguinis” para brasileiros, incluindo um jogador de futebol.

Pelos mesmos fatos, o requerente apresentou “notícia crime” à Procuradora Geral da República, Raquel Elias Ferreira Dodge, enquanto formulou “pedido de providências” ao presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro João Otavio de Noronha, com quem se entrevistou pessoalmente.

O senador mineiro Carlos Alberto Dias Viana com Scarpelli. (Foto cedida)

No Senado Federal, esteve com o senador mineiro Carlos Alberto Dias Viana (Solidariedade), pedindo “providências” para a “abertura da CPI da Máfia da Cidadania Italiana no Brasil”. Scarpelli protocolou documento também pedindo “providências” ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz pois, segundo diz, a questão envolve também advogados dos dois países.

“É possível – escreve Scarpelli em outro trecho de seus requerimentos – que nos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018 e até esse mês de abril de 2019, tenham sido feitos de forma supostamente ilícita na Itália, aproximadamente 15 mil processos de cidadania italiana, com base em corrupção ativa, tendo movimentado a máfia da cidadania italiana nesse possível golpe o montante de 75 milhões de euros”. Acrescenta ainda que algumas investigações realizadas na Itália foram concluídas com “a prisão de inúmeras pessoas envolvidas e cancelamento de milhares de processos de cidadania italiana, bem como condenação criminal na Itália (já transitada em julgado) de pessoas envolvidas com a suposta organização criminosa”.

A busca pelo reconhecimento da cidadania italiana “iure sanguinis” na Itália teve início quando começaram a se avolumar as chamadas “filas da cidadania” diante dos consulados italianos que operam no Brasil.