Renata Bueno diz que seu"campo de batalha" não é a rua. (Foto Desiderio Peron / Arquivo Revista Insieme)

“Eu não irei, simplesmente porque penso que a instância em que agora nossa batalha parlamentar deve ser levada não é a rua, mas apoio o gesto dos cidadãos, pois conheço, muito de perto, todas as frustrações a que são submetidos diariamente”. A posição é da deputada Renata Bueno (Usei – ‘Unione Sudamericana Emigrati Italiani’ – nr) em relação à manifestação que está sendo organizada para o próximo dia 12 de outubro – um feriado – diante do Consulado Geral da Itália em São Paulo, intitulada “300 euros: chega de desculpa, a fila da cidadania tem de andar!”

“Acho muito importante – disse Renata Bueno em resposta às perguntas que lhe foram dirigidas por Insieme no último dia 16 (a demora, segundo sua assessoria, é que a parlamentar, que casou recentemente, estaria em viagem de núpcias) – que os cidadãos italianos estejam se mobilizando de forma incisiva com a manifestação organizada pelo presidente do Comites [“Comitato degli Italiani all’Estero”– nr] de Recife e, atualmente, representante do partido Maie [‘Movimento Associativo Italiani all’Esteri’– nr] do Nordeste, Daniel Taddone, para reclamar dos serviços consulares e filas da cidadania”.

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A parlamentar que, de certa forma, inspirou o nascimento do protesto ao ter contestado parte de um pronunciamento seu por Taddone (“estamos cansados do armistício, queremos a guerra”) repetiu que continua “contrária à declaração de guerra”, mas que não considera guerra “a manifestação de desaprovação e indignação pelo tratamento destinado aos cidadãos italianos na América do Sul e, de forma particular, no Brasil”.

Ao justificar sua ausência no protesto do dia 12, a parlamentar repete praticamente a mesma linha adotada inicialmente pelo senador Fausto Longo, que, entretanto, na manhã de hoje, divulgou em vídeo em seu perfil no Facebook, convocando os cidadãos a protestarem contra os maus serviços consulares – um movimento que, segundo ele, fortalece a atividade parlamentar. Um abaixo assinado que circula na Internet pede a presença dos três parlamentares ítalo brasileiros no protesto diante do principal consulado italiano da América do Sul.

Depois de fazer uma exposição de suas ações parlamentares, a deputada Renata Bueno termina suas observações com o que chama de uma “mensagem positiva”, onde faz rápida análise de seu mandato, durante o qual, segundo ela, apoiou “muitas das propostas do PD [‘Partito Democratico’ – nr], mas não todas e, sobretudo, nunca de forma incondicional”, procurando, assim, manter-se “desvinculada” da “linha ditada pelo partido” na defesa dos interesses de seus representados.

Embora tenha sido “um dos governos que mais olhou para a América do Sul”, segundo Renata Bueno, “o PD no governo não cumpriu com o câmbio desejado e esperado por nós italianos no exterior, mas, ao meu ver, considerando todos os limites impostos pela crítica situação do País, apontou o caminho certo e já recolhemos alguns sinais desta intenção”.

Veja, na íntegra, o que diz a deputada Renata Bueno sobre a manifestação do dia 12:

“Acho muito importante que os cidadãos italianos estejam se mobilizando de forma incisiva com a manifestação organizada pelo presidente do Comites de Recife e, atualmente, representante do partido Maie do Nordeste, Daniel Taddone, para reclamar dos serviços consulares e filas da cidadania.

Sempre apoiei qualquer manifestação que visasse defender o respeito dos direitos e a eficiência dos serviços, dentro e fora do Parlamento: através de interrogações e intervenções parlamentares, mas também com outras ações, como a firma de uma petição popular cuja assinatura, como devem lembrar, me empenhei em promover.

Portanto, repito: sou contrária à declaração de guerra, mas não considero como tal a manifestação de desaprovação e indignação pelo tratamento destinado aos cidadãos italianos na América do Sul e, de forma particular, no Brasil. Eu não irei, simplesmente porque penso que a instância em que agora nossa batalha parlamentar deve ser levada não é a rua, mas apoio o gesto dos cidadãos, pois conheço, muito de perto, todas as frustrações a quem são submetidos diariamente.

Como cidadã ítalo-brasileira, já vivi direta e indiretamente muitos dos problemas das nossas comunidades, que em muitos casos, são parecidos com os das outras comunidades de nossa circunscrição. Como parlamentar representante destes oriundi continuei a me interessar pessoalmente neles, para poder levar as concretas necessidades do cidadão no Parlamento.

Conseguimos aprovar na Lei de Estabilidade, a emenda parlamentar que destinava 2 milhões para os consulados em 2016 e, pouco antes do recesso deste verão, conseguimos finalmente que 30% do valor arrecadado ficasse nos consulados de origem, embora ainda não tenha sido regulamentado. É muito menos do que o esperado, mas é um primeiro passo.

Nosso objetivo é encontrar soluções aos principais problemas que afetam a vida administrativa e real do cidadão, porque quando um direito não é de fato exercido, ele não existe. Quando a mal administração compromete o iter ao qual corresponde, a ser comprometidas são nossas escolhas de vida e, portanto, nossa liberdade. Por isso estou do lado da manifestação de indignação.

Os obstáculos ao exercício do direito dos cidadãos fora da Itália são múltiplos, começando com a falta do respeito do prazo de 730 dias estabelecido pela lei para a conclusão do processo de cidadania que, como deve saber quem acompanha o meu trabalho, foi objeto de uma minha interrogação ao então Ministro do Interno, Alfano.

O agendamento online dos passaportes é outra questão inaceitável pela qual tenho lutado, em sinergia com alguns dos meus colegas eleitos para representar a América do Sul. Este é o único documento que o cidadão italiano possui, é um direito que ele tem e nós estamos reclamando diariamente para que este direito lhe seja assegurado. Entendemos que a falta de pessoal é um problema real, diplomático, mas não podemos aceitá-lo e simplesmente cruzar os braços. Muitas das reivindicações que serão levadas ao consulado pelos manifestantes são questões ministeriais, que não podem ser resolvidas diretamente por nós, parlamentares.

Infelizmente, existe uma burocracia que, no rol de parlamentar, se torna mais conhecida e que permite entender o porquê de tantas dificuldades. De longe, o cidadão enxerga as dificuldades e a falta de soluções, mas não o mecanismo por trás que as provoca e que faz com que seja mais complexo conseguir soluções. Nossa batalha no Parlamento não pode prescindir do funcionamento do sistema.

Por esta razão, muito longe “do sono profundo ou lugar idílico em que comunicados, ordens do dia, guardanapos rabiscados, turnês parlamentares”, come Taddone, na entrevista dada à Insieme , descreve nosso trabalho, (cuja utilidade, aliás, não quero aqui negar já que se trata de imprescindíveis instrumentos do trabalho parlamentar), eu gosto de informar soluções e não contar os passos que apontam a soluções, arriscando assim, frustrar esperanças.

Por isso, decidi investir muita energia também em batalhas paralelas, como a Convenção de Haia da Apostila ou o Acordo de Conversão das Carteiras de Habilitação. Tanto um como o outro, foram avanços que conseguimos fazendo pressão ao governo do Brasil, para que finalmente ratificasse acordos assinados muito tempo antes; no caso da Apostila, em 1961.

Também para denunciar e tratar da questão das filas de cidadania e serviços consulares, principalmente do agendamento online, percorri caminhos extraoficiais, me reunindo várias vezes com o Ministério do Exterior.

Quero finalizar minha resposta à Insieme, deixando uma mensagem positiva. Durante este meu mandato apoiei muitas das propostas do PD, mas não todas e, sobretudo, nunca de forma incondicional. De fato, desde o começo do meu mandato, tomei a decisão de fazer parte do Grupo Misto, considerando que estar desvinculada de um partido seria a melhor forma de defender, isso sim de maneira incondicional, os interesses do cidadão, independentemente da linha ditada pelo partido.

Quem acompanha o meu trabalho deve lembrar o teor de uma dura intervenção em que eu pedia a este governo para atuar aquele câmbio de mentalidade a respeito dos italianos no exterior, que é o esperado e o que seria justificado também por questões de oportunismo político e por um olhar mais visionário.

O PD no governo não cumpriu com o câmbio desejado e esperado por nós italianos no exterior, mas, ao meu ver, considerando todos os limites impostos pela crítica situação do País, apontou o caminho certo e já recolhemos alguns sinais desta intenção. Todos as mudanças precisam de tempo. Não podemos esquecer que foi um dos governos que mais olhou para América do Sul. As visitas de prestígio, que não aconteciam desde antes a aplicação da Lei Tremaglia, são testemunhas disso e estou convencida que foram significativas em apontar mudanças: desde aquela representativa do Presidente da República, ao Primeiro Ministro Renzi, passando pelo Ministro do Exterior Gentiloni, também atual Presidente do Conselho”.